Pornografia na Internet

Marcelo De Luca Marzochi

RESUMO
Sexo é o assunto mais popular em qualquer tipo de mídia e com a Internet não seria diferente. Mas a rede trouxe também facilidade para a circulação da pornografia. Mas o que pornografia? É um meio de expressão que tem sua liberdade garantida como outro qualquer, desde que não seja ou não se torne ilegal. A pedofilia é o fato mais preocupante. Não se pode reduzir a pedofilia ao ato em si, nem tampouco se esquecer da dimensão penal do fato, por causa da violência praticada. O pedófilo precisa de médico, não de cadeia.
Indexadores
Pornografia. Internet. Sexo. Abuso Sexual. Pedofilia. Crime. Estatuto da Criança e Adolescente.

ABSTRACT
Sex is the most popular subject in any kind of media, and with Internet it wouldn’t be diferent. So, the Net become too easy the circulation of pornography. But, what is pornography?. It’s a free way of expression, since it doesn’t be or become ilegal. The pedophilia is the most worrying fact. We can’t reduce pedophilia to the conduct itself, nor forget the penalty for that, because the violence was practice. The pedophile needs a doctor, not the jail.
Keywords
Pornography. Internet. Sex. Sexual abuse. Pedophilia. Crime.

Sexo é o assunto mais popular não só na Internet, mas em todo tipo de mídia. Em novembro de 2000, uma decisão judicial proibiu a participação de menores de idade na novela “Laços de Família” da Rede Globo de Televisão por causa das cenas de sexo e violência .
Pornografia vem do grego pornographos, que significa escritos sobre prostitutas, originalmente, referência à vida, costumes e hábitos das prostitutas e clientes. O Dicionário Michaelis conceitua pornografia como arte ou literatura obscena, tratado acerca da prostituição, coleção de pinturas ou gravuras obscenas, caráter obsceno de uma publicação, devassidão. O Dicionário Aurélio traz como uma das definições figura, fotografia, filme, espetáculo, obra literária ou de arte, relativos a, ou que tratam de coisas ou assuntos obscenos ou licenciosos, capazes de motivar ou explorar o lado sexual do indivíduo .
De acordo com Eliane Moraes e Sandra Lapeiz a pornografia existe desde a Antigüidade. Na Bíblia há várias passagens, referindo-se principalmente à prostituição. Na Grécia o sexo era cultuado, principalmente na literatura com temas como prostituição e incesto. Na pintura e escultura também se encontram representações de cena eróticas, com destaque ao coito anal e símbolos fálicos. A homossexualidade era comum entre os gregos. Dildos – pênis artificiais – eram produto de exportação de Mileto . No Oriente temos o Kama Sutra, de Vatsayana, um estudo detalhado sobre o kama que é o amor e o prazer sexual. No Império Romano começa o interesse pelas formas mórbidas de prazer, como o sadismo e a flagelação. Esse interesse pelo castigo físico, que se estende pela Idade Média, se deve à moral católica, como forma de reprimir o desejo sexual. Os castigos antes aplicados nas costas e ombros foram transferidos para partes baixas do corpo, como as nádegas, por exemplo, por medo que os danos se tornasse irreversíveis. Acabou se transformando em mais uma forma de prazer. Segundo as autoras, a popularização da pornografia se dá com o Marquês de Sade, pela perversão, devassidão e libertinagem. O principal crime do Marquês foi o estupro de uma mulher a quem açoitou com um ramo de árvore, fazendo cortes no corpo dela com um canivete e colocando cera nas feridas. Há ainda Leopold Von Sacher-Masoch, o Barão Sacher-Masoch, criador do masoquismo, destacado em seus livros por causa da atração pela crueldade. No século XIX há uma disseminação do erotismo, com publicações clandestinas, na moda e na fotografia, com o destaque dado ao corpo feminino. No século XX, com o avanço tecnológico – fotografia e cinema no início, televisão na década de 50 e Internet e meios digitais de comunicação na de 90, ocorre uma explosão do erotismo, principalmente a partir dos anos 60 com a revolução sexual.
Segundo as autoras:
“(…) A pornografia é consumida. Mesmo sendo produzida para consumo, não pode ser considerada um produto comum. (…) Ao ser consumida ela aciona um mecanismo todo particular do ser humano: a fantasia. Apesar de todo esforço das sociedades de massa em direção à homogeneização da sexualidade, podemos supor que cada indivíduo possa se relacionar de modo singular com o material pornográfico. Essa relação consumidor/produto, ou imaginação individual/pornografia, se inscreve no universo do proibido, ou mais especificamente, essa relação vai passar pela forma particular que cada pessoa tem de digerir as proibições, de transgredir. (…) A proibição existe para ser violada. Esse é o ponto de partida dessa reflexão. Por isso, o proibido pressupõe sempre a sua contrapartida oposta e inseparável: a transgressão. (…) A prática do proibido só é possível na forma de transgressão e é isso que alimenta e impulsiona a nossa vida sexual. É isso que vai dar o colorido singular que nós chamamos de desejo“.

