Pessoa jurídica como pólo passivo do dano moral

Bianca Carvalho Dalenogare

Acadêmica do 4º semestre do Curso de Direito da UFSM

INTRODUÇÃO

Ao Direito cabe ordenar a convivência em sociedade, compondo os conflitos de interesses que surgem no meio social. A sociedade, que evolui dia-a-dia, valoriza cada vez mais os atributos essenciais da pessoa, em respeito à dignidade e à própria cidadania e, dessa forma, passou a exigir a positivação de normas protetoras desses valores. Essas normas visam à proteção dos bens imateriais, dos direitos personalíssimos do ser humano e, uma vez violadas, geram o dever de reparação. É a indenização por danos morais.

Não há mais dúvidas, no direito brasileiro, sobre a propriedade, ou obrigatoriedade, de indenização por danos morais às pessoas físicas. Porém, constitui ainda certa celeuma a questão da possibilidade da pessoa jurídica ser sujeito passivo do dano moral. Parte da doutrina, apesar de minoritária, ainda resiste à concessão desse tipo de ressarcimento aos entes personificados e aumenta, cada dia mais, o número de entidades jurídicas que buscam reparação pela lesão aos seus bens imateriais nos tribunais do país. Esses dois aspectos tornam o assunto palpitante e despertam o interesse pelo seu estudo.

Para a compreensão de tal discussão, cabe definir, em um primeiro momento, o significado das principais expressões em destaque, quais sejam, “dano moral” e “pessoa jurídica”, para que, depois de compreendidos esses aspectos, possamos adentrar na discussão da propriedade de colocar a pessoa jurídica no polo passivo de uma relação dessa natureza.

O método utilizado para realização de tal estudo foi o de pesquisa bibliográfica, analisando as posições da doutrina e sua sedimentação na jurisprudência.

1. CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES ACERCA DOS INSTITUTOS ENVOLVIDOS

Antes de adentrar na questão principal deste trabalho, ou seja, a possibilidade de indenizar a pessoa jurídica por danos morais, faz-se mister considerar, brevemente, alguns aspectos do dano moral e da pessoa jurídica.

1.1 Dano moral, o conceito e uma breve evolução

A expressão dano, por si só, engloba prejuízo, diminuição ou perda de qualquer direito, interesse ou bem, seja ele de que natureza for. Inicialmente, cabe esclarecer a delimitação entre dano patrimonial e extrapatrimonial. O primeiro se caracteriza pela repercussão imediata no patrimônio do ofendido enquanto o segundo alcança o conteúdo não econômico de bens jurídicos.

Danos morais, conforme VARGAS (1988, p.17): “[…] são aqueles que produzem dor sem repercussão no patrimônio presente ou futuro do lesado ou independentemente dessa lesão”. Quando as lesões atingem direitos personalíssimos trarão constrangimento, desconforto, dor física ou psíquica, entre outras situações desagradáveis sentidas pelo ofendido.

O dano moral, portanto, tem caráter extrapatrimonial e refere-se apenas a bens que não podem ser facilmente dimensionados economicamente, como vida, honra, reputação etc.

De acordo com Maria Helena Diniz (1984, p. 71): “ O dano moral vem a ser lesão de interesse não patrimonial da pessoa física ou jurídica”.

A circunstância do dano moral não ter caráter patrimonial, salvante no que diz respeito a sua reparação, foi um dos motivos pelos quais sempre se relutou quanto ao seu reconhecimento no âmbito do ordenamento jurídico. No entanto, é pacífico o entendimento de que a indenização pecuniária por danos morais não traz a idéia de pagamento do dano moral sofrido, de elemento de troca mercantil, já que não há efetivamente valor monetário para o moral. O dinheiro deve ser empregado unicamente como forma de gerar satisfação, em contraposição ao incômodo gerado pelo dano.

Os autores, a maioria, colocam como marco inicial dessa evolução o Direito Romano, que foi o primeiro a apresentar uma ordenação jurídica, com a concepção mesmo de ordenamento.

A lei das XII tábuas que consubstanciou todos os costumes romanos contemplava três figuras delituosas:

1. membrum ruptum (tav. VIII) – referiam-se ao delito de mutilação de um membro do corpo, cuja pena era o talião. A vítima podia optar pela composição pecuniária,

2. os fractum (tav. VIII) – referiam-se a delito de quebra ou fratura de um osso. A pena era pecuniária, no valor de 300 asses,

3. iniura – referia-se à violência leve – tapas, beliscão, pontapé – punidas com a multa de 25 asses. Tudo isso era a vingança privada, regulamentada pela lei em apreço.

