ENG. Paulo Andres Costa
Quando o Instituto Nacional do Seguro Social
cita em suas disposições normativas uma norma
técnica da ABNT, supõe-se que a citação tenha
origem em um estudo criterioso e num
onhecimento consolidado do texto. Correto? Nem
sempre.
Por inúmeras vezes, temos questionado o uso
que o INSS faz da NBR 12.721/92 da ABNT. Uso
que se fundamenta em apenas um de seus
objetos – o CUB (Custo Unitário Básico da
onstrução Civil). O restante da aplicação da
norma citada é, via de regra, um misto de
interpretação leiga, conceitos redefinidos ao
gosto do propósito a que servem, e, não poucas
vezes, fruto de artifícios de um lógica distante do
contexto normativo.
Evidente que o “status” do Custo Unitário
Básico confere ao sistema que nele se sustenta
uma credibilidade por consequência. Este aval, na
verdade, é o objetivo do procedimento do INSS,
que, utilizando o custo unitário básico por metro
uadrado, estima um custo de mão de obra e,
sobre este, arbitra as contribuições à previdência
social.
O não dito nas instruções normativa desse
instituto é que, entre os dados que geram esta
estimativa e o resultado final, existe um caminho
que, mesmo sendo definido em norma como um
“procedimento matemático simplificado”, exige
um profundo conhecimento dos conceitos e do
modelo matemático proposto. É simplificado em
comparação com o complexo sistema de
orçamentação onde são discriminados todos os
tens, e seus respectivos preços, que farão parte
do custo final de uma obra de construção civil.
Mas não o é em relação aos conceitos e aos
rocedimentos matemáticos que geram o cálculo.
A Ordem de Serviço 161/97 do INSS, que
estabelece o roteiro de cálculo para aferição
indireta de salários de contribuição em obras de
construção civil, por exemplo, estabelece que as
unidades habitacionais cuja área seja inferior a
100,00 m2 (cem metros quadrados) podem ser
classificadas como de padrão Baixo; aquelas que
estiverem no intervalo de 100,00 m2 (cem
metros quadrados) até 250,00 m2 (duzentos e
cinqüenta metros quadrados) podem ser
enquadradas dentro do padrão Normal; e quando
a área superar os 250,00 m2 (duzentos e
inqüenta metros quadrados) serão classificadas
como de padrão alto. Esta recomendação é a que
se encontra na norma técnica citada como
fundamento? De forma alguma. A ABNT apresenta
as diversas combinações das especificações de
ateriais de acabamentos que definem os padrões
em questão (Baixo, Normal e Alto). É na
comparação do memorial descritivo da obra em
análise com as tabelas normalizadas que se
poderá dizer qual o padrão da obra – e não com
ase num critério de intervalo de áreas.
Outro aspecto, entre tantos, que merece crítica
é a forma como se define, segundo o roteiro em
uestão, a área da unidade, no caso de edifícios
com diversas unidades autônomas. Divide-se a
área total pelo número de unidades. Simples
assim. Desconhecendo conceitos de área
privativa, de uso em comum e total.
Após criar este conceito rápido e quantitativo
de padrão de construção, a Ordem de Serviço abre
a possibilidade de apresentação de “laudo de
padrão” elaborado por profissional habilitado, com
registro no Conselho Regional de Engenharia,
Arquitetura e Agronomia (CREA), mediante
anotação específica de responsabilidade técnica,
como forma de contestação ao padrão adotado
pela aferição do INSS.
É exatamente esta a questão central: por que
se sugere (e a informação ao contribuinte fica a
critério do INSS) a apresentação de um
documento técnico que defina o padrão em
ubstituição a um laudo que estabeleça o custo da
mão de obra? Por que o profissional habilitado
legalmente é chamado a corrigir um equívoco
riginado em conceitos de origem duvidosa, e não
lhe é – como deveria ser – solicitado o laudo
integral com o valor estimado segundo os
preceitos normativos? Porque o sistema de
aferição indireta proposto mantém vigilância
obre o resultado final. Assim como se toma parte
da norma da ABNT, toma-se parte do trabalho
profissional. Assim como o CUB empresta seu
aval ao valor aferido, o profissional concede ao
esquema de cálculo sua habilitação naquilo que
lhe é “permitido”.