A mulher era considerada na Antigüidade como o símbolo do desejo sexual, mito reforçado pelo cristianismo, com Eva seduzindo Adão e dando origem ao pecado original. No século XVIII, com o surgimento da classe média nasce o mito da mulher como anjo doméstico . A percepção da mulher como objeto continua até os dias atuais, difundida através da mídia a qual trata meninas como adultas pelo culto à beleza física e à sedução, como um produto a ser consumido .
Sobre pornografia há uma decisão do Supremo Tribunal Federal :
“Obscenidade e pornografia. O direito constitucional de livre manifestação do pensamento não exclui a punição penal, nem a repressão administrativa de material impresso, fotografado, irradiado ou divulgado por qualquer meio, para divulgação pornográfica ou obscena, nos termos e forma da lei. À falta de conceito legal do que é pornográfico, obsceno ou contrário aos bons costumes, a autoridade deverá guiar-se pela consciência de homem médio de seu tempo, perscrutando os propósitos dos autores do material suspeito, notadamente a ausência, neles, de qualquer valor literário, artístico, educacional ou científico que o redima de seus aspectos mais crus e chocantes. A apreensão de periódicos obscenos cometida ao Juiz de Menores pela Lei de Imprensa visa à proteção de crianças e adolescentes contra o que é impróprio à sua formação moral e psicológica, o que não importa em vedação absoluta do acesso de adultos que os queiram ler. Nesse sentido, o Juiz poderá adotar medidas razoáveis que impeçam a venda aos menores até o limite de idade que julgar conveniente, desses materiais, ou a consulta dos mesmos por parte deles”.