Todavia, muito tempo depois, foi com o jus honorarium que tivemos uma postura mais clara a respeito da reparabilidade do dano. Ampliou-se o conceito de “iniura”, que passou também a abranger a personalidade moral, significando difamação, ofensa à honra alheia, proibindo o talião. Foi aqui que surgiu a previsão da reparabilidade do dano moral.

Vale ressaltar, entretanto, que o Direito Romano não chegou a construir uma teoria sobre a responsabilidade civil. Foi a partir da lex Aquilia (sec. III a. C.) que se introduziu a culpa como fundamento da responsabilidade, como elemento constitutivo do delito.

Outras legislações influenciaram o direito brasileiro: Direito Português – as ordenações do reino admitiam a reparação do dano moral; Direito Canônico – os países de religião católica o acolheram e ele consignou algumas regras disciplinadoras de reparação material e espiritual; Direito Francês – muito embora o código de Napoleão não tivesse previsto a responsabilidade do dano moral, coube à Doutrina e à jurisprudência a tarefa de construção de uma teoria da reparação do dano moral. É torrencial a aceitação da ressarcibilidade dos danos morais na França; Direito Italiano – o Código Civil Italiano passou a vigorar em 1.865 e seguiu os mesmos princípios do Código Civil Francês, contando uma previsão genérica do ressarcimento do dano causado por ato ilícito. Assim coube também à Doutrina e Jurisprudência a tarefa de estabelecer os princípios norteadores da reparação por danos extrapatrimoniais. Os códigos que se seguiram, todavia, limitaram a reparação, mas acabou vencendo, na Itália, a corrente positivista que defende a reparação dos danos extrapatrimoniais sem qualquer limitação.

O Brasil, durante o período colonial, seguiu as ordenações do Reino de Portugal, que adotavam a reparação do dano moral. Mesmo depois da independência, o país continuou a ser regido pela legislação portuguesa.

Com o passar dos anos, o ordenamento pátrio tendeu a reconhecer a reparabilidade pelos danos morais sofridos. O Supremo Tribunal Federal, já em 1966, reconheceu e deu provimento a uma ação de indenização por danos desta natureza.

O Código Civil Brasileiro, de 1916, mesmo que não expressamente, previa indenizações por várias razões de cunho moral, tais como as previstas nos artigos 1537 (pagamento de despesas de funeral e luto da família); 1547 (injúria e calúnia); 1550 (ofensa à liberdade pessoal), dentre outros.

Porém, merece grande destaque a menção expressa ao dano moral trazido pela Constituição Federal de 1988, no seu artigo 5°, incisos V e X, que veio para acabar com a hesitação, por parte da jurisprudência, em conceder o dano moral:

Art. 5°: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes fora do País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: […]

V- é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; […]

X- são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

Mais recentemente, o Novo Código Civil Brasileiro de 2002, quando estabelece as regras referentes aos ilícitos estabelece, literalmente, a possibilidade de reparação do dano ainda que exclusivamente moral, segundo a redação do artigo 186. Além disso, deixou claro o legislador sua preocupação com os chamados direitos da personalidade, para cujo tema dedicou um capítulo novo, com os artigos 11 a 21.

A jurisprudência é também rica em exemplos de entendimentos sobre a propriedade do dano moral, dentre as quais pode-se destacar a Súmula 37, de 12/03/1992, do Superior Tribunal de Justiça, que definiu como cumuláveis as indenizações por dano material e moral oriundos do mesmo fato. Esta Súmula também nos prova a distinção entre os dois tipos de danos e suas respectivas reparações.

1.2 Pessoa jurídica, seus direitos e suas prerrogativas

Os homens, desde há muito, procuram conjugar forças para poderem alcançar determinados fins sociais e econômicos que não os conseguiriam se perseguissem individualmente. Dessa forma, visando a persecução desses objetivos, passaram a reunir-se através de entidades públicas ou privadas que, com o decorrer dos tempos e através de construções doutrinárias no campo do Direito, adquiriram uma personalidade apartada de seus membros fundadores.

Sendo assim, embora sua existência dependa da manifestação de vontade dos indivíduos que a compõe, a lei atribui à pessoa jurídica, a partir do registro de seus atos constitutivos, uma personalidade jurídica que torna tal ente capaz de adquirir direitos e obrigações a fim de que ela possa alcançar os fins sociais e econômicos que persegue.

Percebe-se, então, que os entes personalizados, sejam públicos ou privados, também são titulares de direitos que devem ser resguardados pelo ordenamento jurídico para que as pessoas jurídicas não sejam impedidas de buscar os objetivos a que se propõem.

