Videoconferência é segura, agiliza processos administrativos e gera economia

Autor: Manoel Messias de Sousa (*)

 

Uma questão ainda não totalmente resolvida hoje em sede de Processo Administrativo Disciplinar e de Sindicância é saber se a Administração Pública pode ou não realizar o interrogatório do acusado ou a inquirição das testemunhas por videoconferência.

Isso porque inexiste previsão expressa da realização desses atos processuais por meio de videoconferência nas leis 8.112/90 (Regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das Autarquias e das Fundações Públicas Federais) e 9.784/99 (Lei Geral do Processo Administrativo no âmbito da Administração Federal direta e indireta).

Diante desse vácuo na legislação que rege a matéria, parece oportuna a pergunta: as comissões processantes de PAD e de Sindicância podem adotar o sistema de videoconferência nas audiências destinadas ao interrogatório do servidor acusado ou aqueles voltadas à inquirição de testemunhas? Se positivo, poder-se-ia alegar violação ao princípio da legalidade previsto no artigo 37, caput, da Carta Maior?

A nosso ver, a resposta é negativa.

A Administração Pública pode e deve instituir, no âmbito das comissões disciplinares, o modelo de videoconferência na instrução de processos administrativos disciplinares sem que isso constitua uma afronta ao postulado da legalidade.

A doutrina moderna do direito público ensina que nenhum princípio deve ser interpretado de forma puramente clássica e tradicional, sem se atentar para a evolução dos fatos sociais.

Dentro dessa quadra, parece inaceitável imaginar que, em pleno século XXI, a Administração Pública possa deixar de utilizar os avanços tecnológicos de forma positiva e proficiente na prestação de seus serviços em favor do contribuinte e da sociedade.

Em realidade, o que o contribuinte e a sociedade desejam e esperam da Administração Pública é que esta preste seus serviços com eficiência, rapidez, segurança e economia.

Ora, da mesma forma que não há previsão nas leis 8.112/90 e 9.784/99 do uso do sistema de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, em sede de PAD e Sindicância, também inexiste norma proibindo o emprego dessa tecnologia.

Dessa forma, sustentamos que as comissões disciplinares podem e devem promover a inquirição das testemunhas e o interrogatório do agente público, no PAD e na Sindicância, por meio de videoconferência.

Várias são as razões que conduzem a esse entendimento.

Em primeiro lugar, todo servidor público acusado em PAD ou Sindicância Punitiva tem direito à duração razoável do processo administrativo, na forma prevista no artigo 5º, LXXVIII, da Constituição (“a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”).

Também os artigo 37, caput, c/c os artigos 70 a 75 e 169, da Carta Maior, preconizam que a Administração Pública deve obediência aos princípios da eficiência e da economicidade na prestação de seus serviços públicos.

O sistema de videoconferência já é utilizado hoje nos processos judiciais, na forma do que dispõem o Código de Processo Penal (artigos 185, parágrafo 2º, e 222, parágrafo 3º) e o Novo Código de Processo Civil (artigo 453, parágrafo 1º).

Está prevista nesses dispositivos legais a possibilidade da realização do interrogatório do réu ou a inquirição das testemunhas por videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, quando aqueles residirem em comarca diversa daquela onde tramita o processo judicial.

Igualmente, a Controladoria Geral da União já adotou esse procedimento da videoconferência em PAD e Sindicância.

O Manual da CGU sobre PAD, por exemplo, ensina que a realização de atos processuais por meio de recursos de teletransmissão de sons e imagens, ao vivo e em tempo real, pode ser considerado um instrumento de cidadania a ser utilizado não apenas em defesa dos interesses da Administração e de toda a sociedade, mas em favor dos direitos dos próprios investigados. E cita suas vantagens, a saber:

“Vantagens:

Contato praticamente direto entre a autoridade e o réu

Na Exposição de Motivos ao PL 736, de 2007, o Senador Romeu Tuma consignou que o sistema de videoconferência permite contato direto com o réu, proporcionando efetiva participação e o contraditório.

Duração razoável do processo:

O Conselheiro do CNJ Walter Nunes da Silva Júnior no PAD 200910000032369 concluiu que: “a videoconferência é um mecanismo indispensável para a duração razoável do processo quando há atos processuais a distância para serem praticados.

Interrogatório por videoconferência:

Enunciado CGU nº 07. Videoconferência. Possibilidade. Interrogatório. PAD e Sindicância. No âmbito do Processo Administrativo Disciplinar e da Sindicância é possível a utilização de videoconferência para fins de interrogatório do acusado”.

Mais: o Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional do Ministério Público também já adotaram o sistema de gravação de audiências por videoconferências por meio das Resoluções 105, de 06/04/2010 e 128, de 22/09/2015, respectivamente.

E, em breve, o Ministério Público da União e os Ministérios Públicos dos estados também passarão a adotar esse modelo de inquirição de testemunhas e colheita do interrogatório nos processos administrativos disciplinares, por videoconferência.

