Responsabilidade civil por dano processual no procedimento arbitral

Autor: Felipe Esbroglio de Barros Lima (*)

 

O Poder Judiciário raramente tem acolhido a pretensão de partes que ingressam com demandas buscando a anulação de sentenças proferidas em procedimentos arbitrais. No entanto, quando eventualmente ocorre a anulação da sentença arbitral — o que deve ocorrer apenas nas hipóteses taxativas do artigo 32 da Lei de Arbitragem —, as partes se deparam com a necessidade de incorrer em novas despesas para que possam ter o seu litígio finalmente resolvido, seja pela retomada do procedimento já encerrado, ou mesmo iniciando-se uma nova arbitragem. Sendo a arbitragem um processo mais caro que o judicial, é legítimo que a parte que teve despesas com um procedimento anulado busque cobrar o prejuízo daquele que causou a anulação da sentença.

A relação jurídica submetida à arbitragem normalmente tem origem em um contrato contendo uma cláusula compromissória, cuja redação é de responsabilidade exclusiva das próprias contratantes, havendo a possibilidade, ainda, que o juízo arbitral seja fixado posteriormente ao surgimento do conflito, mediante acordo entre as partes.

Assim, havendo a anulação de uma sentença arbitral, por força de eventual nulidade nesta fase pré-arbitral, via de regra será das próprias partes contratantes a responsabilidade por arcar com os custos do procedimento anulado, podendo ser estendida aos advogados que participaram da elaboração do contrato, na hipótese de verificar-se erro inescusável na sua atuação.

Num momento posterior, quando da instauração da arbitragem, o que ocorre é a formação de uma relação jurídica sui generis, de modo que tanto as partes quanto o árbitro possuem deveres de alguma natureza, umas em relação às outras. Ou seja, se inicialmente a relação possuía apenas um viés contratual, vinculando exclusivamente as contratantes, após o início do procedimento passa a ter também natureza jurisdicional, sendo as partes e o árbitro responsáveis perante si não apenas contratual, mas também processualmente.

Portanto, as partes devem observar os deveres de boa-fé e cooperação durante o procedimento arbitral, para que este possa atingir uma decisão rápida, justa e efetiva. O árbitro, por sua vez, também possui regras de atuação legalmente previstas, no sentido de atuar com imparcialidade, independência, competência, diligência e discrição, sendo-lhe imputado ainda o dever de revelação às partes de qualquer fato que suscite dúvida acerca da sua independência e imparcialidade.

Ou seja, caso ocorra a anulação da sentença por força de alguma quebra da boa-fé processual por alguma das partes — corrompendo um árbitro, por exemplo —, ou ainda pela superação do prazo para prolação da sentença, tendo a parte concorrido para a demora, a parte que ocasionou a anulação deverá arcar com o prejuízo resultante.

Por outro lado, pode o árbitro ser chamado a indenizar as partes, na hipótese em que a anulação da sentença ocorra em razão da inobservância dos princípios processuais previstos no artigo 21, §2º, da LArb, ou ainda por alguma outra hipótese prevista em lei, verificando-se que o julgador não atuou de acordo com as regras de conduta previstas nos artigos 13 e 14 da LArb. Portanto, convém chamar atenção à possibilidade de imputar ao árbitro o dever de indenizar as partes pelos seus prejuízos, caso a anulação da sentença arbitral ocorra pela quebra do dever de revelação, ou ainda pelo mau uso da técnica processual por aquele, por exemplo, decidindo fora dos limites da convenção de arbitragem.

Destaca-se que, para fins de responsabilidade civil, não é possível equiparar o árbitro ao juiz togado, à luz do artigo 17 da Lei de Arbitragem. Não apenas o dispositivo limita a equiparação à legislação penal, como o juiz é representante do Estado, este sim responsável direto pela sua atuação, enquanto o árbitro é um profissional autônomo, eleito pelas partes, sem que a Câmara de Arbitragem possa ser responsabilizada pela atuação daquele, uma vez que representa apenas papel administrativo. Não se exclui, no entanto, a possibilidade de danos pelo extravio de documentos.

Cumpre esclarecer que a legitimidade para responder à pretensão indenizatória por dano processual em procedimento arbitral não se confunde com a legitimidade passiva para responder à ação anulatória da sentença arbitral. Nesta, a ação será necessariamente direcionada contra a parte contrária, uma vez que a pretensão imediata consiste na desconstituição do título executivo que detém. Já a ação indenizatória pelos prejuízos resultantes da anulação poderá ser ajuizada tanto em face da parte adversa, como de terceiro, que poderá ser o árbitro, perito, ou qualquer um cuja atuação possa ser considerada ilícita e tenha uma relação direta de causalidade com a anulação da sentença arbitral, lembrando que, em termos de responsabilidade civil, que a indenização é autorizada quando concorrem três requisitos: o ato ilícito — definido na lei como ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência —, o dano e o nexo causal entre ambos.

Por fim, necessário esclarecer que, havendo prejuízos processuais durante o procedimento, ou quando tiver que ser proferida nova sentença, sem que seja anulada toda a arbitragem, qualquer decisão acerca da distribuição destes custos deverá ser tomada na própria sentença arbitral, conforme dispõe o artigo 27 da LArb, ressalvando-se a possibilidade da utilização do Judiciário, em ação contra pessoa que não é signatária da convenção de arbitragem, como o árbitro e o perito, assim como pela parte que jamais aderiu ao pacto arbitral e é surpreendida pela execução forçada de uma sentença, cuja existência até então desconhecia.

 

 

 

 

Autor: Felipe Esbroglio de Barros Lima é sócio do Silveiro Advogados.


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