Que Receita Federal queremos para daqui a dez anos?

Autora: Fabiana Meneghini e Silva (*)

 

Olhando para o futuro e idealizando uma Receita Federal para daqui a dez anos, ao observar e analisar as estruturas atuais, percebo que muita coisa pode e deve ser mudada. Divididas em três seções, apresento abaixo as principais mudanças que desejo:

1. Sistema Tributário Nacional
Sob o ponto de institucional, a atual política fiscal do país apresenta um sistema tributário com um alto grau de ineficiência, com capacidade limitada de arrecadação, impactando negativamente e de modo primário o crescimento do produto, e de modo secundário a capacidade de distribuição dos recursos públicos para a população.

Diante disso, o primeiro ponto que desejo para a Receita Federal daqui a dez anos é um sistema tributário menos burocrático. A burocracia é algo inerente a qualquer serviço público de um país, mas se faz necessário buscar um equilíbrio onde seja possível prestar um serviço eficiente e de qualidade, sem perder o controle sobre os mesmos.

Para reduzir a burocracia, é fundamental uma simplificação da regulamentação fiscal, promovendo a redução das alíquotas e da evasão fiscal (uma alíquota mais justa motiva a diminuição da informalidade e de manobras fiscais corporativas), mesmo porque os impostos pagos pelas empresas são transferidos para o custo dos produtos e serviços comercializados por elas, e no final quem paga a conta é sempre o cidadão.

Outro ponto importante é a redução e a eliminação de incentivos e isenções fiscais, que acaba privilegiando algumas empresas específicas em detrimento de outras, e geram uma superproteção que no final acaba gerando um sistema produtivo ineficiente, sem capacidade de competir no mercado internacional, sem capacidade de se expandir, e com existência limitada aos benefícios governamentais.

E, para encerrar essa seção, também defendo o fim da faixa de isenção de imposto de renda para as pessoas físicas, de modo que todos os cidadãos que tenham atividade produtiva paguem impostos, em maior ou menor grau, dependendo de sua capacidade financeira.

2. Estrutura Operacional da Receita Federal
Em relação à estrutura operacional, daqui a dez anos gostaria de ver uma Receita Federal mais transparente, que publique semanalmente os seus entendimentos relativos a todos os assuntos mais polêmicos e que gerem mais dúvidas. Todos os auditores deveriam seguir esses entendimentos em eventual fiscalização. O contribuinte, tendo acesso a esses entendimentos, teria a oportunidade de corrigir os seus erros antes de uma eventual fiscalização.

Também espero uma evolução da Receita Federal no que diz respeito à educação fiscal, e não apenas na repressão, pois com contribuintes mais bem educados, teríamos uma redução no contencioso fiscal, resultando em menor custo de conformidade das empresas nas diversas áreas fiscais das mesmas, além da redução dos custos processuais oriundos da menor insegurança jurídica. A educação fiscal deveria começar a fazer parte das disciplinas de segundo grau, bem como de todos os cursos universitários, uma vez que todos os cidadãos graduados também são contribuintes fiscais.

Também gostaria de ver uma Receita Federal mais independente, com autonomia para conduzir suas operações de forma mais técnica e eficiente possível. Problemas de ingerência política, inúmeras vezes atrapalham o andamento dos processos fiscais.

Por fim, gostaria de ver um órgão julgador mais justo, tratando com o mesmo grau de igualdade os contribuintes no julgamento de seus processos, de forma mais ágil e eficiente.

3. Estrutura Administrativa da Receita Federal
Ao longo dos próximos dez anos, espero que a Receita Federal possa conduzir a realização de mais certames públicos, de modo a aumentar seu quadro técnico e, conseqüentemente, seu poder de fiscalização. O atual quadro de servidores da Receita Federal é insuficiente para realizar com eficiência as atribuições técnicas do Órgão e, como isso é de conhecimento público, muitas empresas se aproveitam desse fato para continuar operando de modo informal, bem como pessoas físicas sonegando impostos com a certeza de que continuarão impunes.

Ao longo dos próximos dez anos também se faz necessária uma reforma administrativa em relação à remuneração dos servidores da Receita Federal, vinculando parte significativa da remuneração ao cumprimento de metas claras e pré-definidas, além de gratificação diferenciada para os diferentes níveis acadêmicos (portadores de diplomas de Especialista, Mestre, Doutorado e Pós-Doutorado), bem como uma escala de gratificação diferenciada mais atraente para os diversos níveis de Chefia, compatíveis com as responsabilidades que tais funções exigem. Tais medidas são fundamentais para atrair novos talentos e manter os bons servidores junto ao quadro técnico, uma vez que nos últimos anos a Receita Federal tem perdido servidores que migraram para os quadros técnicos das Receitas Estaduais, que têm remunerado melhor os seus servidores, ou mesmo para a iniciativa privada.

Por fim, espero que a estrutura simplifique também os processos administrativos que resultem na demissão dos servidores ineficientes e não comprometidos com a função a eles atribuída.

Em linhas gerais, daqui a dez anos quero uma Receita Federal mais humana e mais próxima da população, com os cidadãos entendendo claramente o papel da Receita na sociedade brasileira, bem como o seu próprio papel como contribuinte. E quero poder me orgulhar de dizer que sou Auditora Fiscal da Receita Federal do Brasil.

 

 

 

 

Autora: Fabiana Meneghini e Silva é auditora fiscal da Receita Federal e pós-graduada pelo MBA Pós-GVLAW da RFB.


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