Germaine Greer diz o seguinte sobre pornografia:
“A pornografia ilícita é a desbravadora. Onde ela vai, a mídia legítima precisa ir atrás se não quiser deixar para os inescrupulosos a parte do leão dos lucros, e finalmente, o negócio todo. Se os filmes cults conseguem gerar, por uma bagatela, o tipo de interesse da mídia que custa milhões aos filmes normais, estes vão copiá-los – lenta, mas inevitavelmente. Por mais saliva que se gaste na questão do que as crianças devem ou não assistir, o problema real é o que a geração dos pais quer que seja mostrado. Enquanto houver demanda, a indústria pornô estará ali para servi-la. Enquanto houver cigarros, as crianças fumarão. Enquanto papai guardar revistas de mulher pelada e vídeos pornôs na gaveta das meias, seus rebentos vão vê-los. A idéia de que as crianças podem existir num mundo e seus pais noutro é uma ilusão. Histórica e etimologicamente, a pornografia é tão somente a publicidade da prostituição. Ela é distinta , portanto, da obscenidade. Obscenidade é a descrição do que não pode ser visto. Alguma pornografia, mas de modo algum toda, é obscena: boa parte da obscenidade não é minimamente pornográfica. (…) Boa parte da pornografia abastece nichos de mercado e é absolutamente irrelevante para as pessoas cuja sexualidade não foi desviada nessa direção. As preferências de minorias sexuais são classificadas, em geral, como parafilias e consideradas anormais; a sociedade permissiva tendia a aceitar as parafilias como um aspecto essencial da atividade sexual humana. “Aquilo que ligar você” era o que você estava autorizado a fazer nos inocentes anos 60, antes de a tampa ser levantada e termos uma visão da lata de vermes que é a sexualidade humana. O que os reformadores sexuais dos anos 60 pensavam estar liberando era o desejo das pessoas de agradarem umas às outras; o que eles não estavam preparados para enfrentar foi a intensidade da necessidade que muitas pessoas têm de machucar umas as outras e inclusive ferir, para chegar mais perto de seu próprio orgasmo total. (…) Numa sociedade sem liberdade, a maioria das atividades chamadas consensuais representa a capitulação do que não tem poder às exigências do poderoso. O poder vem em diversos disfarces, como dinheiro, status, patriarcalismo e invulnerabilidade emocional. O propósito da pornografia é despertar desejo na ausência deste, despertar apetite onde não existe fome (…) Onde existe necessidade, não é preciso estimular a demanda; onde não existe qualquer necessidade, uma imagem sedutora terá de ser usada para criar a demanda. As pessoas que não têm o menor desejo de comer um pedaço de pão com manteiga porque não estão com fome, podem ser estimuladas a desejar chocolate se o chocolate lhes for apresentado como algo mais que comida, como êxtase, exultação e orgasmo. O chocolate é uma guloseima que engorda, comercializada como se fosse uma droga; quando os alimentos, de tortas de maçã a queijos processados, são apresentados como causadores de euforia, é a experiência da droga apresentada como meio para o bem-estar. O alimento produzido comercialmente é também falso, quase sempre não produzidos com as substâncias mencionadas no rótulo, mas com químicos análogos e aditivos, e incrementados com aditivos aromáticos e quantidades exageradas de sal e adoçantes. Da mesma forma, o sexo rápido comercial é falso, divorciado da paixão e da reprodução. A propaganda de alimentos vende comida de fantasia e a de sexo, sexo de fantasia. Do mesmo jeito que a publicidade de fast-food e doces eliminou o apetite de tal forma que ninguém sabe agora que a fome é o melhor tempero para qualquer comida, a pornografia eliminou o desejo. O marketing de alimentos nos trouxe distúrbios alimentares e é bem provável que o marketing do sexo terá as mesmas conseqüências. Já nos empanturramos ou morremos de fome por sexo de tal forma que fazer amor virou atividade substitutiva – fetichista, obsessivo-compulsiva e profundamente sem graça. (…) A pornografia desencadeia uma reação genital, provoca excitação e sugere uma descarga iminente; a pornografia é o que torna o sexo rápido possível, sozinho ou acompanhado. O fast-food é um meio de neutralizar a fome e, portanto, da intrusão de imagens de alimentos em outras ocupações mentais. O sexo rápido também deveria preparar o terreno para um tipo diferente de ação. A disseminação da pornografia é muito parecida com a ascensão da batata chips que agora ocupa dois lados inteiros de um corredor do supermercado local. Agora as fritas vêm temperadas, e também embebidas de produtos químicos que simulam sabores de camarão, bacon defumado, molho inglês… (…) As fritas são um excelente exemplo de alimento que engorda e não alimenta; o sexo virtual, como a comida virtual, é planejado para deixar o consumidor insatisfeito. A discussão do que pode ou não ser visto em vídeos e filmes não têm nada a ver com pornografia e sim com limiares de capacidade de chocar, que recuam sem parar. (…) Durante quase 70 anos, o movimento avançou na direção de mostrar mais; o que deveríamos esperar, mais cedo ou mais tarde, é que o estômago da sociedade fique virado, já que houve todo tipo de práticas, das brigas de cães e de galos, saunas gays e sex shops à queima de livros, prisão de desviados, véus cobrindo mulheres e raspagem da cabeça de homens. O Taliban não é nenhum fenômeno novo; o que deveríamos almejar, talvez, seria por uma revolução mais pacífica e menos cruel, em que as pessoas ficassem longe de espetáculos indecentes e brutais simplesmente por não ter estômago para eles, e seus promotores começassem a perder muito dinheiro“.

