A finalidade de nosso trabalho é de posicionarmos perante a Problemática da Perda e da Suspensão dos Direitos Políticos, e ainda, quanto a duração desses dois conceitos, ou seja, conceito de Perda e Suspensão. Estaremos traçando um silogismo de forma embasada em nossa Constituição Federal, e em ensinos aprofundados de diversos doutrinadores.
O presente trabalho, estará tratando do artigo 15, caput, da Constituição Federal, e parágrafo IV do mesmo artigo, em conjunto com o artigo 5°, § XLVII, letra b.
Trataremos da Perda e da Suspensão dos Direitos Políticos, em análise de sua duração ou extinção, ou seja, serão tais penas perpétuas ou não? Tal assunto não se encontra um desenvolvimento legislativo, doutrinário, nem mesmo jurisprudencial tão acentuado em nosso mundo jurídico.
O cerne deste trabalho está elencado no artigo 15, caput, da Constituição Federal, o qual traz em seu contexto, conceitos como, perda e suspensão. Daí notamos a necessidade de uma análise profunda desses dois conceitos, pois esses dois conceitos podem nos conduzir a erro, pois quando serão suspensos e quando serão perdidos tais direitos políticos.
Um outro ponto importante do trabalho que estaremos tratando, é referente a privação de direitos por motivo de convicção religiosa, quando usada para se eximir da obrigação legal imposta pelo Estado, como por exemplo a prestação de serviço militar. Tamanha é a importância tratarmos deste assunto, pois é grande o número de pessoas em dias atuais que se utilizam de tal alegação, devido sua convicção religiosa, a qual não permite que seus fiéis prestem tal serviço ao Estado.
O fato histórico de nosso país demonstra o motivo da inércia legislativa, referente a prestação de serviço militar. Nas últimas décadas houveram pouquíssimas ocasiões de guerra. Outro ponto é que há um número muito grande de contigentes humanos que excedem a própria possibilidade de absorção do recrutamento militar.
2 – Da Privação dos Direitos Políticos
Sabemos que o cidadão pode ser privado de seus direitos políticos, pois tal posição está prevista em nossa Carta Magna. Porém, a Constituição Federal, não aponta quais são as hipóteses de perda ou suspensão de direitos conforme nos ensina o professor ALEXANDRE de MORAES:
“A Constituição Federal não aponta as hipóteses de perda ou suspensão dos direitos políticos, porém a natureza, forma e, principalmente, efeitos das mesmas possibilitam a diferenciação entre os casos de perda e suspensão.”
A privação dos direitos políticos, seja nas hipóteses de perda ou suspensão, engloba a perda do mandato eletivo, determinando assim, imediatamente a cessação de seu exercício. No que se refere aos parlamentares federais, a própria Constituição Federal, traz em seu artigo 55, § 3°, que o Deputado ou Senador que perder ou tiver suspensos os direitos políticos, imediatamente será cessado seu exercício.
2.1 – Da Perda
A perda dos direitos políticos, é tratada no artigo 15, caput, da Constituição Federal. Terá a perda dos direitos políticos da seguinte forma:
Conforme nos ensina o professor ALEXANDRE de MORAES:
“A perda dos direitos políticos configura a privação dos mesmos e ocorre nos casos de cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado e recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do art. 5°, VIII, da Constituição Federal.”
Salientamos ainda o professor J. CRETELLA JÚNIOR:
“Não se perde o que não se tem. Perde-se aquilo de que se tinha a posse, ou a detenção. “Perda” é idéia ligada à idéia de definitividade …”
Em nosso Direito Constitucional Brasileiro há duas hipóteses específicas de perda de direitos políticos, são elas:
2.1.1 – Cancelamento da naturalização por sentença transitado em julgado.
Um dos requisitos para o exercício dos direitos políticos, é a nacionalidade brasileira, ensina-nos os professores Luiz Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Júnior. Cabe lembrar que o requisito da nacionalidade brasileira é exigência para o alistamento eleitoral.
Aqui a República Federativa do Brasil, teve a preocupação de estabelecer a perda dos direitos políticos daqueles que perdem a nacionalidade brasileira, pois nada mais lógico, pois como poderia um cidadão de origem estrangeira cuidar de assuntos de interesses do Brasil e de seu povo.
