por Hugo Cesar Hoeschl
Um sistema verdadeiramente eficiente na área de Governo Eletrônico estará respaldado por boas ontologias. Mas o que é uma ontologia, e qual a sua utilidade?
Usualmente, a expressão “ontologia” alude a um conceito oriundo da filosofia, e pode ser definida, basicamente, das seguintes maneiras:
– Um ramo da metafisica que trata do ser, incluindo teorias da natureza e tipos de seres. (noção clássica);
– “Rama de la Filosofía que se ocupa de la naturaleza y organización de la realidad” (Guillén e outros);
As recentes formulações sobre “ontologia”, originadas nos inovadores ambientes da Gestão e Construção do Conhecimento apontam para um novo significado da expressão, colocando-a usualmente no plural – “ontologias” -, com as seguintes definições (entre outras):
– “Uma ontologia é a formal e explícita especificação de uma conceitualização compartilhada” (Gruber);
– “La gestión del conocimiento está desarrollando ontologías como modelos de conceptos específicos. Pueden representar relaciones complejas entre los objetos, e incluyen las reglas y los axiomas que faltan en los tesauros” (Guillén e outros);
Este segundo grupo de formulações possui um caráter mais concreto e pragmático, ligado diretamente ao desenvolvimento de sistemas e/ou modelos de organização do conhecimento, visando, principalmente, sua armazenagem e recuperação (resgate).
Inovações geram novas formas de valorar a realidade, e, por conseqüência, novas forma de construir a ciência. Tal constatação motivou a Universidade Federal de Santa Catarina a criar um curso inovador de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento (mestrado e doutorado)(1), cuja episteme – notoriamente multidisciplinar – tem como objetivo os novos enfoques sobre o conhecimento, e, por via de consequência, também os novos enfoques sobre a ontologia.
Uma das principais características das boas ontologias é que geram sistemas mais potentes e precisos, principalmente quando a tarefa estiver diretamente ligada à Construção e Gestão do Conhecimento. Uma boa estruturação ontológica significa um sistema mais eficiente.
Quando pesquisamos a expressão “ontologia” no motor de busca Google, o resultado retorna um quantitativo de 45.000 registros. Por sua vez, a palavra “ontologias” retorna 5.070 registros como resultado. Mas, ao largo da noção aristotélica de ontologia, surge uma importante questão: Qual o ponto de contato entre os conceitos de “ontologia” e “ontologias”?
Um bom exemplo pode ser obtido através da realização de outra pesquisa na mesma ferramenta de busca. Quando procuramos, no Google, por arquivos que façam referência a hotéis em Florianópolis, utilizando como critério de busca a expressão “hotel em Florianópolis”, os resultados são os seguintes:
1- Hotel Parador da Cachoeira…
2- Hotel Parador da Cachoeira (2)…
3- Hotéis e Pousadas em Florianópolis…
4- Apart-hotéis em Florianópolis…
5- Hotéis no Rio, São Paulo e outros destinos…
Vejamos, agora, uma nova busca, realizada com uma pequena variação semântica, utilizando como critério as palavras “hotel” e “Florianópolis”, sem operadores lógicos:
1- Maria do Mar Hotel…
2- Íbis Florianópolis…
3- Parthenon Florianópolis…
4-Bw Baia Norte Palace Hotel…
5- Florianopolis Hotel Florianópolis…
As paginas html (paginas web) possuem campos específicos (tag’s) onde podem ser feitas “declarações de conhecimento”, com o objetivo de potencializar o funcionamento dos motores de busca. Esta declaração de conhecimento, embora singela e superficial, representa uma essência sobre o conteúdo das páginas, e responde diretamente pela classificação semântica que os arquivos automáticos digitais irão realizar.
Quando as palavras digitadas são “hotel em Florianópolis”, a ferramenta de busca encontrou esta expressão, exata, declarada na página web do resultado que retornou nos dois primeiros lugares (3).
Porém, quando as palavras digitadas são “hotel” e “Florianópolis”, a página que estava em primeiro lugar na primeira busca sequer aparece entre as 5 primeiras. A única alteração na busca foi a supressão da partícula “em”, sem qualquer outra alteração no dispositivo de busca. Qual o motivo da diferença no resultado da busca?
No momento em que se representa o conhecimento somente calcado na expressão “hotel em Florianópolis”, ele ficou adstrito a uma “string”, ou a uma semântica literal. Um encapsulamento mais avançado centraria esforços na essencialização dos conceitos, buscando retratar uma adequada representação do conhecimento que contivesse uma “ideia” e um “conceito”, com implicações geográficas e valorativas, e que associasse a “atividade” ao “local”, através de um conjunto estruturado e organizado de palavras que representassem esta realidade.
Ou seja, um adequado trabalho de construção de ontologias fixaria a idéia e o conceito de uma “atividade” (hotel), localizada em um determinado “local” (Florianópolis), e garantiria uma boa posição também em outras situações, com outros critérios de busca, diferentes na semântica, mas semelhantes na idéia, materializando uma ontologia orientada teleologicamente. Vale dizer, os conceitos de “ontologia” e “ontologias” se encontram quando a representação formal corresponde à essência do objeto enfocado.
Uma última e importante ressalva. Para aqueles que tendem a subestimar o papel das ontologias, caracterizando-as como um “mero conjunto organizado de palavras”, é importante lembrar que uma linguagem de programação (Java, C++, Perl, etc) está baseada na mesma filosofia, e um programa de computador é também um “conjunto organizado de palavras e caracteres”, podendo conter outras informações e operações matemáticas.
Notas
(1) Já recomendado pela Capes. Maiores informações: www.egc.ufsc.br, www.stela.ufsc.br/egc
(2) Está correto, o mesmo endereço aparece em primeiro e segundo lugares;
(3) Busca realizada no dia 10/05/04, as 19:34 h.
Hugo Cesar Hoeschl é pós-doutor em Governo Eletrônico, doutor em Inteligência Aplicada e mestre em Direito pela UFSC. Especialista em Informática Jurídica pela Univali. Procurador da Fazenda Nacional e ex-promotor de Justiça. Professor da Pós-Graduacao da UFSC e da Unisul. Desenvolvedor da Universal Networking Language (Genebra). Publicou 11 livros no Brasil.