Aliás, o MPU, de forma inteligente, já começou a trilhar esse caminho, ao decidir-se “g) favoravelmente à implementação de instrução de processos administrativos disciplinares, por meio de videoconferência, à semelhança do previsto na Resolução 128/2015 do CNMP”, durante a 87ª Reunião do Conselho de Assessoramento Superior do Ministério Público da União, realizada no dia 26/02/2016, no edifício-sede da PGR, em Brasília/DF, sob a presidência do Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot Monteiro de Barros.

A prática de atos processuais em PAD e Sindicância por meio do sistema de videoconferência não viola as garantias constitucionais do acusado nesses procedimentos. Pelo contrário, as robustece.

Aqui, cabe destacar as sábias palavras do juiz de Direito do TJ-DF e professor Wagner Junqueira Prado, que assim se manifestou em estudo específico sobre o uso da videoconferência no processo penal:

“[…] Identificados esses elementos, é possível notar que a realização do interrogatório ou de qualquer outro ato processual por meio de videoconferência não faz desaparecer nenhum dos elementos constitutivos do princípio do contraditório. […] Por isso, penso que a Lei 11.900/2009, ao modificar o Código de Processo Penal para prever a possibilidade de realização do interrogatório e de outros atos processuais por meio de videoconferência, observou os princípios processuais, especialmente o princípio da ampla defesa, pois continuam garantidas tanto a defesa técnica quanto a autodefesa”. [1]

Trazendo essa doutrina do Wagner Junqueira Prado para o PAD e Sindicância, tem-se que o acusado, no PAD e na Sindicância, não terá, jamais, o seu direito de defesa cerceado pela Administração Pública, caso determinados atos processuais se deem por meio de videoconferência.

Há diversas vantagens no uso desse recurso tecnológico.

De pronto, constata-se que ele propicia economia de tempo e de dinheiro. É impressionante como se ganha tempo e agilidade quando a comissão processante realiza a inquirição de testemunhas e o interrogatório do acusado, no PAD e Sindicância, por meio de videoconferência. Uma audiência que, pelo sistema tradicional, demoraria em média uma hora e meia de duração, pela videoconferência, esse tempo diminui para algo em torno de 25 a 40 minutos.

No tocante ao aspecto econômico-financeiro, imagine-se que a comissão processante tenha que ouvir uma testemunha (servidor público) que, à época dos fatos, residia em Brasília, mas agora, está morando em Teresina (PI). Pergunta-se, então: quanto custaria para o erário as despesas da vinda desta testemunha para Brasília (local em que tramita o processo administrativo), com o pagamento de diárias, passagens aéreas (ida e volta) e hospedagem? Suponhamos que as passagens áreas (ida e volta) custariam em média R$ 3.500,00; as diárias, R$ 450,00; e a hospedagem, R$ 300,00.

Pois bem, somando tudo, o erário teria despendido só com a realização da oitiva dessa testemunha o valor aproximado de R$ 4.250,00! Já, contrariamente, se esse mesmo ato processual fosse realizado por videoconferência, o custo para o erário seria drasticamente inferior, quiçá, próximo de “zero”!

Ora, considerando o momento de crise econômica pelo qual atravessa o Brasil, é preciso usar o dinheiro público com maestria e responsabilidade fiscal.

Portanto, diante da existência desse avanço tecnológico hoje à disposição do Estado, defendemos que seus órgãos públicos devem, como dito antes, aplicar a técnica da videoconferência na instrução de PAD e Sindicância.

Enfim, trata-se de uma evolução tecnológica hoje existente no mercado e à disposição dos órgãos públicos que não tem volta.

A realização de atos processuais por videoconferência pode se dar ex officioou a requerimento da parte.

Concluindo, o servidor público acusado em PAD e Sindicância Punitiva, em cujo processo se realizem atos instrutórios por videoconferência, continuará tendo assegurados a seu favor o contraditório e a ampla defesa.

O acusado e a Administração serão beneficiados com a rapidez da realização dos atos processuais, sendo igualmente certo que haverá maior segurança no registro e documentação dos atos processuais, já que as imagens e o áudio das audiências serão anexados aos autos e preservados para consultas futuras.

O contribuinte e a sociedade serão beneficiados com a prestação dos serviços públicos prestados por meio da videoconferência, porquanto serão realizados com rapidez, economia, segurança e eficiência, sem que implique violação ao princípio constitucional da legalidade.

 

 

 

Autor: Manoel Messias de Sousa é analista do MPU/Apoio Jurídico/Direito, lotado na Procuradoria-Geral da República, em Brasília, com atuação em Processo Administrativo Disciplinar e Sindicância. Bacharel em Direito pela PUC-GO, é pós-graduado em Direito Penal e Processual Penal e em Direito Constitucional e professor universitário.


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