As pessoas jurídicas, a exemplo das pessoas naturais, também possuem bens, tanto de natureza patrimonial como de natureza extrapatrimonial. Dentre os patrimoniais podemos citar as máquinas, instalações etc. Existe também uma grande quantidade de bens não patrimoniais, não auferíveis em dinheiro, que agregam significativo valor á pessoa jurídica, tais como credibilidade, reputação, confiança, etc. São inúmeras as empresas cujo é grandemente ampliado em função de bens de natureza extrapatrimonial.

Embora o fim precípuo do ente jurídico seja o fim econômico (interesse patrimonial), ele também possuirá interesses outros que poderão ser considerados “espirituais” ou não patrimoniais. Pode-se concluir então que a pessoa jurídica também possuirá direitos da personalidade, em função da personificação que sofrem em decorrência da lei. Dessa forma, deve-se reconhecer o direito do ente personificado ao seu bom nome, á honra, a propriedade industrial etc.

2. A POSSIBILIDADE DA PESSOA JURÍDICA SOFRER DANOS MORAIS

Após a efetivação e fortalecimento do dano moral no ordenamento, prevendo-o expressamente e acabando com todas as resistências existentes para sua concessão, surge outro problema: poderiam os entes personificados, ou seja, as pessoas jurídicas ser sujeitos passivos de dano moral?

Como já foi mencionado, as pessoas jurídicas não têm a mesma essência das pessoas naturais. Não podem alegar o sofrimento físico. No entanto, sabe-se também que os entes abstratos possuem uma reputação a zelar. As pessoas jurídicas podem sofrer acusações falsas e ser consideradas má pagadoras, corruptoras, depredadoras do meio ambiente… Enfim, as entidades personificadas podem perder a credibilidade e ficar com “má-fama”.

Numa sociedade em que se inicia a construção ética do princípio da responsabilidade social, revela arcaísmo sofisticar de análises meramente conceituais a repulsa à idéia de que a pessoa jurídica não tem honra, reduzindo-lhe, pois, o universo de direitos da personalidade em que se compõe, também, seu patrimônio a ser tutelado. A pessoa jurídica tem, sim, a seu modo, honra, que é o conjunto de atributos próprios de suas qualidades socialmente difundidas, que a distinguem por meio do nome, imagem, conceito, mensurados em suas ações comissivas ou omissivas, com que garimpa o respeito e a admiração das pessoas.

Mas não seria um absurdo conferir a um ente abstrato o direito á honra, visto que este pressupõe auto estima, um sentido de dignidade pessoal, sentimentos inerentes ao ser humano?

Analisando tal direito sob um prisma subjetivo diríamos que sim. Entretanto, ao analisar a honra num plano objetivo, percebe-se que tal direito da personalidade pode ser conferido aos entes personificados. A honra deve ser entendida como:

– o valor moral íntimo do homem;

– a estima dos outros, a consideração social, o bom nome ou a boa fama;

– o sentimento ou consciência da própria dignidade.

Assim, seriam as lesões aos direitos da personalidade que provocariam o dano moral nas pessoas jurídicas. E quanto á isso, esclarece o artigo 52 do Novo Código Civil Brasileiro: Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade. Portanto, a empresa, associação ou entidade, ao ter seu nome relacionado a algum fato desagradável, teria sua honra objetiva violada, ou seja, sua imagem perante a sociedade estaria prejudicada e sua credibilidade e aceitação diminuída.

2.1 O que diz a legislação e como se apresenta a jurisprudência quanto à concessão de dano moral aos entes abstratos

Do ponto de vista de dano moral, especialmente à pessoa jurídica, perece-nos pertinente mencionar alguns momentos, tanto na legislação pátria quanto em julgados importantes, que demonstram o cabimento do dano moral aos entes abstratos, sua positivação e aceitação.

Primeiramente, ainda no ano de 1945, o decreto-lei 7903, que no artigo 189, título IV – Dos crimes em matéria da propriedade Industrial, sujeita às penas de lei: aquele que violar direito de marcas de indústrias ou de comércios, passível, ainda, da reparação pelas perdas e danos, materiais e morais, pelos prejuízos sofridos.

Depois a lei 9279, de 1996, que regula os direitos e obrigações concernentes á propriedade industrial, manifesta claramente no artigo 209:

Fica ressalvado ao prejudicado o direito de haver perdas e danos em ressarcimento e prejuízos causados por atos de violação dos direitos de propriedade industrial e atos de concorrência desleal não previstos nesta lei, tendentes a prejudicar a reputação ou os negócios alheios, a criar confusão entre estabelecimentos comerciais, industriais, prestadores de serviço, ou entre produtos e serviços postos no comércio.

