por Ernani Teixeira Ribeiro Jr
A livre concorrência, como toda liberdade, não é irrestrita. Seu exercício encontra limites nos preceitos legais e, ultrapassados esses limites, surge a concorrência desleal. Atualmente, a pressão que as empresas sofrem para obter as informações necessárias ao bom desempenho de suas atividades está cada vez maior, e muitas delas utilizam consultores especializados em avaliar a tendência de atuação de determinados mercados em relação ao seu consumidor específico.
Entretanto, alguns desses prestadores de serviços, em certas ocasiões, acabam por utilizar-se de meios que não os legalmente previstos. Embora esta prática esteja se tornando habitual nos mercados mais competitivos, deve-se observar que, em certos casos, poderão caracterizar a prática de concorrência desleal, coibida pela legislação brasileira.
No Brasil, a tipificação da concorrência desleal como ilícito penal ocorreu em 1934, com a promulgação do Decreto 24.507, influenciado pela Convenção de Paris para a proteção da propriedade industrial. A nossa atual Constituição Federal determina, em seu artigo 173, parágrafo 4º, que a “lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação de mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário de lucros”, dando respaldo à atuação preventiva e repressiva do Estado contra estas práticas.
No âmbito o administrativo, o Cade — Conselho Administrativo de Defesa Econômica também não ficou atrás, haja vista a Lei de Repressão e Prevenção às Infrações Contra a Ordem Econômica.
Além da punição criminal, a legislação antitruste brasileira também definiu o que se entende por infração à ordem econômica e sua punibilidade. Segundo a citada legislação, “constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto produzir os seguintes efeitos, ainda que não alcançados: I – limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa.”
A importância da coibição de conduta anti-concorrencial no âmbito administrativo está, entre outros fatores, na aplicação de uma multa destinada à empresa na ordem de 30% do valor do seu faturamento bruto do último exercício, estendendo-se ao administrador direta ou indiretamente responsável pela infração cometida por empresa na ordem de 10% a 50% do valor acima.
Também a jurisprudência sobre a matéria tem buscado o enquadramento da prática da concorrência desleal dentro do conceito da eliminação ou limitação da concorrência mediante utilização de meios considerados fraudulentos, os quais atingem não apenas interesses individuais, mas também a sociedade como um todo, que é prejudicada pela diminuição da concorrência.
Vale observar que a comprovação desse ilícito, na maioria das vezes, é de difícil constatação. Analisemos o seguinte exemplo: até que ponto um diretor recém contratado pela sua principal concorrente pode utilizar informações obtidas durante o seu último emprego na nova companhia? A resposta parece fácil: poderá utilizar-se de informações que não revelem nada a respeito dos aspectos específicos do negócio da concorrente.
A questão de maior complexidade parece ser não a definição do que pode ou não ser feito, mas sim como demonstrar que determinada conduta ultrapassou a linha daquilo que é ético e lícito, tornando-se um mecanismo fraudulento de eliminação ou limitação da concorrência.
De acordo com a atual legislação de propriedade industrial brasileira, “comete crime de concorrência desleal quem divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos, informações ou dados confidenciais, utilizáveis na indústria, comércio ou prestação de serviços, excluídos aqueles que sejam de conhecimento público ou que sejam evidentes para um técnico no assunto, a que teve acesso mediante relação contratual ou empregatícia, mesmo após o término do contrato.”
Como se vê, a legislação brasileira possui um arcabouço de normas e preceitos suficientes para enquadrar a utilização ilegal da informação — bem mais valioso de nosso tempo — como ilícito penal e administrativo.
A conclusão a que chegamos, portanto, é que a legislação brasileira já coíbe a prática da concorrência desleal, inclusive no âmbito da inteligência competitiva, restando ao operador do direito, entretanto, a árdua tarefa de angariar elementos suficientes que possam comprovar a utilização de meios ilícitos para a obtenção da informação.
Em suma, no ambiente de negócios em que vivemos, extremamente competitivo, todo cuidado é pouco quando falamos em informações obtidas do concorrente, sempre buscando identificar as fontes e a forma pela qual são obtidas, pois, além dos princípios éticos que devem nortear todas as empresas, seus administradores e empregados, sendo inclusive recomendável a adoção de um código de conduta e ética, há hoje uma legislação severa que coíbe drasticamente a utilização ilegal dessas informações.
Revista Consultor Jurídico