Quando se adota um norma para determinado
serviço técnico, não se pode recorrer ao
expediente de excluir as disposições que não
conduzem a um resultado desejado. Aliás, o
bjetivo do normalização, segundo a ABNT, é:
Estabelecer e aplicar regras a fim de
bordar ordenadamente uma atividade
específica, para o benefício e com a
articipação de todos os interessados e,
em particular, de promover a otimização
da economia, levando em consideração
as condições funcionais e as exigências
de segurança.
Seja dito que, para toda intervenção do
profissional de engenharia civil e arquitetura, o
INSS exige a anotação de responsabilidade
técnica junto ao CREA; no entanto, para o cálculo
final, elaborado pela própria instituição, a
exigência de responsabilidade técnica é
sumariamente desconsiderada.
Havendo intenção de provar que o custo de
mão de obra não é o aferido, o INSS estabelece
onde a norma técnica da ABNT tem validade, e
quando o profissional pode atuar. E isto,
efinitivamente, não é ter uma norma técnica como
embasamento.
Voltando à questão inicial, o sistema
elaborado pelo INSS tem um objetivo apenas:
garantir a adoção de um procedimento
matemático com base em um índice confiável,
porém com a garantia adicional de que a
arrecadação atingirá valores previamente
stabelecidos.
E, para isso tudo, pelo menos o INSS conhece
os fundamentos básicos da norma que define o
uso do CUB? Na instrução normativa No 08, de 23
de outubro de 1998 – Manual de Procedimentos de
Arrecadação e Fiscalização – os autores do texto
que “explica” os conceitos da NBR 12.721 chegam
a abusar de sua capacidade criativa. Para explicar
o significado da letra “H” nas tabelas divulgadas
elos Sindicatos Estaduais da Construção Civil,
assim definem:
“6.4.1.2 – (…) Na tabela do CUB a
designação de pavimentos é
representada pela letra “H”, proveniente
da palavra “higt” em inglês, que
significa altura.”
A NBR 12.721, em nota à Tabela 01,
nsina:
“Nas notações adotadas para
designação dos projetos-padrão, a letra
“H” significa habitacional.”
Seria cômica, se não trágica, esta obra mais
literária do que técnica, à qual o INSS busca
mparar com fundamentos normativos sérios.
Absurdos com estes embasamentos são
apresentados em juízo, em desfavor do
contribuinte. E tudo isto com o argumento de que
a base de cálculo é o próprio Custo Unitário
Básico da Construção Civil. Quando, na verdade, a
base é desfigurada através de redefinições de
conceitos e de procedimentos de cálculo não
normalizados.
Resta-nos, apenas, evocar a Lei 5.194, de
24.12.1966, que regula o exercício das profissões
de Engenheiro, Arquiteto e Engenheiro-Agrônomo:
Art. 13 – Os estudos, plantas, projetos,
laudos e qualquer outro trabalho de
Engenharia, de Arquitetura e de Agronomia,
quer público, quer particular, somente poderão
ser submetidos ao julgamento das
autoridades competentes e só terão valor
jurídico quando seus autores forem
profissionais habilitados de acordo com
esta Lei.
Este preceito, certamente, não consta como
fundamento legal nas instruções normativas do
INSS. O valor arbitrado é calculado por fiscais e
funcionários sem habilitação legal para o exercício
de profissões regulamentadas por Lei, com base,
apenas, num roteiro que mais parece uma obra
literária de ficção. E de péssimo gosto, diga-se
em crédito dos bons autores literários.