Também, como já mencionado anteriormente os incisos V e X do artigo 5° da Constituição Federal de 1988, que asseguram direito de indenização por danos morais á intimidade, vida privada e imagem das pessoas. Entende-se que, como o legislador não especificou ou restringiu o conceito de pessoa, são esses direitos relativos tanto às pessoas físicas como às jurídicas.

O judiciário brasileiro tem interpretado de forma adequada a questão. Inúmeros são os casos já julgados no Superior Tribunal de Justiça envolvendo dano moral à pessoa jurídica, como posicionamento bastante claro daquela corte. Um dos mais relevantes, o Acórdão 251078/Recurso especial julgado em 18/05 p.p, baseado na Súmula 227 de 08/09/1999 do mesmo egrégio tribunal, no qual pacificou-se o entendimento desta Corte no sentido de que as pessoas jurídicas podem sofrer danos morais.

2.2 A doutrina resistente e o porquê de suas alegações não procederem

Existem ainda aqueles que resistem á idéia de existência de dano moral à pessoa jurídica. O ilustre doutrinador Agostinho Alvim, lembrado por VARGAS (1998, p.112), em seu comentário famoso, defende: “Se o dano não patrimonial tem como pressupostos o dano e a não diminuição do patrimônio, afastada toda a idéia de dor moral ou física no que tange ás pessoas jurídicas, então, não sabemos em que consistirá esse dano, que não é dor nem é prejuízo”.

Um dos fundamentos erigidos pela corrente que nega o cabimento de dano moral às pessoas jurídicas tem como premissa a idéia de que a pessoa jurídica é um ente abstrato que não está sujeita à dor ou sofrimento. E é. No entanto, como já esclarecido, o ente abstrato, apesar de não sofre dor psíquica poderá ser prejudicado em seu conceito, das mais diversas formas, quer através de uma difamação escrita ou verbal, da extração indevida de um protesto cambial contra o mesmo, da divulgação de um segredo de aquele seja titular etc. Tudo isso representa ataque à honra objetiva, externa ao sujeito, consistente, basicamente, no respeito, admiração, apreço e consideração que os outros lhe dispensam, idéia amplamente aceita pelo ordenamento jurídico nacional, onde os entes abstratos são dotados de total capacidade de direito, salvante aqueles casos de impossibilidade física.

Outra alegação da corrente negativista é de que todo prejuízo em questão é eminentemente pecuniário e não moral. Defendem que a entidade personificada só poderá ser atingida em seus objetivos e nunca em sua essência, sendo que o dano que assim se traduza será sempre material. Porém, resta lembrar que há entidades abstratas, previstas no artigo 44 do Código Civil de 2002, que não têm fim econômico, como as sociedades civis, religiosas, científicas, literárias, nosocômios, universidades, etc.- que, apesar de não objetivarem lucro ou donativos, sofrem severos prejuízos em seu conceito e em sua credibilidade em razão dos ataques acima referidos.

Ainda que se admita, no que diz com as sociedades comerciais, que o bom nome e o conceito social estejam intrinsecamente ligados aos dividendos econômicos da empresa, nas hipóteses acima referidas sequer se fala de comércio ou lucro, sendo que tais figuras morais, pias, beneficentes e científicas vivem, exclusivamente, de sua credibilidade, de dotações estatais ou de suas próprias rendas, estas, de regra, não sujeitas à variação ao sabor das opiniões externas. Logo, o prejuízo aqui não é pecuniário, mas sim eminentemente moral, eis que atentatório à honra objetiva. Em sendo assim, ninguém duvida que de que devam ser resguardadas de ataques morais infundados, sendo que, se a própria lei lhes confere direito ao nome, tal prerrogativa se estende, obrigatoriamente, ao qualificativo bom nome.

Por último, afirmam certos doutrinadores e juristas que pretendem afastar a concessão de dano moral aos entes abstratos que, na verdade, os entes lesados seriam sempre os integrantes da pessoa jurídica, pessoas físicas, e não a pessoa jurídica. Aceitar tal assertiva seria como ferir de morte o próprio conceito de pessoa jurídica, negando a sua personalidade frente ao ordenamento jurídico, num processo de retrocesso de centenas de anos. Seria exigir que a ciência do direito andasse para trás, involuindo, desconsiderando a autonomia patrimonial, gerencial e a própria personalidade jurídica do ente abstrato, matérias sedimentadas no Brasil desde muito antes do Código Civil de 1916.