Ensina-nos também o professor ALEXANDRE de MORAES, que:
“Como conseqüência desta perda, o indivíduo retorna à situação de estrangeiro perdendo os direitos políticos, pois o atributo da cidadania é próprio dos que possuem em nacionalidade.”
Cabe lembrar que para a decretação da perda dos direitos políticos, somente o Poder Judiciário poderá assim fazer (Justiça Federal, art. 109, X, da CF).
2.1.2 – Escusa de Consciência.
O art. 5°, VIII, da Constituição Federal assegura a liberdade de convicção e de crença, salvo se invocadas para efeito de se eximir de obrigação legal a todos imposta e recusar-se ao cumprimento de obrigação alternativa fixada em lei.
Como nos ensina os professores Luiz Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Júnior:
“A recusa ao cumprimento de obrigações da espécie, bem assim de obrigações alternativas legalmente fixadas, gera a perda dos direitos políticos. Com efeito, o indivíduo possui o direito à escusa de consciência, mas deve, neste caso, cumprir a obrigação alternativa, sob pena de perda dos direitos políticos.”
A Lei n° 8.239, de 4-10-1996, regulamentada pela Portaria n° 2.681, de 28-7-1992 (fundamentada no § 1° do art. 143 da CF):
“As Forças Armadas compete, na forma da lei, atribuir serviço alternativo aos que, em tempo de paz, após alistados, alegarem imperativo de consciência, entendo-se como tal o decorrente de crença religiosa e de convicção filosófica ou política, para se eximirem de atividades de caráter essencialmente militar”,
porém, para que haja perda dos direitos políticos deverão estar presentes dois requisitos essenciais, são eles:
– descumprimento de uma obrigação a todos importa;
– recusa à realização de uma prestação alternativa fixada em lei;
Na conclusão deste trabalho estaremos discorrendo e colocando nossa posição quanto a escusa de consciência.
2.2 – Da Suspensão.
Ao lado das hipóteses de perdas, a Constituição Federal, disciplinou ainda três hipóteses de suspensão dos direitos políticos. Segundo o professor ALEXANDRE de MORAES, “a suspensão dos direitos políticos caracteriza-se pela temporariedade da privação dos direitos políticos.”
A suspensão dos direitos políticos se dará nas seguintes hipóteses: incapacidade civil absoluta; condenação criminal com trânsito em julgado, enquanto durarem seus efeitos; improbidade administrativa.
2.2.1 – Incapacidade Civil Absoluta.
A incapacidade civil que é tratada aqui é superveniente, ou seja, é um dos efeitos secundários da sentença judicial que decreta a interdição, a qual gera a suspensão dos direitos políticos.
Para isso basta a decretação da interdição do incapaz, nos termos dos arts. 446 e 462 do Código Civil, nas hipóteses do art. 5° do referido diploma legal, para que decorra, como efeito secundário e específico da sentença judicial, a suspensão dos direitos políticos, enquanto durarem os efeitos da interdição.
O legislador tratou apenas como suspensão por motivo de incapacidade civil, pois desta forma se o indivíduo que recuperar seu estado normal, ou seja, capacidade civil poderá ter seus direitos políticos novamente.
2.2.2 – Condenação Criminal com Trânsito em Julgado enquanto durarem seus efeitos.
Todos os sentenciados que sofrerem condenação criminal com trânsito em julgado estarão com seus direitos políticos suspensos até que ocorra a extinção da punibilidade como conseqüência automática e inafástavel da sentença condenatória.1
“A condenação criminal passada em julgado gera a suspensão dos direitos políticos enquanto perdurarem seus efeitos”, segundo professores Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior.
Os requisitos para a ocorrência dessa hipótese de suspensão dos direitos políticos são:
– condenação criminal com trânsito em julgado: O art. 15, inciso III, da Carta Magna é auto-aplicável, sendo conseqüência direta e imediata da decisão condenatória transitada em julgado, não havendo necessidade de manifestação expressa a respeito de sua incidência na decisão condenatória e prescindindo-se de quaisquer formalidades. Cabe lembrar que, o termo “condenação criminal transitada em julgado” não distingue quanto ao tipo de infração cometida, abrangendo não só aquelas decorrentes da prática de crimes dolosos ou culposos, mas também, as decorrentes de contravenção penal.
