Contestação de ação de cobrança de corretagem imobiliária

Cassio Wasser Gonçalves
Advogado
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EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA MM. __ª VARA CÍVEL DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA CAPITAL

Ref.: processo nº ???? (Ordinária)

???, devidamente qualificado às fls.27 dos autos da ação que lhe move ??? IMÓVEIS S/C LTDA, por seus advogados, e com devido respeito e acatamento, vem à presença de V.Exa. para apresentar sua CONTESTAÇÃO, pelos fatos e fundamentos a seguir:

Sinteticamente, o requerente tenta induzir ao raciocínio de que está legitimado a cobrar do requerido suposta comissão por desistência de negócio. Entretanto, pelos argumentos e provas a serem produzidas nestes autos, o requerido comprovará que o requerente não tem direito a nenhuma comissão pois o negócio não se consumou na forma como estabelece a lei para a compra e venda de bens imóveis, que a obrigação de pagar eventual comissão era exclusiva dos vendedores do imóvel, que as tratativas do referido negócio foram rescindidas sem ônus e por mútuo acordo das partes contratantes, que o imóvel a que se refere o requerente já foi vendido a outra pessoa e que o requerente já recebeu sua comissão, portanto nada tendo a receber novamente, sob pena de locupletar-se ilicitamente, situação repugnada pelo direito e que afronta o Código de Defesa do Consumidor.

Diante dos documentos acostados aos autos, resulta que o requerente nenhum direito tem a qualquer comissão que seja pois a compra e venda de imóvel só se consuma com a lavratura de escritura pública, de acordo com o regramento do Código Civil, fato este confirmado pela farta jurisprudência dos Tribunais. Segundo o entendimento predominante na Quarta Turma do STJ, tal comissão não pode ser cobrada se o negócio não se consumou, não servindo esses documentos para comprovar a concretização do negócio pois são de caráter provisório, desprovido de eficácia e de validade para compra e venda de imóvel.

De fato, como decidiu a Quarta Turma do STJ, no Resp nº 238305, os atos que chegam somente até a primeira fase das negociações não autorizam o corretor a exigir o pagamento de comissão se qualquer das partes não prosseguir com a transação. Inclusive, para o Ministro Raphael de Barros Monteiro, não é o caso de a empresa poder argumentar que há um subitem que condiciona a desistência da compra a pagamento de uma comissão, pois o próprio ajuste feito dessa maneira indica que o negócio jurídico não se encontrava ainda consumado àquela altura, assim, como não obteve êxito com a intermediação não faz jus à comissão.

Conjugando-se os documentos dos autos com o referido acórdão, resulta na ilegitimidade do requerente de exigir qualquer comissão que seja, justamente porque a transação não foi levada a cabo, esta somente ocorrendo com a lavratura de escritura de venda e compra.

Não é demais lembrar, também, que o requerente, como representante dos vendedores e profissional especializado do ramo imobiliário e equiparado a fornecedor, era obrigado a respeitar o Código de Defesa do Consumidor. A ele, inclusive, dado o grau de especialidade e ramo de atividade, incumbia o dever adicional de prestar seus serviços com observância dos preceitos da classe.

A conduta omissa e imprudente do requerente é inclusive afronta aos preceitos do Código de Ética Profissional dos Corretores de Imóveis (Resolução COFECI 14/78 e alterações posteriores), ferindo principalmente o artigo 4º, I, II e IV, que especificamente estabelecem que é dever do corretor de imóveis:

Artigo 4º – Cumpre ao corretor de imóveis, em relação aos clientes:
I – inteirar-se de todas as circunstâncias do negócio antes de oferecê-lo.
II – apresentar, ao oferecer um negócio, dados rigorosamente certos, nunca omitindo detalhes que o depreciem, informando o cliente dos riscos e demais circunstâncias que possam comprometer o negócio.
III – ……
IV – comunicar, imediatamente, ao cliente o recebimento de valores ou documentos a ele destinados.

E se o corretor de imóveis, como aconteceu no presente caso, não cumprir os preceitos do artigo 4º, responderá por seus atos, como previsto no artigo 5º do mesmo estatuto:

Artigo 5º – O corretor de imóveis responde civil e penalmente por atos profissionais danosos ao cliente, a que tenha dado causa por imperícia, imprudência ou negligência ou infrações éticas.

Fato comprovador do vício na prestação do serviços do requerente, está no Código de Ética Profissional dos Corretores de Imóveis (Resolução COFECI 14/78), que estabelece no artigo 4º, I, II e IV, que é dever do corretor de imóveis: I – inteirar-se de todas as circunstâncias do negócio antes de oferecê-lo; II – apresentar, ao oferecer um negócio, dados rigorosamente certos, nunca omitindo detalhes que o depreciem, informando o cliente dos riscos e demais circunstâncias que possam comprometer o negócio; IV – comunicar, imediatamente, ao cliente o recebimento de valores ou documentos a ele destinados. E se assim não proceder o corretor, o artigo 5º, do mesmo diploma, estabelece que “O corretor de imóveis responde civil e penalmente por atos profissionais danosos ao cliente, a que tenha dado causa por imperícia, imprudência ou negligência ou infrações éticas.”

