LUIZ FLÁVIO GOMES
Dentre as várias inovações apresentadas pela Comissão de Reforma de Código Penal está a criminalização (agora expressa) do “Stalking”. De acordo com a proposta o novo tipo penal constituiria um parágrafo do artigo 147, do CP. Pode ser que na redação esse artigo receba outro número.
Vejamos como ficaria a previsão legal:
Ameaça
Art. 147 – Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave:
Pena de prisão de seis meses a dois anos.
Perseguição Obsessiva ou Insidiosa
§1º. Perseguir alguém, de forma reiterada ou continuada, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade.
Pena – Prisão, de dois a seis anos, e multa.
O novo tipo incriminador, se aprovado na íntegra pelas duas casas legislativas e devidamente promulgado, terá como nomen iuris Perseguição obsessiva ou insidiosa,que nada mais é do que o “stalking”.
Mantida a redação acima, o sujeito passivo será qualquer pessoa, homem ou mulher. Note que estarão protegidas a integridade física e psicológica da vítima. O tipo também é bastante amplo, pois prevê punição para aquele que “de qualquer forma” atuar para invadir ou perturbar a liberdade ou privacidade do ofendido.
Até então a prática de stalking era entendida como uma contravenção penal, prevista no artigo 65 do decreto-lei 3688/41 (perturbação à tranquilidade), ressaltando-se a possibilidade de aplicação das medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha, caso a perseguição estivesse relacionada ao gênero feminino.
O novo crime (Art. 147, § 1º CP) será processado mediante representação do ofendido, tratando-se de ação penal pública condicionada à representação. Tal previsão é salutar, haja vista caber ao destinatário da violência a ponderação sobre os custos pessoais a serem enfrentados pelo processamento da demanda, uma vez que, em regra, o agente provocador é pessoa de convívio próximo da vítima.
A palavra stalking deriva da tradução do verbo tostalk, que pode ser entendido como ficar à espreita, vigiar, espiar. Trata-se de uma situação bastante comum após o desfecho de um relacionamento amoroso, no qual uma das partes não se conforma com a decisão tomada pela outra pessoa.
Em regra, a vítima da referida síndrome é a mulher. O homem, geralmente, não aceita a separação da ex-companheira, pois no auge da patologia do apego, enxerga a mulher como sua propriedade na equivocada coisificação do sentimento. Entretanto, nada impede que a mulher pratique tais condutas em face de um homem.
As condutas perpetradas pelo agente acometido pela síndrome de stalking perfazem um contexto de perseguição, como por exemplo: inúmeras chamadas no celular, espera na saída do trabalho, envio de presentes indesejados, como flores no trabalho da mulher, encontros provocados para constranger a vítima, envio de mensagens no celular e outras tantas formas inconvenientes de impor a presença refutada e agredir psicologicamente a vítima.
O stalking pode ocorrer por intermédio da internet, caracterizando-se o que se chama de cyberstalking. Na forma virtual acontececom o envio de mensagens eletrônicas, recados, convites insistentes ou ofensas e perseguição nas redes sociais, na busca incessante de manter-se próximo à vítima.
LUIZ FLÁVIO GOMES
Jurista e cientista criminal. Doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri e Mestre em Direito Penal pela USP. Presidente da Rede LFG. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Blog: www.blogdolfg.com.br. Twitter: www.twitter.com/ProfessorLFG.