A pessoa jurídica tem vontade própria que se regula dentro dos limites da lei. É uma pessoa nova e autônoma que persegue um fim. As sociedades anônimas, por exemplo, figuras de maior difusão no meio mercantil, exatamente pela abstração e limitação da responsabilidade de seus sócios, onde seu patrimônio está de tal forma pulverizado que sequer se sabe quem são seus titulares. Logo, eventual ofensa desferida atinge em cheio a entidade moral afetando a honorabilidade e o conceito social que lhe são próprios, motivo pela qual deve ser combatida em respeito àquela e não aos seus integrantes.

Pensar contrário seria amesquinhar umas das mais fecundas construções do Direito em detrimento dos próprios ideais de agilização de idéias e riquezas que motivaram a concepção dessa figura abstrata, deixando a mesma desprotegida de ataques á sua honra objetiva e ao seu conceito, exatamente nos dias de hoje, de globalização e divulgação irrestrita de informações, quando se sabe que a difusão equivocada ou maldosa de uma falta contra aquela, sem que seja seguida de uma enérgica reação judicial, pode ensejar estragos incomensuráveis que venham a comprometer a sua própria sobrevivência.

Muitos desses juristas que negam a concessão de dano moral aos entes personificados defendem que deveria ser utilizada a tese da indenização do dano patrimonial indireto, ou seja, indeniza-se somente se ocorre um dano patrimonial. O absurdo dessa tese, ao que pese a dificuldade de mensurar esse prejuízo desde logo, é associar um primeiro fenômeno a ocorrência de um segundo, de forma a anular esse primeiro fenômeno. Assim, segundo essa teoria, a verdade é que o dano moral nunca seria considerado, pois o que se indenizaria seria tão somente o dano material.

Cabe ressaltar que, no estágio atual da doutrina, é majoritária a corrente que considera a pessoa jurídica plenamente capaz de figurara como pólo passivo do dano moral.

CONCLUSÃO

Os danos morais abrangem a lesão à bem jurídico de ordem extrapatrimonial, à honra das pessoas. Através do presente estudo não restam dúvidas de que tanto a pessoa natural quanto a pessoa jurídica possuem uma honra a ser resguardada. A pessoa jurídica possui honra com caráter objetivo, devendo prezar pela sua reputação perante a sociedade.

Essa honra ficcional deve ser protegida de agressões, podendo, perfeitamente, protagonizar relações jurídicas decorrente de direitos da personalidade, especialmente vinculado ao patrimônio moral.

A indenização devida, como vimos, deve apresentar caráter de contraposição ao dano sofrido, sem, em hipótese alguma, ser entendido como pagamento de algo não mensurável.

Existem, na legislação brasileira elementos suficientes para embasamento de ações desta natureza que impulsionam a jurisprudência, de forma que esta, apresenta-se inegavelmente tendente á concessão do dano moral aos entes personificados. A doutrina, em que pese os fundamentos da corrente minoritária e contrária à esse tipo de reparação serem injustificáveis, como vimos, manifesta-se no sentido de que é a pessoa jurídica passível de receber indenização por abalo à sua honra, uma vez que deve ser considerada objetivamente.

Ademais, milita a favor da incorporação do direito à proteção do patrimônio moral do ente abstrato a assertiva de que, com a tutela da honra, a pessoa jurídica passa a se preocupar em se comportar com mais respeito à legalidade, à eticidade e à sociabilidade de suas ações e essas premissas são, não casualmente, as diretrizes do novo diploma civil pátrio.

Portanto, fica clara a logicidade de, no que concerne á pessoa jurídica, reparar todos os danos possivelmente sofridos, os materiais, mensuráveis economicamente, e também aqueles que abalem o seu conceito e credibilidade, atingindo seus bens extrapatrimoniais.

OBRAS CONSULTADAS

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Ed. Saraiva, 1984.

VARGAS, Glaci de O. P. Reparação do Dano Moral: controvérsias e perspectivas. 3 ed. Porto Alegre: Síntese, 1998.

LENS, Luis Alberto Tompson Flores. Dano Moral Contra Pessoa Jurídica. Revista dos Tribunais, n.734, dezembro/1996-SP.

DAVID, Fernando Lopes. Dano Moral na Jurisprudência. São Paulo: Iglu, 1998.

REIS, Clayton. Dano Moral. 4 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998.

SANTOS FILHO, Euclides Antônio dos. Dano Moral à Pessoa Jurídica. Âmbito Jurídico. Mar. 2001. Disponível em . Acesso em 23/11/2004.

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