– efeitos da condenação criminal: a suspensão dos direitos persistirá enquanto durarem as sanções impostas ao condenado, tendo total incidência durante o período de livramento condicional, e ainda, nas hipóteses de prisão albergue ou domiciliar, pois somente a execução da pena afasta a suspensão dos direitos políticos com base no art. 15 inciso III, ca Constituição Federal.
1. ROLLO, Alberto, BRAGA, Enir. Inelegibilidade à luz da jurisprudência. São Paulo: Fiuza, 1995. P. 73-77. Citação de vários precedentes jurisprudências.
2.2.3 – Improbidade Administrativa:
A Constituição Federal, no art. 37, § 4°, prevê que os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da sanção penal cabível, reforçando a previsão de suspensão dos direitos políticos do art. 15, V. Grande eficácia foi o legislador colocar tal norma, pois como poderia um representante público, eleito pelo povo e para o povo, cometer tais imoralidades sem haver uma sanção para tais atos.
Conforme nos ensina o professor José Afonso da Silva improbidade administrativa é: a imoralidade administrativa qualificada pela lesão ao patrimônio público.
3 – Conclusão
No que se refere a suspensão dos direitos políticos, como o próprio nome diz, suspensão, não haveria nexo ter uma suspensão perpétua, pois o próprio significado da palavra não permitiria que esta fosse perpétua, e sim, provisória. Neste intento ensina-nos os professores Luiz alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Júnior:
“… três hipóteses de suspensão dos direitos políticos, ou seja, casos de interdição provisória dos direitos políticos, de tal modo que, cessados os efeitos do ato que gera a suspensão, de regra, cessa igualmente a interdição dos direitos.”
Temos também a mesma posição do professor J. CRETELLA JÚNIOR, que diz:
“Suspensão não se confunde com perda. “Suspensão” é interrupção temporária daquilo que está em curso, cessando quando terminam os efeitos de ato ou medida anterior.”
No que tange ao exercício do cargo político o mesmo professor citado acima nos ensina que: “a incapacidade civil absoluta por doença mental acarreta a suspensão, primeiro, do estado virtual do gozo, depois do exercício, da atividade de fato, pelo maior de dezoito anos, que quer alistar-se, depois, se o conseguir pretende votar ou ser votado. A suspensão impede o gozo e o exercício.”
Para a suspensão de direitos políticos, o que se analisa como regra, são os efeitos da interdição. Logo, primordialmente se decreta a interdição, e secundariamente a suspensão dos direitos políticos.
Daí concluímos que extinta a interdição, extingue-se também a suspensão dos direitos políticos.
Com o exposto acima, concluímos claramente que não há perpetuidade na suspensão de direitos, e sim suspensão temporária de exercício de tais direitos políticos.
Ao estudarmos tal tema, notamos que quando tratamos da Perda dos Direitos, mais precisamente a palavra chave “PERDA”, somos induzidos a concluir que a perda seja algo perpétuo, o que na verdade não é.
A explicação para isso, é que, a palavra perda, nos dá uma conotação de eternidade, como por exemplo, “a perda de uma vida”, neste caso a perda realmente se faz perpétua.
A perda no aspecto jurídico, tem suas características próprias, como ensina o professor J. CRETELLA JUNIOR:
“Perda é idéia ligada à idéia de definitividade, embora nem sempre o seja. Pode-se recuperar o que se perde.”
Salienta ainda, o mesmo douto:
“A perda, regra geral, é definitiva, para sempre, a não ser que quem perdeu faça esforço para recuperar o perdido.”
Temos ainda:
“O estrangeiro residente no Brasil não perde a naturalização, porque simplesmente não a tem, mas se lhe foi outorgada perde, podendo, porém, mais tarde recuperá-la (cf. contra: Manoel Gonçalves Ferreira Filho, Comentários, 6a. ed., 1986, p. 561)”
Com o exposto acima podemos entender que essa perda é temporária, ou seja, podemos classifica-la como uma PERDA TEMPORÁRIA.
