Por Claudio Wilberg
Muito se fala sobre a eficiência das grandes bancas no Brasil e no exterior, que conduzem a sua administração através de processos bem definidos em normas, políticas e sistemas. Boa parte desta eficiência, sem desmerecer o “pulso” do administrador ou a “cultura” do fundador, se deve à qualidade da informação disponível para advogados e para os gestores destes escritórios através do cruzamento de informações de diversas naturezas, sejam elas jurídicas, financeiras, mercadológicas ou administrativas, e estejam elas disponíveis em algum sistema ou não.
Mas pouca atenção é dada aos sistemas disponíveis para os pequenos e médios escritórios, aqui e lá fora, responsáveis pela maior fatia do mercado jurídico. Para este mercado, a distinção entre os mercados nacional e estrangeiro é significativa. Enquanto no exterior a preocupação são as horas cobráveis (billable hours) e o reembolso de despesas como principal fonte de faturamento de um escritório, aqui a preocupação maior é com a gestão de parcelas fixas já definidas na contratação de determinado serviço, já que uma parte significativa do faturamento vem de êxitos e sucumbências do contencioso ou de tarefas pré-determinadas.
Neste cenário, é fácil explicar um ambiente tradicional em escritórios nacionais onde o sistema de acompanhamento de processos é o primeiro sistema a ser discutido e normalmente o primeiro a ser implantado. Na maioria dos escritórios o processo de adoção de sistemas para por aí, deixando o processo de faturamento com emissão das faturas, o controle de despesas reembolsáveis e todas as outras funções abandonadas para serem trabalhadas em planilhas e documentos avulsos. Nestes escritórios, o desperdício de tempo através de múltipla digitação e desperdício de dinheiro por causa de informação não documentadas podem representar uma fatia grande da ineficiência. Uma simples letra errada na digitação da parte principal de um processo pode fazer com que este não apareça numa pesquisa e, por consequência, não seja cobrado do cliente naquele mês.
Diminuindo a distância
Nos últimos 10 anos o mercado nacional evoluiu muito e diminuiu a diferença em relação à qualidade dos sistemas existentes no exterior. Várias empresas entraram “de cabeça” neste mercado e investiram anos de desenvolvimento em sistemas completos para a gestão do escritório, se afastando da imagem de “sistema para acompanhamento de processos”, e estendendo as funcionalidades para atender todas as áreas do escritório de forma unificada, sejam elas jurídicas, gerenciais, operacionais ou financeiras. Para todas elas, a origem da informação e os códigos utilizados precisam ser os mesmos para haver uma uniformidade na comunicação.
Neste ramo de ferramentas completas, diria até que os produtos à disposição do mercado nacional são melhores do que seus equivalentes no exterior. Isto se deve ao tipo de serviço prestado por escritórios nacionais de pequeno e médio portes a clientes multinacionais, o que obriga os fornecedores nacionais a pensar em um ambiente multi-idioma e multi-moeda, características com as quais os fornecedores internacionais nunca se preocuparam.
Sistemas integrados versus integração de sistemas
Apesar de estarmos diminuindo a distância em relação aos sistemas no exterior, a maior diferença que observamos é o grau de especialização de cada produto/módulo encontrado lá fora. Depois de muitos e muitos anos de desenvolvimento, os fornecedores internacionais chegaram à conclusão que era mais importante ser cada vez mais específico e focado em um pedaço da solução final, tornando aquele módulo mais amigável e mais completo, de forma a fidelizar seu cliente e se proteger contra a profusão de produtos.
Uma simples busca por sistemas deste tipo num site como Google ou Yahoo traz mais de 100.000 registros, o que reforça esta proliferação de sistemas. Por exemplo, a combinação de practice management + software + law firms trouxe 115.000 registros e a combinação de litigation support + software + law firms trouxe 107.000 registros.
Naquele mercado, com este grau de especialização, observamos ao longo dos anos o estabelecimento de uma simbiose entre os vários fornecedores, criando ferramentas que permitem que seus respectivos sistemas “conversem”, permitindo que o escritório possa escolher livremente qual é a melhor solução para cada pedaço de sua prática, mas criando uma verdadeira colcha-de-retalhos ou um grande quebra-cabeça de vários sistemas. A dupla mais conhecida neste mercado é o Carpe Diem (para lançamento de horas: time-sheet) com o Elite, responsável pelo faturamento. Esta dupla está presente em muitos dos escritórios mais conhecidos do mundo, inclusive em alguns aqui no Brasil.
Com esta liberdade oferecida pelos fornecedores através de “acoplamentos”, os escritórios foram se equipando com o que há de mais moderno no mercado, sem dar espaço para a pressão de fornecedores ou ineficiência destes. Assim, ou o fornecedor traz a solução ou aquele pedaço do “quebra-cabeça” é simplesmente substituído por outro que converse com os sistemas à sua volta.
De volta ao nosso mercado nacional, os sistemas totalmente integrados trazem um grande benefício aos escritórios que estão confortáveis com eles, mas representam um dilema enorme para os administradores que possuem um sistema com o qual não estejam satisfeitos: continuar com o sistema antigo, com seus problemas, falta de atualização, descompasso com as últimas novidades até uma eventual falta de interesse do fornecedor; ou jogar anos de trabalho nas mãos de um novo fornecedor, muitas vezes tendo que alterar processos internos, passando todos os integrantes do escritório por treinamentos e se preparando para meses (e às vezes anos) até que tudo volte ao normal novamente.
E aqui, no momento em que estiver estudando uma eventual mudança, é muito importante entender mesmo o sistema que está analisando, conversando com atuais usuários, questionando a qualidade do suporte, e se informando sobre frequência de novas versões, para não cair na “conversa de vendedor” que oferece muito mais do que é capaz de entregar de fato.
Tendências dos próximos anos
A boa notícia para os próximos anos é que os responsáveis por alguns dos principais sistemas no Brasil já perceberam as vantagens de ter sistemas que se falem para tornar o mercado ainda melhor para todos os escritórios e departamentos jurídicos. Aos poucos, os fornecedores começarão a trocar arquivos em formatos pré-acordados com informações de Notas de Honorários, Notas de Despesas, Processos, etc., para evitar o retrabalho e acelerar a entrada de dados no sistema da outra parte.
Como consequência, os principais fornecedores apostarão nestes consórcios para padronizar a troca de informação em formatos padronizados (como acontece com o modelo Ledes adotado para envio de invoices nos EUA), facilitando o relacionamento entre empresas, tirando do mercado aqueles sistemas feitos por programadores sem experiência no mercado jurídico, que foram contratados para desenvolver o sistema para um pequeno escritório e acabaram repassando aquele sistema para vários outros, amarrando-os com soluções incompletas e ineficientes, e fortalecendo a posição dos fornecedores que se colocam como parceiros de escritórios e departamentos jurídicos na busca de uma atuação mais profissionalizada neste segmento.
Claudio Wilberg é consultor, sócio da LegalManager, professor da pós-graduação em Direito na Fundação Getúlio Vargas e de Gestão de Serviços Jurídicos no Centro de Extensão Universitária da Unisinos (Porto Alegre). É formado em Engenharia Eletrônica pela PUC-RJ e MBA pelo INSEAD, na França.