São Paulo fere legislação ao cobrar ICMS de produtos da Zona Franca de Manaus

Autor: Thiago Abiatar Lopes Amaral (*)

 

Encontra-se pendente de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.832, ajuizada pelo governador do estado de São Paulo para questionar dispositivos da Lei 2.826/2003, do estado do Amazonas, e do Decreto regulamentador 23.994/2003. Os dispositivos questionados, voltados ao ICMS, criam o chamado “crédito estímulo” e o “corredor de importação”, como benefícios fiscais voltados ao estímulo e desenvolvimento da região.

Nessa ADI, o estado de São Paulo sustenta que os benefícios fiscais foram concedidos ao arrepio do disposto na Constituição Federal e na Lei Complementar 24/75 que, em linhas gerais, exigem que a concessão de benefícios fiscais do ICMS seja introduzida por meio de Convênio, editado no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz).

Aproveitando-se desse cenário de indefinição e insegurança jurídica, as autoridades fiscais paulistas vêm continuamente questionando operações originadas na Zona Franca de Manaus, promovendo a lavratura de Autos de Infração para, em resumo, exigir do contribuinte paulista a glosa do crédito de ICMS apropriado em razão de operações de entrada de mercadorias advindas da Zona Franca de Manaus alcançadas por benefício fiscal, na proporção do aproveitamento desse benefício pelo seu remetente.

Contudo, mais recentemente, os próprios contribuintes sediados na Zona Franca de Manaus tornaram-se alvo das autoridades fiscais paulistas, que passaram a questionar o montante do ICMS devido pelo contribuinte amazonense, a São Paulo, pela sistemática da Substituição Tributária (ICMS/ST). Tais autuações, são formalizadas sob o fundamento de recolhimento insuficiente do ICMS/ST, por erro na determinação do seu montante, já que na sistemática utilizada para seu cálculo, haveria a dedução do ICMS relativo às operações próprias em valores não condizentes com os efetivamente cobrados pelo estado do Amazonas, juntamente em razão do emprego dos aludidos benefícios fiscais.

Todavia, parece-nos que o argumento usado pelas autoridades fiscais paulistas, ao menos no que tange aos benefícios fiscais concedidos no âmbito da Zona Franca de Manaus, não reúne condições de prosperar quando considerados os próprios fundamentos invocados na referida ADI 4.382, em especial a Lei Complementar 24/75.

Objetivamente, os benefícios fiscais concedidos pelo estado do Amazonas não se submetem aos ditames da Lei Complementar 24/75, mais especificamente de seu artigo 8º – que usualmente fundamenta as autuações fiscais antes citadas – de forma que não se pode cogitar da glosa de créditos apropriados por destinatários paulistas, ou mesmo a exclusão de quaisquer valores de ICMS próprio para fins de cálculo do ICMS/ST devido ao Estado de São Paulo pelos remetentes estabelecidos no Amazonas.

A Lei Complementar 24/75, ao regulamentar a forma como benefícios fiscais serão concedidos pelos estados (i.e., por Convênios celebrados no âmbito do Confaz) excepcionou aqueles concedidos pelo estado do Amazonas a indústrias instaladas na Zona Franca de Manaus, nos exatos termos de seu artigo 15.

Sobre esse aspecto, cabe destaque ao fato que, a despeito da discussão sobre a recepção do artigo 15 da Lei Complementar 24/75 pela Constituição Federal vigente, tal dispositivo é plenamente aplicado pelo Supremo Tribunal Federal, tal como se observa da decisão proferida em Medida Cautelar na ADI 310, proposta pelo estado do Amazonas, em face dos Convênios ICMS 1, 2 e 6 de 1990, que tinham como objeto restringir os benefícios fiscais relacionados à Zona Franca de Manaus.

Se não bastasse a disposição expressa do artigo 15 da Lei Complementar nº 24/75, parece-nos evidente que o Estado de São Paulo não pode, unilateralmente, questionar qualquer benefício fiscal (incluindo o que abranja a Zona Franca de Manaus) com a lavratura de autuações fiscais, enquanto não houver a declaração de inconstitucionalidade por parte do STF da respectiva legislação que instituiu o benefício.

Cumpre lembrar que a já citada ADI 4.832, conta com pareceres da Advocacia Geral da União e do Ministério Público Federal desfavoráveis à pretensão paulista que, em síntese, reconheceram que a exigência de prévia celebração de Convênio como requisito para a concessão de benefícios fiscais relativos ao ICMS não se aplica às indústrias instaladas ou que venham a se instalar na Zona Franca de Manaus, por força do disposto no artigo 15 da Lei Complementar 24/75.

No âmbito do Tribunal de Impostos e Taxas da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo (TIT/SP), embora a questão não tenha sido ainda enfrentada por sua Câmara Superior, há precedentes favoráveis aos contribuintes com base nos fundamentos já aqui expostos.

De todo modo, a despeito da força, clareza e objetividade dos fundamentos aqui expostos, enquanto a questão não for definitivamente julgada pelo STF, as autoridades fiscais paulistas seguirão questionando os benefícios fiscais relacionadas à Zona Franca de Manaus, o que exigirá dos contribuintes a inevitável adoção das medidas necessárias à defesa de seus interesses.

Autor: Thiago Abiatar Lopes Amaral  é advogado Tributarista, especialista em tributos indiretos. Cursa LLM em Direito Tributário no Instituto de Ensino em Pesquisa (Insper). Especializou-se em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2010). É formado pelas Faculdades Metropolitanas Unidas (2006).


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