Privacidade e marketing, o jogo dos atos hostis

Permission marketing, spam, e-marketing direto, não interessa o chavão, pois são atos hostis. Nesta artigo, Hernani Dimantas, consultor de marketing e ativista na defesa da privacidade dos usuários. faz qualquer marqueteiro repensar a sua estratégia.

Hernani Dimantas

Vamos partir de um princípio. Somos todos seres humanos. Cães não acessam à Internet. Ainda.

Marketing é um ato hostil. O marketing existe porque o mercado não é propriedade das empresas. Elas querem mostrar seus produtos, sua marca e qualquer outra coisa para aumentar seus lucros. Os marketeiros são os que tem que fazer o trabalho sujo.

Na Internet não existe muita diferença, aliás, ela só facilita o trabalho. Nada mais cruel do que se valer de uma tecnologia questionável, que esconde, por trás de uma cortina de bits, a ação destes ditos profissionais.

Qual é o motivo para mandar SPAM? Eles usam a sua linha telefônica, o seu computador e a sua paciência para apertar o “delete”, em troca de abusos da sua boa vontade. O pior é perceber que você está sendo monitorado quando visita um site qualquer, e recebe no dia seguinte um email cheio de promoções idiotas. Os bons profissionais execram essa prática. Isto é um desrespeito ao próximo. Não faça ao próximo o que não gostaria que fizesse contigo.

Mas esses usurpadores com carteirinha não estão preocupados. Agem com a maior normalidade. São negócios, e no mundo dos negócios a lei só existe para os fracos. E quanto ao “junkmail” corporativo? Esse é o conceito do marketing de permissão levado ao extremo da falta de ética. Lixo na caixa postal. Gasta-se fortunas imensuráveis para conseguir uma permissão, o primeiro contato, o endereço do email. Tudo limpo e correto. Mas na hora da conversa, quando o consumidor deveria receber um bouquet de flores, tudo é esquecido. Volta-se ao velho teatro. Cliente tem que sofrer. As empresas esquecem que marketing é um conceito amplo.

Parece que está tudo indo muito mal neste espaço de ninguém. Será que estamos prontos para o próximo “round”? Dois cruzados de esquerda já me deixaram um pouco tonto, mas ainda tem o direto. Realmente, o marketing direto não tem dó. Bate no pobre internauta. Sem a menor compaixão. Agora o negócio é sério. O spam enche o saco, mas a recolha de dados apavora. Por que apavora? É só olhar para o futuro, para a geração dos nossos filhos, e perceber que o mundo poderá ser muito pior, e bem rápido. Como estão fazendo essa coleta de dados?

Ora, simplesmente desrespeitando os direitos humanos. A forma não cabe neste artigo, mas é fruto da malícia de pessoas sem escrúpulos. O homem é quem programa o computador, e este trabalha graciosamente para recolher, juntar e disseminar as informações. As empresas de cartões de crédito sabem muito bem do que estamos falando, embora elas sejam uma fatia muito pequena do problema, e trabalhem com os dados que elas próprias manuseiam. Elas sabem muito mais da vida do cliente do que se pode imaginar.

A culpa não é da Internet. Ela é apenas um meio de os homens se relacionarem. O engraçado é que os ‘media’ só fazem publicidade aos vândalos cibernéticos, mas quem vai abrir a boca para denunciar estas atividades também ilegais? Perdemos um tempo enorme falando de protocolos, de firewalls e de tantos outros itens de segurança, e esquecemos palavras como educação, respeito, cultura e filosofia. A solução não está na tecnologia, mas sim na ética.

Privacidade é um assunto importante. Talvez seja a questão central da era da Informação. Teremos um admirável mundo novo, ou seremos corroídos pelo Grande Irmão?

No entanto, os mercados estão conversando. Talvez seja de uma forma ainda incompreensível para as empresas e para os marketeiros de plantão. Essa conversa vai muito além do que se analisa. A comunidade já criou o Linux, o apache, e outros produtos que representam a revolução da informação. Está criando mais, e mais. Isto, enquanto as empresas continuam caminhando sobre as pedras monolíticas herdadas da revolução industrial. Não vale a pena ver este filme outra vez. O mercado está mudando, e rápido. Quem está trabalhando na rede no velho estilo não está conseguindo se estabelecer. O Nasdaq parou de dar a sustentação ao mercado, e quase voltamos ao tempo das carroças digitais. Por que será? Quem não percebeu que o maior ativo na rede é a participação, o inter-relacionamento, o respeito pelo direito dos usuários, a qualidade dos serviços, a transparência e a vontade de voltar a ser humano? Estas são as regras do jogo. E este jogo é a Internet.

Hernani Dimantas é consultor de marketing e ativista na defesa da privacidade dos usuários.

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