Alegações finais em processo penal – Não há crime de sonegação fiscal antes do encerramento do processo administrativo tributário – Revisado em 18/11/2019

Excelentíssimo(a) Senhor(a) Doutor(a) Juiz(a) de Direito da Comarca de

P.

S______, F_______ e J_______, nos autos da Ação Penal supra a que respondem perante este r. Juízo vem por seu advogado infra-firmado apresentar as suas ALEGAÇÕES FINAIS na forma do artigo 500 do Código de Processo Penal, o que fazem na forma abaixo, esperando a absolvição penal ante a inexistência de qualquer crime contra a ordem econômica e tributária.

MM. Dr. Juiz:

1. Inicialmente, algumas palavras sobre a personalidade dos acusados de terem praticado crime contra a ordem econômica e tributária na forma da r. denúncia de fls. . São cidadãos de bem, portadores de uma folha de antecedentes penais imaculada na forma de fls. 432-4 do processo, já com mais de 60 anos cada acusado, e que geram na forma do atestado anexo, mais de 832 empregos diretos e indiretos em suas duas concessionárias, em suas fazendas e no laticínio do qual são sócios. Julga-se, Exa., sem dúvida homens de bem, e que não cometeram crime algum como se demonstrará a V. Exa.;

2. Lamenta-se, Senhor Julgador, que o jovem e brilhante Promotor Público, em suas alegações finais em despacho lacônico, e sem qualquer fundamentação, sustenta apenas ” na forma da denúncia pela condenação dos acusados ” !

3. Respeitamos, mas não concordamos, porque processo penal é processo sério, e à luz de tantas explicações que fizemos e das juntadas de documentos com os v. Acórdãos na íntegra que geraram a absolvição do Sr. Contador da empresa dos acusados, não se pode admitir que o titular da ação penal, o Ministério Público, dentro deste sério processo, se limite em alegações finais a despachar ” pela condenação “.

4. Não nos resta pois Senhor Julgador outra saída senão apresentar nossas alegações finais na certeza de que se impõe a absolvição dos 3 acusados, que são os sócios cotistas das empresas ___________ que fizeram créditos de ICMS face à substituição tributária, em decorrência de posicionamento jurisprudencial à época vigente, não só da maioria dos juízes de primeira instância, como da maioria das decisões dos Tribunais Superiores, e do posicionamento que tinha o Superior Tribunal de Justiça, ANTES do entendimento POR MAIORIA do Supremo Tribunal Federal quando do julgamento da ADI 1851-5.

5. Vamos então, Senhor Julgador, analisar a ocorrência deste processo, e demonstrar que o mesmo é nulo ab initio, eis que desde a autuação fiscal quando foi efetuada – a até hoje ainda não transitada em julgado -, de forma afobada foi enviada ao Ministério Público a representação para fins penais, e sem maiores conhecimentos na matéria penal econômica, foi o neófito Promotor Público logo denunciando os ora defendentes por suposta infração à ordem econômica e tributária. Um absurdo sem precedentes, Exa.

6. A nulidade invocada ab initio, é feita com a mais absoluta base legal, e com fundamento em posicionamento unânime do Supremo Tribunal Federal e do STJ, no sentido de que não se admite denúncia penal por crime contra a ordem econômica e tributária antes de se esgotar a esfera administrativa. Esta é a posição jurisprudencial mais moderna e coerente para todos aqueles, e reconhecemos, poucos, que entendem de direito penal econômico, eis que necessária a base penal aliada ao profundo conhecimento da matéria tributária.

7. Há neste processo sem dúvida, falta de justa causa para a ação penal, e vamos usar nesta defesa o último julgamento que se tem notícia oriundo do Superior Tribunal de Justiça, e com apoio na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, ou seja, não se pode cogitar de crime de sonegação fiscal antes do encerramento do processo administrativo, momento em que se define se o tributo é devido e qual o respectivo quantum.

8. Em r. julgamento de 22 de setembro de 2005, a 5ª. Turma do STJ fixou o entendimento de que em crime de sonegação fiscal, a ação penal só é possível com o exaurimento do processo administrativo. Ao votar, o e. ministro relator José Arnaldo da Fonseca, destacou que, na linha do que vem delineando o Supremo Tribunal Federal, somente é possível o início da ação penal em relação a crime de sonegação quando o procedimento administrativo em curso for definitivamente concluído, já que discutível, ainda o lançamento tributário . Ressaltou ainda o e. ministro” In casu, comprova-se nos autos a controvérsia administrativo-fiscal, por onde a nova interpretação da Suprema Corte vem autorizando o trancamento da ação penal. Assim, recurso provido para trancar a ação penal por crime de sonegação fiscal, sem prejuízo da futura ação penal, com o término do procedimento administrativo ” ( anexo notícia do STJ 60 de 111 de 22 de setembro de 2005).

