por Paulo Sergio Nied
Na esteira da polêmica do sistema de cotas implantado pela Universidade Federal do Paraná no vestibular de 2005, alguns estudantes estão buscando na Justiça o direito de se matricular nos cursos para os quais não obtiveram aprovação. O meio comumente utilizado é o Mandado de Segurança, que consiste em uma ação civil constitucional cuja tramitação é bastante célere, pois exige do Impetrante (o “autor” da ação) a imediata comprovação da liquidez e certeza dos fatos narrados na peça inicial. Com o pedido de concessão da segurança, o Impetrante busca garantir o acesso ao ensino superior no lugar de um “cotista” cujo desempenho no concurso tenha se mostrado inferior ao seu.
Pessoalmente defendo que todos os candidatos deveriam concorrer em grau de igualdade às vagas do ensino superior. Isso porque a Constituição Federal garante que o acesso aos níveis mais elevados de ensino deverá ocorrer “segundo a capacidade de cada um” (art. 208, inc. V), o que torna inconstitucional, por mais sublime que seja sua finalidade, qualquer norma que estabeleça critérios classificatórios que não encerram uma relação de pertinência lógica com o mérito (capacidade intelectual) do concorrente.
No caso da UFPR, além da ofensa ao dispositivo legal acima mencionado, não se pode negligenciar o fato de que a criação do sistema de cotas deu-se através de resoluções, isto é, normas administrativas que não possuem status de lei e, nesse sentido, não podem restringir os diretos dos “não-cotistas”, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade, também previsto em nossa Constituição (art. 5º, inc. II).
Cumpre também consignar que, muito embora tenha o objetivo de combater a pobreza e as desigualdades sociais, a verdade é que o sistema de cotas da UFPR mostra-se essencialmente discriminatório, pois parte do falso pressuposto de que os afro-descendentes não possuem capacidade intelectual suficiente para serem aprovados através das vias ordinárias do vestibular.
A partir do momento em que a UFPR elege o critério “cor da pele” para o reconhecimento dos afro-descendentes, além de correr o risco de reputá-los intelectualmente inferiores, está conferindo-lhes um tratamento diferenciado em relação aos candidatos das demais “raças”, o que não se justifica em face dos recentes estudos comprovadores que a representatividade dos negros nas escolas superiores federais já é idêntica à existente na sociedade brasileira.
Cabe aqui, portanto, a conclusão de que as cotas ferem, além de tudo, o princípio da isonomia, que assegura tratamento igual a todos, naquilo que sejam iguais (art 5º, caput, da CF) e agridem um dos objetivos fundamentais da República, que é o de promover o bem de todos, sem preconceito de origem, de raça, de cor, de sexo ou de idade (art. 3º, inc. IV, da CF).
Dessa forma, parece evidente que o sistema de cotas implementado pela UFPR é reflexo da posição que o Poder Público tomou na guerra contra as deficiências da educação no Brasil: em vez de tomar medidas efetivas para sanar o problema em sua origem, prefere buscar soluções paliativas que perpetuam as distorções sociais e fazem com que a sociedade seja, mais uma vez, a maior prejudicada.
Revista Consultor Jurídico