Jimena Pettinato mostra como funciona a pornografia na Internet:
“Onde começou esta estória? Qualquer pessoa com uma câmara e uma mente um pouco perversa pode criar uma imagem para este tipo de site. A pornografia de amateurs é bastante comum, mas as maiorias dos sites que tratam estes temas são profissionais. Felizmente para os que se dedicam a este tipo de negócios, não faltam pessoas que posem frente a uma câmara e tirem a roupa. Os fotógrafos com conexões na tradicional indústria sabem onde localizar os modelos que começam a se apresentar nas páginas Web com a intenção de se fazerem conhecer para depois serem convocados para filmes ou revistas. Mas ainda assim é um negócio legítimo, cada modelo deve ser maior de idade e confirmar aos fotógrafos, os direitos de vender suas imagens. Nos últimos dois anos, a regulação segura tem-se convertido numa realidade aceitada, e a maioria dos fotógrafos não se arrisca a vender seus produtos sem a devida autorização. Uma vez que o material está pronto deve-se fazê-lo chegar até aquelas pessoas que desejam publicá-lo on-line. Quando a Rede era algo recente e desconhecido, muitas pessoas simplesmente escaneavam fotografias de algumas revistas especiais, ou as apresentações dos vídeos pornográficos, e depois as publicavam em grupos de debate. Assim começaram a formar-se os primeiros sites pornográficos com material copiado de um site a outro. (…) Alguns fotógrafos vendem diretamente seu material a este tipo de site. Porém geralmente este processo tem duas partes: Um distribuidor compra pornografia de um grande número de fontes originais, e depois revende as imagens aos proprietários dos sites. A maior parte das fotografias são digitalizadas, escaneadas, e depois armazenadas em CD-ROMs. Cada CD contém ao redor de 600 imagens e pode ser vendido por diferentes preços, segundo o tipo do material que seja. (…) Com tanta pornografia gratuita disponível, os sites pagos devem exibir algo mais que simples imagens. Os vídeos interativos, as atuações das celebridades, e imagens de famosas personagens, têm um alto custo de produção, e ademais pode ser uma diversão não muito produtiva para os consumidores. Por isto, a maior parte do material pago é distribuído pelas mesmas companhias que os desenvolvem. (…) Aproximadamente umas 30 milhões de pessoas por dia entram nos sites pornográficos, e provavelmente, naqueles que oferecem imagens gratuitas. De acordo às estatísticas, os sites que oferecem material gratuito compreendem entre 70 e 80 % do material pornográfico disponível. Estes sites são os que verdadeiramente atrapalham aqueles nos quais se deve pagar para obter informação. Os sites de pornografia gratuita só ganham dinheiro quando um usuário visita o site do anunciante e realiza uma compra. Geralmente, um site “premium” partilha entre 30 e 60% de cada venda com o site ao qual se refere. E ainda que esta cifra lhe pareça bastante generosa, deve pensar que atualmente é difícil os sites gratuitos capitalizarem seus acordos. Ainda que o 5 ou o 10 % dos visitantes poderiam clicar sobre um banner, só um ou dois de cada mil usuários comprará o serviço oferecido. Por isto, os sites gratuitos utilizam alguns truques para atrair a maioria dos usuários para que cliquem sobre seus banners e assim possam ganhar dinheiro; como por exemplo, prometer mais conteúdo gratuito, e exibir mais anúncios cada vez que um usuário deixar a página. Geralmente, os usuários não se importam com a utilização de determinados truques para chamar a atenção, desde que haja suficiente material gratuito para satisfazer suas necessidades. A última palavra é do usuário, que realmente decide se o material que encontra nos sites gratuitos satisfaz todas suas necessidades. De repente, algum dia decide clicar sobre alguns dos banners dos sites não gratuitos, registrar-se, e começar a pagar… O conteúdo dos sites pornográficos pagos, particularmente os vídeos ao vivo e os chats interativos, são extremamente custosos de produzir, e a maioria dos sites pagos compram seu material de centenas de fornecedores que o oferecem. Para poder pagar este material, os sites necessitam não só atrair, mas também manter a milhares de usuários que contratem seus serviços. Uma vez que o cliente se registra, é muito importante que se mantenha sua atenção e sua visita durante alguns meses. Os sites pornográficos pagos oferecem o mesmo tipo de incentivo, ou seja, preços mais baratos durante um período determinado de tempo, tratos especiais, desconto para o registro de algum amigo, etc., igual que outras empresas que assim o fazem também na base dos registros. (…) Alguns prometem um mês grátis de acesso, mas finalmente, o usuário termina pagando. (…)“.

