Roberta dos Reis Matheus
Recentes decisões judiciais e atos normativos tentam legitimar a prática do fisco de, mediante o protesto em cartório das Certidões da Dívida Ativa (CDAs), aumentar a arrecadação de tributos em todas as esferas.
Os contribuintes sujeitos a esse procedimento são somente aqueles cujas dívidas, ou supostas dívidas, não atingem valores elevados. Tais apontamentos, no entanto, são ilegais e inconstitucionais já que a lei que disciplina a execução de créditos fiscais não prevê o protesto das CDAs.
Conforme as regras de direito público, o fisco, ao contrário do particular, somente pode fazer o que a lei expressamente autoriza. Além disso, se considerarmos que, de um lado, a finalidade do protesto, por disposição expressa da lei, é provar a inadimplência e, de outro, que o fisco pretende utilizá-lo para fins de arrecadação tributária extrajudicial, concluímos pelo desvio de finalidade, em desrespeito aos princípios constitucionais da moralidade e proporcionalidade dos atos administrativos.
Isso sem falar na ofensa ao princípio da isonomia, uma vez que os menores devedores estarão sujeitos às drásticas conseqüências do protesto, em prejuízo de suas atividades, enquanto nada muda em relação aos maiores devedores.
São comuns os casos em que os contribuintes demonstram, com simples petições dirigidas aos juízes responsáveis pelas execuções fiscais, as exceções de pré-executividade, o desacerto de determinadas cobranças, a fim de extinguir os processos.
Caso prevaleça o protesto das CDAs, esses mesmos contribuintes deverão ingressar com ações judiciais para tentar sustar ou, conforme o caso, suspender os efeitos dos protestos, nas quais certamente deverão oferecer bens para garantir o juízo a fim de obter liminares.
Essa nova tendência do fisco revela, portanto, sanção política, por impor restrição ao contribuinte como forma indireta de obrigá-lo ao pagamento da obrigação tributária. Situações semelhantes ocorrem em muitos casos nos quais se interditam estabelecimentos e apreendem mercadorias. Em tais casos, submetidos aos tribunais superiores, os desfechos foram favoráveis, em regra, aos contribuintes.
Deve-se atentar, ainda, para o fato de que os atos normativos relacionados ao tema certamente extrapolam seus limites legais e constitucionais, ratificando assim o desacerto da medida também quanto ao aspecto formal.
Tudo leva a crer que o protesto das CDAs vai aumentar a sobrecarga do Judiciário, ao contrário do entendimento dos defensores da idéia, ao mesmo tempo em que implicará risco de condenação dos órgãos públicos por danos materiais e morais, sem prejuízo de outras conseqüências.
Sem dúvida, o anseio do fisco pela arrecadação de tributos não pode transpor as barreiras legais nem constitucionais que devem pautar sua atuação, sob pena do pretexto da defesa de interesses públicos servir de fundamento para qualquer ato administrativo, abusivo e arbitrário, como é o caso da sanção política materializada em um protesto.