Justificamos a classificação acima, pelo fato de o indivíduo determinar o lapso de tempo, ou seja, terá o indivíduo, o direito subjetivo de requerer o que foi perdido, não tendo um tempo especificado para tal ato. O indivíduo que teve seu direito perdido, além de requere-lo novamente, terá que se esforçar para obte-lo.
Como nos alerta o professor, ALEXANDRE de MORAES:
“Aquele que estiver com sua inscrição cancelada, por ter perdido seus direitos políticos, ou suspensa, por estar com seus direitos políticos suspensos, cessado o motivo ensejador da privação, poderá regularizar sua situação junto à Justiça Eleitoral.”
“Se o cidadão deixa de atender à convocação para o serviço militar, alegando motivos de “crença religiosa”, de “convicção filosófica ou política”, recusando-se, ainda, a cumprimento de obrigação alternativa, que substitui aquela obrigação, imposta a todos, ficará sujeito à perda ou à suspensão dos direitos políticos. Atendendo mais tarde à convocação, ou cumprindo a obrigação alternativa, recupera os direitos políticos perdidos ou suspensos.”
Com o exposto acima, fica claro que a perda dos direitos políticos não são perdas perpétuas, e sim perdas temporárias, pois dependerá da vontade do indivíduo requere-la perante a justiça. O professor ALEXANDRE de MORAES, nos ensina que:
“A Lei n° 8.239, de 4-10-1991, que regulamentou o art. 143, § 1°, da Constituição Federal, acolhendo esse entendimento, determina que a recusa ou cumprimento incompleto do serviço alternativo, sob qualquer pretexto, por motivo de responsabilidade pessoal do convocado, implicará o não-fornecimento do certificado correspondente, pelo prazo de dois anos após o vencimento do período estabelecido. Findo o prazo previsto no parágrafo anterior, o certificado só será emitido após a decretação, pela autoridade administrativa competente, da suspensão dos direitos políticos do inadimplente, que poderá, a qualquer tempo, regularizar sua situação mediante cumprimento das obrigações devidas. Apesar da lei referir-se à suspensão, trata-se de perda, pois não configura uma sanção com prazo determinado para terminar. O que a lei possibilita é a reaquisição dos direitos políticos, a qualquer tempo, mediante o cumprimento das obrigações devidas.”
Com o exposto no parágrafo anterior, fica claro que não haverá perda perpétua. Porém esta perda dependerá também do indivíduo, pois este deverá requer seus direitos novamente.
A Constituição Federal de nosso país, principalmente o artigo 5°, visa garantir a defesa do cidadão perante ao Estado, bem como, interesses jurídicos de caráter social, político ou difuso protegidos por esta. Daí nota-se que o Estado estaria tirando a defesa do cidadão, se houvesse uma imposição de perda perpétua, pois este visa proteger o cidadão no mais profundo interesse, garantindo ao cidadão os direitos à condição humana e os direitos a cidadania. Vale lembrar ainda, que as penas de caráter perpétuo são vedadas, conforme art. 5°, inciso XLVII, letra b, pois esta é uma cláusula pétrea, sendo assim imutável tal colocação da constituição.
E por último devemos lembrar que o Brasil, é um Estado democrático, com isso ele não poderia impor perda de direitos políticos perpetuamente, pois se assim o fizesse, estaria perdendo seu fim social de proteger o cidadão, e ainda, estaria também perdendo sua personalidade democrática.
4 – Bibliografia
CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à constituição brasileira de 1988. Editora Forense Universitária, 1989, 1a. edição.
ARAÚJO, Luiz Alberto David e NUNES, Vidal Serrano Júnior. Curso de Direito Constitucional. Editora Saraiva, 1998, 1a. edição.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. Editora Atlas, 1999, 6a. edição.
TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. Editora Malheiros, 1999, 15a. edição.
TORRIERI, Deocleciano Guimarães. Dicionário Técnico Jurídico. Editora Rideel, 1998.
*Celso Martins de Godoy
Acadêmico de Direito na Universidade Paulista em Barueri-SP