9. Não podemos deixar de tecer comentários ao posicionamento do Supremo Tribunal Federal no seu último julgamento sobre matéria penal econômica quando do julgamento no HC 83.353 através de sua Eg. 1ª. Turma, em 13 de setembro de 2005, e amplamente veiculado, quando a ordem foi concedida para trancar a ação penal contra 6 diretores da____ em posicionamento semelhante, só que ocorrera parcelamento do débito.

10. Neste processo, Senhor Julgador, sustentamos que o mesmo nasce morto, e com uma nulidade insanável à luz dos r. Julgados da Suprema Corte, que não admitem acusação penal em crime contra a ordem tributária sem que a questão esteja decidida no âmbito administrativo como neste processo, eis que há recurso pendente de decisão final no Conselho de Contribuintes, como se verifica pela cópia anexa que está juntada aos autos às fls .

11. Assim sendo, Exa, a defesa destes sérios empresários, requer a V. Exa que considere este processo inválido desde o oferecimento da r. denúncia de fls 2, ante a ausência de justa causa para a válida instauração da “persecutio criminis” , face ao posicionamento do Supremo Tribunal Federal em um de seus últimos julgamentos, ou seja no HC 84.262 DF que teve como Relator o E. Min. Celso de Mello, cuja r. Ementa ficou assim redigida:

“Ementa: HABEAS CORPUS. DELITO CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. SONEGAÇÃO FISCAL. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO-TRIBUTÁRIO AINDA EM CURSO. AJUIZAMENTO PREMATURO,PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DA AÇÃO PENAL. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A VÁLIDA INSTAURAÇÃO DA “PERSECUTIO CRIMINIS”. INVALIDAÇÃO DO PROCESSO PENAL DE CONHECIMENTO DESDE O OFERECIMENTO DA DENÚNCIA INCLUSIVE. PEDIDO DEFERIDO”.

Tratando-se dos delitos contra a ordem econômica, tipificados no art 1º da Lei 8.137-90, a instauração da concernente persecução penal depende da existência de decisão definitiva, proferida em sede procedimento administrativo, na qual se haja reconhecido a exigibilidade do crédito tributário (“an debeatur”) , além de definido o respectivo valor (“quantum debeatur”), sob pena de, em inocorrendo essa condição objetiva de punibilidade, não se legitimar, por ausência de tipicidade penal, a válida formulação de denúncia pelo Ministério Público. Precedentes. Enquanto não se constituir, definitivamente, em sede administrativa o crédito tributário, não se terá por caracterizado, no plano da tipicidade penal, o crime contra a ordem tributária, tal como previsto no art  1º da Lei 8.137-90. Em consequência, e por ainda não se achar configurada a própria criminalidade da conduta do agente, sequer é lícito cogitar-se da fluência da prescrição penal, que somente se iniciará com a consumação do delito (CP, art 111,1). Precedentes.

E. Magistrado, essa é a posição da Suprema Corte, e este v. Acórdão citado é o último da Augusta Corte, e publicado em 29.04.2005 (PP00045 Ementário vol. 02189-02 PP 00301).

E, se destaque que a questão já está mais do que consolidada na jurisprudência, podendo-se citar do Supremo Tribunal Federal a ADI 1571 ( RTJ 190-22 ), HC 81611 ( Informativos 286,326 e 333do STF – Tribunal Pleno, HC 83414 ( RTJ 190-305 ), HC 84092, HC 84423, AI 419578, RT 594-458 , RT 747-597, RT 749-565, RT 753-507. ( todos retirados das observações constantes do julgamento referenciado ).

12. Há necessidade de algumas observações sobre a matéria tributária e seu relacionamento com esta questão penal.

Esta questão do creditamento vinha sendo acolhida pela Justiça, de forma tranquila inclusive pelo Superior Tribunal de Justiça, na aplicação tranquila do art. 150 & 7º da Constituição Federal, com a redação da EC 3-93, que estabelece da forma mais cristalina possível que quando se verificar que o fato gerador presumido não se realizou, o substituído tributário tem assegurada a restituição da quantia paga e de forma imediata e preferencialmente.