A pornografia é um meio de expressão que tem sua liberdade garantida como outro qualquer, desde que não se seja ou não se torne ilegal, como no caso do envolvimento de crianças ou o material ser vendido a menores.
A pedofilia é a maior preocupação dentro e fora da Internet, não apenas sobre veiculação de imagens de crianças em cenas de sexo, mas principalmente a exploração de crianças para elaboração dessas imagens .
Importante a diferenciação entre a pedofilia e a exploração de crianças. Na pedofilia, o pedófilo seduz a criança para si próprio. Na exploração, crianças são aliciadas para serem exploradas sexualmente por terceiros .
Gianni Carta mostra que a pedofilia é facilitada pela miséria, turismo sexual e pela Internet, tornando-se uma lucrativa indústria. Não afeta apenas países pobres como Tailândia, Camboja e Costa Rica – considerada o paraíso da pedofilia, pois não considera crime a posse de pornografia infantil – mas também países ricos como Estados Unidos e Bélgica, os quais, através da cooperação entre suas polícias, acabaram com uma das maiores redes internacionais de pedofilia, o clube virtual Wonderland. Diz o autor:
“O abuso sexual contra crianças é uma das mais lucrativas indústrias globais. Dados levantados pelo juiz Walter Fanganiello Maierovitch – e apresentados por ele na Itália, em dezembro de 2000, durante a convenção da ONU sobre crime organizado transnacional – mostram a dimensão do mercado internacional da pedofilia. Segundo Maierovitch, o lucro anual com a pedofilia chega a US$ 5 bilhões. Vídeos envolvendo crianças rendem um lucro anual de US$ 280 milhões. E, ainda de acordo com o juiz, no ano passado foram localizados 7750 sites de pedofilia na Internet – 50% deles nos EUA – a previsão de especialistas é que o número total de sites do gênero deve ser cerca de dez vezes maiores que esse. “Aproximadamente, 2 milhões de crianças são cooptadas e escravizadas pelas internacionais criminosas”, afirma Maierovitch. Como em todos os tipos de comércio, a indústria da pedofilia existe porque há demanda. E nos últimos anos, a exploração sexual de menores vem crescendo. Devido aos preços cada vez mais baixos das passagens aéreas e dos pacotes turísticos, viajantes pedófilos, em sua maior parte norte-americanos e europeus, vão com maior freqüência a países na Ásia, África e América Latina. E com a introdução da Internet, a rede global de pedófilos ganhou força. Cresceu o fluxo de informações sobre crianças em diversos países, e também a comercialização de fotografias e vídeos pornográficos. (…) O psiquiatra francês Pierre Sabourin diz que o pedófilo, quase sempre homem, pode ter qualquer idade, orientação sexual, religião e nacionalidade. Muitas vezes sofreu abuso sexual na infância. Tende a viver só, a não ter emprego, e tem dificuldade em fazer amizade com adultos. O que explica o fato de ele se sentir à vontade com crianças. Segundo o site da Interpol, o pedófilo predador, aquele que rapta e estupra, é a exceção, não a regra. O mais comum é o pedófilo que compra pornografia infantil e não realiza suas fantasias. Forças inibidoras internas, diz ainda a Interpol, controlam seus impulsos. E forças inibidoras externas (medo de ser pego, encarcerado, e de ser exposto publicamente) contribuem para que o pedófilo não moleste crianças. Porém, o tédio e o estresse podem desencadear um novo ciclo. O pedófilo passa, então, a ir a lugares públicos, como piscinas, ou parques freqüentados por crianças. Ele detecta aquelas que lhe parecem mais vulneráveis, talvez tímidas, e faz contato. Oferece presentes, quem sabe um passeio de automóvel. As táticas são várias. O processo de aproximação entre pedófilo e presa pode levar anos. Em certos casos, nunca haverá contato sexual. Mas, quando e se ocorre o ato sexual, o pedófilo usa artifícios para que a criança não conte nada a ninguém: ameaças, favores, sentimento de culpa. (…) Membros de sofisticados clubes de internautas globais, como o Wonderland, que envolveu 13 países e 180 homens, trocaram, até serem descobertos no início do ano, imagens de 1236 vítimas, todas menores. Em várias ocasiões, crianças foram estupradas ao vivo, via Internet. Como combater a pedofilia na Internet? Parcerias como aquela entre a polícia belga e a americana. Em março, 30 pessoas que distribuíam imagens pornográficas de crianças foram presas em Manchester, graças à colaboração entre a polícia e a empresa privada SurfControl “.

O Estatuto da Criança e do Adolescente determina:
“Art. 241 – Fotografar ou publicar cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:
Pena – reclusão de um a quatro anos”.

