Tribunal de Recursos Fiscal do DF é exemplo no trato com contribuinte

Autores: Eduardo Lourenço e Pedro Henrique Ribas (*)

 

Toda a disposição injusta, toda a instituição má, e como tal reconhecida pelo povo, implica um ataque ao sentimento jurídico da nação e por consequência à força nacional. É uma ofensa contra a ideia do direito que recai sobre o próprio Estado, o qual a maior parte das vezes deve pagá-la caro e com usura.” (Rudolf Von Ihering)

No último dia 8 foi publicada, no diário oficial do Distrito Federal, a Resolução 1, de 1º de fevereiro de 2017, do Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais, que dispõe “sobre os dias, horário e duração das sessões ordinárias de julgamento do Tarf, e outros procedimentos”.

Em linhas gerais, estabelece a norma parâmetros para limitar a duração e a quantidade de processos previstos para julgamento em cada sessão, determinando, assim, que i) as sessões do Pleno tenham duração de até quatro horas e as das câmaras de até três horas, sendo os últimos 30 minutos destinados à leitura de ementas de acórdãos e distribuição de processos, se houver; ii) as sessões tenham duração de uma hora e 30 minutos, quando houver, no mesmo dia, julgamentos pautados para as duas Câmaras, sendo os últimos 30 minutos também destinados à leitura de ementas de acórdão e distribuição de processos, se houver; iii) sejam pautados no máximo sete processos no julgamento pelo Tribunal Pleno e até cinco pela câmara; e, por fim, iv) restando, ao final de cada sessão, processos pendentes de julgamento, que estes sejam adiados pelo Presidente e pautados na primeira oportunidade.

De antemão, deve ser ressaltado que melhor momento não existiria para o advento da norma. Isso porque, em tempos de crise econômica, os fantasmas do desemprego e da inflação acabam se revelando tormentas ainda maiores se os aliarmos à exorbitante carga tributária existente, que, em penosa regressividade, acaba por tolher a capacidade de consumo e acumulação de renda daqueles que menos deveriam contribuir para o Estado. Sendo assim, iniciativas garantidoras dos direitos fundamentais dos contribuintes merecem especiais elogios, sobretudo quando visam à promoção da razoável duração de processo construído em contraditório e decidido isonomicamente.

Como é possível perceber, a resolução em mote tem como premissa regular, de forma razoável e muito bem-vinda, a duração dos julgamentos do Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais do Distrito Federal e, aqui mais importante ao nosso ver, limitar o número de processos na pauta. A justificativa, que é depreendida do caput do artigo 1º, fixa-se na promoção da “celeridade, otimização e produtividade nos julgados”. Contudo, não pensamos serem somente estes os possíveis ganhos advindos da norma.

Sabidamente, os tribunais — administrativos e judiciais — vêm, em sua maioria, sistematicamente pautando uma enorme quantidade de processos em matéria tributária, cujas apreciações acabam sendo feitas em longas sessões, que, não raras as vezes, chegam a durar mais de quatro horas a fio (diga-se de passagem, em “horário comercial”). Antes de prosseguirmos com o entendimento que se pretende expor, faz-se necessário destacar que o foco da presente coluna não está diretamente voltado para os julgamentos realizados em tribunais judiciais, uma vez que a busca pela verdade material, com ampla análise fática casuisticamente construída, inerente aos procedimentos administrativos, é que acaba por ser decisiva no incremento da complexidade da atividade julgadora no âmbito administrativo.

Retornando às novas regras impostas às pautas de julgamento do Tarf-DF, trazidas pela Resolução 01/2017, tem-se que a otimização da relação “quantidade de processos em pauta x tempo de julgamento por processo”, além de se mostrar salutar medida de proteção dos direitos do contribuinte, também acabam por corroborar indiretamente com a racionalização do labor desempenhado pela autoridade fiscal, quando da formalização do Auto de Infração. Explica-se.

O primeiro ponto, qual seja, a busca pela maior efetivação dos direitos — ressalta-se: fundamentais — dos contribuintes é vislumbrada justamente na limitação quantitativa de processos apreciados em uma única sessão. Tal medida viabiliza não só a possibilidade de um conhecimento pleno pelo julgador dos fatos trazidos aos autos pelas partes, mas, principalmente, auxilia na melhor concreção da norma tributária. Isso é importante tendo em vista que, muitas vezes, estas normas são dispostas em enunciados obscuros e/ou contraditórios e que necessitam da reflexão do julgador para sua adequada aplicação ao caso concreto.

Inclusive, pode-se ainda pensar numa consequência reflexa de aprimoramento da própria jurisprudência do tribunal, a qual servirá como verdadeira condutora das ações dos contribuintes, que, por sua vez, se pautarão em julgados cujas razões serão argumentativamente compreensíveis e confiáveis, pilares estes da segurança jurídica.

Note que não estamos sugerindo um número ideal de processos que necessariamente deverão ser objeto de apreciação em cada pauta ou que haja a limitação demasiada do tempo de duração das sessões. O que defendemos é a aplicação da razoabilidade na definição destes parâmetros, medida esta que nitidamente vai ao encontro da iniciativa tomada pelo Tarf-DF. A busca pela racionalização do tempo que cada processo demandará para ser julgado emerge como louvável e urgente medida a ser observada em todo o país, especialmente quando respeitados os atos inerentes à concretização da ampla defesa das partes.

Por fim, já passando para o segundo ponto suscitado anteriormente, qual seja, na consequência que a Resolução 1/2017 do Tarf-DF pode ter em relação ao trabalho desempenhado pela autoridade fiscal no momento da lavratura de Autos de Infração, concebe-se um benefício de extrema relevância para o contribuinte, se levado à cabo pela Administração fazendária. Como de comum ciência, incontáveis são as oportunidades em que contribuintes são intimados para a defesa de um único Auto de Infração, no qual há lançamentos diversos sem qualquer relação de pertinência fática de uma suposta infração com a outra. A bem da verdade, esse procedimento praticamente inviabiliza a discussão judicial (por decorrência da necessidade de garantia integral dos débitos), dificulta a emissão de documentos de regularidade fiscal e, por conseguinte, afrontando a ampla defesa e o contraditório da parte resistente.

Especificamente em relação a esse último ponto, questiona-se: como pode o contribuinte se defender com afinco de lançamentos diversos, se considerarmos que seu patrono somente dispõe de poucos minutos para sustentação oral nas sessões de julgamentos? E a Fazenda? Como esta será capaz de defender o erário com primor se tem sua atuação também limitada? Finalmente, e os julgadores? Conseguirão firmar entendimento sobre uma matéria quando esta vem locupletada por diversas outras? Acreditamos haver uma única resposta para estas indagações: não.

Portanto, dignas de elogios são as inciativas como a do Tarf-DF, preocupada com a proteção dos direitos dos cidadãos e com a celeridade, otimização e produtividade de seus julgados. O recado foi dado com louvor. Convenhamos que o melhor relatório de produtividade é aquele que resulta da exata aplicação dos ditames constitucionais e legais, em desfavor daquele que mascara eventual tentativa infundada de impor o pagamento de valores indevidos. A justiça agradece.

 

 

 

 

 

Autores: Eduardo Lourenço é advogado, sócio do Maneira Advogados. Mestrando em Direito Constitucional pelo UniCEUB e Master of Laws (LLM) em Direito Tributário pelo IBMEC. Membro da Comissão de Assuntos e Reforma Tributária da OAB/DF.

Pedro Henrique Ribas  é advogado, sócio do Maneira Advogados. Mestrando em Direito Tributário pela USP e especialista em Direito Tributário pela PUC/MG. Membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/MG.


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