O Superior Tribunal de Justiça, tem dezenas de v. Acórdãos, como no REsp 300.182 , unânime, que teve como Relatora a E. Ministra Eliana Calmon ( DJU de 25.02.2002 ) que asseverou: ” O STJ sedimentou o entendimento no sentido de que no regime de substituição tributária para frente, pago o ICMS a maior, tem o substituto o direito de repetir o que extrapolou “.

Pode-se citar outro v. Julgado do STJ, REsp 331.351, Relator E. Min Garcia Vieira, in DJU de 11.06.2001.

TRIBUTÁRIO. ICM.SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. FATO GERADOR PRESUMIDO. VENDA EFETIVADA MEDIANTE PREÇO MENOR QUE O VALOR ESTABELECIDO NA PAUTA FISCAL DIREITO A COMPENSAÇÃO.

É lícito ao contribuinte substituído efetuar compensação do tributo recolhido a maior, em aditamento, pelo substituto, quando a venda geratriz do tributo tenha correspondido a preço inferior àquele previsto na pauta fiscal “.

O problema se iniciou, quando mais uma vez o nosso Supremo Tribunal Federal, julgou a questão quando da ADI 185 ajuizada pela CNC contra a cláusula 2ª do Convênio ICMS 13-97 do Estado de Alagoas, e decidiu não por maioria e com 3 votos vencidos, que o contribuinte não tinha direito ao crédito quando o fato gerador da substituição tributária não tivesse se materializado, em data vênia, e mais uma vez, por questão política, sem dúvida.

Destaque-se aqui o erudito artigo da Dra. Elisabeth Leão que está nos autos ” Regime de substituição tributária no ICMS, e incontestável direito às diferenças entre o valor do fato gerador presumido e o efetivamente pago ” onde a questão tributária a favor do contribuinte foi analisada em profundidade.

Voltando ao Supremo, Exa, quando modificou a jurisprudência 3 e. Ministros de nossa Augusta Corte votaram contra, e foram vencidos, eis que não concordavam com a posição da Corte, e foram eles, Celso de Melo, Marco Aurélio e Carlos Velloso.

E, na ocasião, o e. Min. Marco Aurélio consignou na espécie o enriquecimento ilícito do Estado com as as sábias e corajosas palavras:

” Assusta-me a jurisprudência que vem se formando em torno das relações tributárias nessa Corte, argumentando que dificilmente o Estado presume um valor inferior, e dizendo que não acredita na boa vontade do Estado – concluiu Marco Aurélio – justificando que no campo tributário sempre se consegue majorar os impostos sem justificativa legal ” .

Quando esta questão foi julgada pelo Supremo, Exa, e por maioria, contra 3 votos de seus mais ilustre Ministros, e como a decisão foi em ADI gera o efeito era omnes na forma do artigo 102 & 2º da CF e art 28 & único da Lei 9.868-99, as fiscalizações do ICMS, e às vezes com procedimentos não muito ortodoxos, como neste caso, em que a fiscalização fez a representação ao MP, e este ofereceu a denúncia de forma precipitada , entendem que todos aqueles que fizeram o crédito, cometeram crimes contra a ordem tributária, o que nos faz recordar Rui Barbosa quando em suas Obras Completas escreveu ” que o fisco brasileiro não se digna de raciocinar como nós outros simples mortais “.

13. O importante e muito então a assinalar, Exa, é que à época em que os créditos legítimos do ICMS foram feitos, a jurisprudência dominante era totalmente favorável aos contribuintes, pelo que os créditos foram feitos de forma legítima e amparados pela corrente jurisprudencial que era a mais forte à época, e nem ad absurdo há que se falar como quer o Ministério Público em crime contra a ordem econômica e tributária , e o mais importante não ocorreu dolo algum da empresa ou de seus sócios quando os créditos foram materializados, o que se demonstrou de forma extenuante com a juntada aos autos de 22 v. Acórdãos na íntegra sobre a matéria, e a favor dos contribuintes.

14. Ex Positis, Exa., os Autores requerem respeitosamente:

a) A absolvição dos mesmos ante a ausência de qualquer crime contra a ordem econômica e tributária; e alternativamente a suspensão desta ação penal ante a ausência de justa causa na forma da r. decisão da Suprema Corte no julgamento do HC 84.262 DF, Relator Min. Celso de Melo, como medida de JUSTIÇA.

Nesses Termos.

Pede e Espera Deferimento.

(Local, data e ano).

(Nome e assinatura do advogado).

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.


Você está prestes a ser direcionado à página
Deseja realmente prosseguir?
Atendimento