Luiza Nagib Eluf*
Desde que a mulher alcançou a emancipação muita coisa vem mudando no relacionamento entre os sexos. A radical transformação do papel feminino não poderia continuar convivendo com padrões tradicionais de comportamento por parte do homem. A sociedade foi forçada a adotar novas regras convivência e a ir, pouco a pouco, assumindo novos valores.
O homem foi obrigado a voltar-se para as questões domésticas referentes à administração da casa e ao cuidado com os filhos. Muitas tarefas como cozinhar, lavar e passar tiveram de ser divididas pelo casal, já que a mulher não tinha mais tempo nem saúde para fazer tudo sozinha.
Embora tenham surgido algumas resistências de “machões” que achavam humilhante fazer “serviço de mulher”, as circunstâncias existentes não deixavam muita escolha. O homem mudou sua postura e encontrou pontos positivos nessa transformação.
Muitos perceberam, finalmente, os encantos da paternidade. A convivência com os filhos e a participação nas atividades escolares, domésticas, esportivas e recreativas das crianças instituiu uma nova família – aquela na qual o pai realmente mostra sua presença e sua afetividade. As disputas judiciais pela guarda dos filhos, que antigamente quase não existiam, pois o pai separado entregava os filhos à mãe de bom grado, passaram a ser freqüentes. Há muitos descasados que estão cuidando das crianças porque fizeram questão disso.
Ao mesmo tempo, a imagem de racionalidade e infalibilidade que a população masculina passava a vida toda tentando construir, ocultando desesperadamente seus insucessos, foi substituída pelo “homem ser humano”. Aquele que chora, sente medo, sofre de inseguranças, tem sentimentos, tem problemas, não consegue sustentar a família sozinho, aceita conversar sobre sua intimidade e, às vezes, precisa pedir ajuda. Até discute o relacionamento com a companheira.
Conservadores argumentam que se abriu uma crise entre homens e mulheres, mas, na verdade, a crise sempre existiu. Como estava oculta pela opressão imposta à mulher e por rígidos padrões patriarcais de comportamento que sacrificavam homens, mulheres e crianças, o assunto não era trazido a debate público. O que aconteceu agora é que a chamada “guerra dos sexos” entrou na pauta, o que é positivo.
Casamentos foram desfeitos, mas não por culpa das alterações no relacionamento de gênero e sim por ser normal que algumas experiências na área afetiva e sexual não dêem certo. A desconstituição de uma união fracassada significa que uma nova união, em bases mais gratificantes, pode surgir. Não é correto considerar a separação conjugal uma tragédia, ela é apenas o remédio para uma situação ruim.
O novo homem começa a aprender – com a mulher – a lidar com seus sentimentos. Primeiro, ele descobre que os tem. Depois, percebe que viveu alienado durante muito tempo e precisa enxergar o que se passa em seu interior. A tendência masculina, decorrente de imposição cultural, sempre foi a de negar qualquer fraqueza e tentar corresponder à expectativa do meio social, fato que o impedia de buscar o autoconhecimeto. Muitos homens nunca conseguiram descobrir o que era realmente importante para eles.
O cartunista Miguel Paiva, 51 anos, acaba de lançar um livro exatamente sobre este tema, intitulado Sentimento masculino – manual de sobrevivência na selva. Ele diz que “o homem estrutura sua vida afetiva em valores que são baseados na força, no poder, na superioridade, em uma série de coisas externas. Não sabe lidar com a parte interna. A referência masculina é toda externa.”
Como se vê, por influência da evolução feminina, ocorreu também uma evolução masculina. O caminho da reflexão é muito importante para que o mundo descubra os benefícios do diálogo e da pacificação nos relacionamentos.
Assim como sempre foi sacrificado ser mulher, em face da opressão, é também difícil ser homem em virtude das exigências muitas vezes inalcançáveis que a sociedade lhe faz.
É claro que o homem ainda não mudou o suficiente para poder relaxar e aproveitar. Ainda é chamado de palavras ofensivas quando alguma coisa não dá certo em sua vida. Mas é importante que tenha surgido uma nova consciência masculina que venha a se contrapor ao que existia antes, em termos de opressão, no mundo dos homens.
Luiza Nagib Eluf é procuradora de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo