Tesouro abandonado

Conta uma lenda na região sudoeste do Estado que, na iminência de ataque das tropas paraguaias, no período da guerra, as famílias colocavam seus bens preciosos em um pote de barro e “enterravam” o seu tesouro. Alguns dizem que pessoas ficaram ricas “desenterrando” potes cheios de moedas de ouro e jóias, outros dizem que ainda existem muitos “enterros” à espera do “escolhido” para felizardo.

A lenda persiste entre os mais antigos, mas acredito não passar de crendice do nosso povo, que sonha em encontrar tesouros enterrados, quando o verdadeiro tesouro está aos nossos olhos.

Semana passada, a Secretaria de Cultura anunciou que fará a revitalização de vários prédios históricos de nosso Estado, recebendo incentivo do Banco do Brasil na ordem de 6 milhões de reais. Entre os projetos a serem revitalizados encontra-se a velha usina Santo Antonio (1929), localizada na minha querida Miranda.

A revitalização da usina é bem-vinda e já estava passando da hora, haja vista que há três anos a população ouve notícias de que tal fato ocorreria, eis que a ex-secretária de cultura de Miranda, Maura Freire Siufi, lutou para encampar a área da velha Usina, doado em 2002 pelo grupo Atalla. A revitalização – ou reconstrução, dado ao estado que se encontra o prédio – está orçada em 1 milhão e 700 mil reais, onde após concluída será instalado o “museu da guerra do Paraguai”. O único fato a deixar-nos tristes é saber que, após a doação, não houve sequer interdição do local, encontrando-se o maquinário antigo sucateado, em estado de abandono e depredação.

A competente Maura Freire Siufi, quando secretária, não se limitou a preservar somente a Usina, e conjuntamente com a prefeita Beth Almeida, restaurou o prédio da antiga prefeitura (1912), lá instalando um museu. O prédio do antigo paço manteve suas características, valendo a pena ser visitado. A dupla de administradoras continuou a labuta e empreendeu a revitalização da antiga estação ferroviária, onde hoje funciona a secretaria de cultura, o museu dos ferroviários e a casa do artesão, conservando sua originalidade arquitetônica. Ressalte-se que foi a primeira estação revitalizada neste século no MS.

A revitalização destes prédios não deve ser encarada como a última etapa para preservar o patrimônio histórico de Miranda, pois o grande desafio encontra-se nos casarões centenários da cidade, esquecidos pela municipalidade, em cujas construções encontram-se azulejos e pisos importados da Europa. Nosso tesouro em construções antigas em Miranda, Aquidauana, Anastácio e Nioaque continuam em estado de abandono, sendo demolidos e depredados a cada dia, matando a nossa memória e a nossa história, sendo tratado em “segundo plano” pelas autoridades.

Quem conhece a região deve sentir saudade dos casarões ao lado da “Casa Cândia” (1907) em Anastácio, que foram demolidos, ou sentem um vazio no coração ao ver antigos prédios vizinhos em ruínas. O vazio fica maior se analisarmos que poucos prédios foram tombados no Estado (não passando de meia centena), se compararmos com os 600 prédios tombados em Cuiabá, levando-nos a acreditar que falta, nessas cidades históricas, a boa vontade do executivo na criação do Conselho de Defesa do Patrimônio.

Ao que sabemos, não se tem notícias de nenhum plano de tombamento ou preservação do patrimônio histórico no Estado; ao contrário, nossas autoridades culturais, ao falar sobre o tema, sempre se voltam para Corumbá, esquecendo-se das outras cidades bicentenárias, como Miranda e Nioaque.

A preservação e revitalização de prédios antigos são vistas, por muitos, como uma “perda de tempo” e sem nenhuma utilidade prática, mas se analisarmos os fatos de forma abrangente, veremos que esta idéia está totalmente equivocada. Em futuro próximo, o turismo será uma das maiores fontes de renda do mundo e a preservação dos casarões despertará interesse na visita a cidades históricas do Estado, revitalizando o comércio, fomentando empregos, tornando-se um atrativo a mais para quem vai ao Pantanal.

Necessitamos urgentemente de uma política de preservação do patrimônio histórico, especialmente em Miranda, onde vários imóveis antigos encontram-se abandonados, em ruínas. Entre eles, cito o prédio que abrigou o batalhão militar na rua General Câmara, construído em 1904.

Preservar a nossa memória e os casarões é apostar no futuro e perceber que o maior tesouro deixado pelos antepassados está a nossa frente, dependendo da nossa capacidade para explorá-lo.

Sergio Maidana
Advogado

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