por Gustavo Lorenzi de Castro
As medidas de salvaguardas têm por objetivo aumentar temporariamente a proteção à indústria doméstica que esteja sofrendo prejuízo ou ameaça de prejuízo grave decorrente do aumento, em quantidade, de importações de determinados produtos em termos absolutos ou em relação à produção nacional.
As savaguardas contêm surtos de importação de determinado produto, que possa colocar em risco a saúde da respectiva indústria local. Como medida excepcional que é, tem caráter provisório — não pode ultrapassar o prazo máximo de dez anos de vigência — e tem aplicação genérica, uma vez que não pode ser aplicada contra determinado país.
Tal constatação poderá acarretar o surgimento de dúvidas, especialmente se considerarmos o firme propósito do governo brasileiro de regulamentar salvaguardas específicas para produtos têxteis, em geral da China. A decisão da Câmara de Comércio Exterior (Camex) se baseia na escalada das importações de produtos chineses, que, de janeiro a abril deste ano, aumentaram 58% em relação ao mesmo período do ano passado.
A regulamentação de salvaguardas específicas para a China visa possibilitar que setores nacionais, que se sentirem prejudicados com o aumento das importações advindas de tal país, requeiram ao Departamento de Defesa Comercial do Ministério do Desenvolvimento a sua aplicação, a fim de se refrear o fluxo crescente de importação de produtos chineses, cujos preços são incrivelmente competitivos. Cabe destacar que as salvaguardas dirigidas contra a China são específicas, e não as comuns, as quais são impostas a determinados produtos, independentemente de sua procedência ou origem.
E a exceção se deve ao fato de a China, quando da assinatura do contrato de adesão à OMC, ter se sujeitado a uma regra — conhecida como Cláusula China — que permite que salvaguardas sejam impostas apenas aos seus produtos, não atingindo os dos demais países.
Considerando que o Brasil, em toda a sua história, aplicou apenas duas medidas de salvaguardas (coco ralado e brinquedos), há que se agir com extrema cautela, pois tais medidas certamente acarretarão um aumento de práticas ilícitas nas importações, entre elas o descaminho e a subvaloração aduaneira.
Foi o que se viu quando da aplicação de salvaguarda a brinquedos importados, uma vez que, com a sobretaxa, o prêmio a ser auferido pelos fraudadores aumentou consideravelmente, a ponto de suas operações ilícitas terem experimentado notório impulso. É que a sobretaxa decorrente da salvaguarda causou, nos até então importadores legais, grande atração, refletida nas vantagens financeiras trazidas por eventual atuação marginal.
Ainda que tal sintoma seja causa externa para a discussão de aplicação ou não de determinada medida de salvaguarda, é fato que ele deve ser muito bem sopesado, especialmente neste momento em que o já eficiente Conselho Nacional de Combate à Pirataria e Delitos contra a Propriedade Intelectual está implementando importante campanha de combate às fraudes.
Por este aspecto, há que se considerar que os maiores adversários da indústria nacional não são mais os importadores legais, mas sim os que praticam ilícitos como pirataria e subfaturamento. Nesse aspecto, manter ou criar salvaguardas traduzidas por alíquota de importação elevada representa um inequívoco e subliminar favorecimento às fraudes, principalmente ao descaminho e à subvaloração aduaneira, pois a diferença de preços e a disponibilidade de receita extra são dois fatores incentivadores à prática de ilícitos.
A conclusão, todos sabem, é uma só: diminui-se o espaço para a entrada de produtos legais no país e aumenta-se, ainda que a contragosto, o ingresso de produtos ilegais e/ou subfaturados, com o que não só o Fisco sai perdendo, mas especialmente os empresários aqui residentes.
Revista Consultor Jurídico