Autores: Jorge Hage e Luiz Navarro (*)
Merece aplausos a iniciativa pioneira do estado do Rio de Janeiro (Lei 7.753, de 17 de outubro de 2017), que tornou obrigatório programas de compliancenas empresas que celebrarem contratos com a administração estadual direta, indireta e fundacional — autarquias, fundações e empresas estatais (públicas ou mistas).
Essa medida já vinha sendo cobrada por especialistas na matéria — inclusive perante a Administração Federal — a partir da experiência com a aplicação da Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013) e da Lei das Estatais (Lei 13.303/2016). Explica-se. A Lei Anticorrupção não tornou obrigatório o compliance nas empresas privadas, apenas criou incentivos para as que adotem tais práticas, prometendo-lhes a atenuação de eventual multa, caso a empresa seja envolvida em processo administrativo, além de ser condição para possível acordo de leniência.
Já a Lei das Estatais impôs, em boa hora, a obrigatoriedade para esta espécie de empresa. Não deixou de sinalizar na direção de igual exigência para as empresas privadas que com elas celebrem contratos, mas poderia tê-lo feito de forma mais expressa, sem dar ensejo a qualquer controvérsia a respeito. Foi, sem dúvida, uma falha da lei, que pode ser corrigida quando da elaboração da política de transações com partes relacionadas, conforme previsto no artigo 71, V, do Decreto 8.945/16, que a regulamentou.
Isso porque o que se almeja, afinal, com a ideia de compliance (que literalmente significa conformidade), é justamente criar um círculo virtuoso na cadeia de valor, algo como um “efeito dominó positivo”, onde cada elo dessa cadeia exija do outro a observância dos mesmos padrões de integridade e conduta ética, com o que seria legítimo esperar certa desintoxicação do clima e melhoria no ambiente de negócios.
O Rio de Janeiro, assim, dá o exemplo. É apenas um primeiro passo, que certamente comporta alguns aprimoramentos.
Um deles no artigo que concede um prazo de seis meses após a contratação para a implantação das medidas, sendo que estas são exigíveis inclusive em contratos com essa mesma duração. Assim, quando for possível cobrar o compliance, o contrato já pode estar encerrado.
Outro aspecto que deixa dúvidas é a definição do órgão público a que caberá a aferição desse programa em cada empresa contratada. A opção de atribuir essa tarefa ao gestor, ou, em sua falta, ao fiscal do contrato, não parece ser a melhor, haja vista a probabilidade de que nem todos tenham a necessária especialização técnica para tanto. Talvez se deva cogitar de conferir essa responsabilidade a órgãos de controle interno.
Seja como for, o momento é de aplaudir a iniciativa e alertar para a importância de sua extensão aos demais entes federativos, o que muito contribuiria para a elevação dos padrões éticos e de integridade — corporativa e pública — que tanta falta fazem ao nosso país.
Autores: Jorge Hage é ex-ministro da Controladoria Geral da União e sócios da Hage, Navarro, Fonseca, Suzart & Prudêncio Consultoria em Compliance.
Luiz Navarro é ex-ministro da Controladoria Geral da União e sócios da Hage, Navarro, Fonseca, Suzart & Prudêncio Consultoria em Compliance.