Sobre essa conduta há um julgamento do Supremo Tribunal Federal:
“Crime de Computador“: publicação de cena de sexo infanto-juvenil (E.C.A., art. 241), mediante inserção em rede BBS/Internet de computadores, atribuída a menores: tipicidade: prova pericial necessária à demonstração da autoria: HC deferido em parte.
1. O tipo cogitado – na modalidade de “publicar cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente” — ao contrário do que sucede, por exemplo, aos da Lei de Imprensa, no tocante ao processo da publicação incriminada é uma norma aberta: basta-lhe à realização do núcleo da ação punível a idoneidade técnica do veículo utilizado à difusão da imagem para número indeterminado de pessoas, que parece indiscutível na inserção de fotos obscenas em rede BBS/Internet de computador.
2. Não se trata no caso, pois, de colmatar lacuna da lei incriminadora por analogia: uma vez que se compreenda na decisão típica da conduta criminada, o meio técnico empregado para realizá-la pode até ser de invenção posterior à edição da lei penal: a invenção da pólvora não reclamou redefinição do homicídio para tornar explícito que nela se compreendia a morte dada a outrem mediante arma de fogo.
3. Se a solução da controvérsia de fato sobre a autoria da inserção incriminada pende de informações técnicas de telemática que ainda pairam acima do conhecimento do homem comum, impõe-se a realização de prova pericial”.

O Estatuto foi criado em 1990 quando se pensava apenas em publicação impressa ou vídeo. Agora com as mídias digitais isto precisa ser revisto. Organizações não-governamentais e autoridades têm criticado este artigo por causa da pena muito branda. Mas não é esse o caminho.
É preciso observar os dois núcleos do tipo previsto neste artigo. Foram igualadas duas condutas de natureza distinta. Enquanto fotografar pressupõe a exploração sexual do menor, pois será a realização efetiva do ato, requerendo toda uma preparação para a elaboração da fotografia, portanto uma conduta muito mais grave, publicar consiste apenas em tornar público algo já realizado, disponibilizar a cena pornográfica. No primeiro caso temos um criminoso, no segundo um doente.
Não se pode reduzir a conduta pedófila ao ato em si. Deve-se observar todo o contexto social. Mas também não se pode afastar a dimensão penal, pois há violência praticada. A pedofilia é classificada como parafilia , distúrbio sexual, um desvio de personalidade. O pedófilo precisa primeiramente de tratamento, não de cadeia. Muitas vezes, a prática daquela conduta para o indivíduo se torna inevitável, irresistível, embora saiba que seja errado. Há que se pensar em tornar o tratamento para o pedófilo obrigatório, como se faz em alguns países.
O objetivo deve ser a repressão à produção do material, quando se pratica o dano efetivo ao menor.
As duas condutas devem ser reprimidas. Mas o simples aumento de pena não é a solução. É preciso separar as condutas buscando uma punição conforme a gravidade de cada ação. Na maioria dos casos são punidos da mesma forma aquele que abusou de crianças para elaboração de fotos e aquele que apenas transacionou, trocou fotos pela Internet apenas para a satisfação de um impulso.

Referências Bibliográficas:
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CARTA, Gianni. Mercado brutal. Carta Capital. São Paulo, edição 156, p. 14-19, 12 de setembro 2001.
DI FRANCO, Carlos Alberto. Internet e Pornografia, no endereço http://www.hottopos.com/mirand3/internet.htm, 2001.
DUNAIGRE, Patrice. O ato pedófilo na história da sexualidade humana. In: UNESCO. Inocência em perigo – Abuso sexual de crianças, pornografia infantil e pedofilia na Internet. Rio de Janeiro: Garamond, 1999. Capítulo 1, p. 9-23.
GREER, Germaine. O mercado do sexo. Carta Capital. São Paulo, n. º 135, p. 50-52, 8 de novembro 2000.
MARZOCHI, Marcelo De Luca. Direito.Br – Aspectos Jurídicos da Internet no Brasil. São Paulo: Editora LTR, 2000.
MORAES, Eliane Robert e LAPEIZ, Sandra Maria. O que é Pornografia? São Paulo: Abril Cultural e Brasiliense. Coleção Primeiros Passos, 1985.
NORDLAND, Rod e BARTHOLET, Jeffrey. The Web’s dark secret. Newsweek. New York, 19 de março 2001, p. 36-43.
NOVAES, Carlos Eduardo e LOBO, CÉSAR. Sexo para principiantes. São Paulo: Editora Ática, 4.º edição, 1997.
PETTINATO, Jimena. Sexo em la Red, agosto de 2000, no endereço http://www.omicro.com.br/artigos/sexoenweb2/index.php3.

Marcelo De Luca Marzochi é autor do livro “direito.br – Aspectos Jurídicos da Internet no Brasil”, publicado pela Editora LTR.

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