Decorrência lógica dessas considerações, é que o requerente efetivamente prestou péssimos serviços ao requerido, a caracterizar os vícios a que alude o Código de Defesa do Consumidor e a ensejar a improcedência da ação.

Consoante ao que já decidiram os Tribunais, o requerente, ao insistir na cobrança de comissão de corretagem a que não tem direito, porque efetivamente nenhum serviço prestou para a concretização da venda e compra, esquece-se de que a prática da profissão do corretor, principalmente em São Paulo, fez com que alguns costumes viessem se estabelecendo ao longo dos anos. Assim é que compete ao corretor aproximar as partes e colher de todos a concordância na compra e venda do imóvel, como também assessorá-las no sentido de fazer com que a negociação chegue a bom final, prestando a assistência necessária para tanto. Ao contrário do entendimento às vezes expresso, a simples aproximação e colheita da concordância não dá, por si só, direito ao recebimento da comissão.

Como se sabe, em grande parte das vezes, principalmente relativamente a pessoas sem preparo jurídico específico, o corretor transforma-se em conselheiro e orientador do negócio, especificamente no que diz respeito a documentação. Em outras palavras, o leigo que quer vender ou comprar um imóvel vê no corretor aquela pessoa que trará o outro contratante e que auxiliará até que o negócio seja formalizado, com a efetiva compra e venda. Aliás, a própria Lei 6530/78 diz no artigo 3º, in fine, que pode o corretor “opinar quanto à comercialização imobiliária”. Esta opinião evidentemente diz também respeito à assistência que deve prestar a seu clientes, equiparados a consumidores, sobre a possibilidade de efetiva comercialização.

Tal costume acima lembrado está correto. Não fosse assim, poderiam as partes contratantes serem colocadas em situação injusta, sendo obrigadas a pagar mesmo que o negócio se tornasse inviável sem culpa delas. Ao corretor compete, antes de aproximar as partes, examinar a documentação apresentada pelo vendedor para saber se aquele imóvel tem condições jurídicas (documentais) de ser vendido.

Estando o corretor a prestar serviços de intermediação para pessoas físicas que não contam com assistência jurídica regular, equipara-se a fornecedor, para os efeitos do Código de Defesa do Consumidor, e não basta a aproximação das partes e a concordância de comprador e vendedor; é necessário ainda que o negócio não se torne inviável por óbice que o corretor deveria, por força de sua profissão, já conhecer e comunicar ao vendedor e ao comprador.

Por derradeiro, estando essa prestação de serviços subordinada ainda aos preceitos do Código de Defesa do Consumidor (por preencher os requisitos de seus artigos 2º e 3º), parece correto e justo que responda o corretor negligente e imprudente pela reparação dos danos a que deu causa pela má qualidade na prestação de serviços, pelas cláusulas abusivas, obscuras e leoninas que maliciosamente inseriu no documento de proposta e no contrato posterior, e pela ausência de assessoria condizente com o negócio que se pretendia realizar, conforme dispõem os artigos 6º, III, V, VI, VIII, 14, 20, 34, 39, V, 46, e 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor.

Como o requerente foi negligente na prestação de seus serviços e porque ele maliciosamente aproveitou-se da ignorância do requerido, incluindo cláusula abusiva que permitia a imobiliária cobrar unilateralmente comissão mesmo que a venda não se efetuasse, e assim obtendo a assinatura do requerido sob o pretexto de que era um documento provisório e sem consequência, mister a improcedência da ação, condenando-se o requerente inclusive em litigância de má-fé.

Porém, obcecado pelo ganho fácil, insensível aos apelos e direitos de consumidor do requerido, e ferindo os artigos 6º, III, V, VI, VIII, 14, 20, 34, 39, V, 46, e 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor, o requerente, ainda assim veio a Juízo, numa vã tentativa de exigir um pagamento por serviços não prestados, sob a precária argumentação de existência de contrato cujas características denotam que o requerente não tem nenhum direito à pretensa comissão por desatenção dele aos princípios reguladores do Código de Defesa do Consumidor, e por inexistir elementos mínimos para aperfeiçoamento e eficácia de venda e compra de bem imóvel, constituindo-se o documento acostado à inicial em mero pré-contrato, que não pode carrear ônus ao requerido, principalmente porque não existiu a necessária escritura de venda e compra, única forma em direito de se alienar bens imóveis.

Pela falta de elementos que lhe legitimassem a presente cobrança, está caracterizada a tentativa do requerente de locupletar-se ilicitamente, situação repugnada pelo direito e que não merece acolhida nestes autos.

A jurisprudência é pacífica no entendimento de que a desistência de comprar imóvel não obriga a pagar comissão à imobiliária. Os Tribunais exigem o resultado útil, que em outras palavras significa a efetiva alienação do domínio do bem imóvel, que só se perfaz com a outorga de escritura de venda e compra, quando o vendedor efetivamente obterá lucro (resultado útil). O Supremo Tribunal Federal já manifestou que:

Se a mediação não produziu resultado útil, não se realizando o negócio, a comissão não se torna devida, segundo a melhor doutrina. (RE 78.578 de 27/08/74).

O corretor somente assiste direito a remuneração quando o negócio se concretiza. Não cabe a corretagem se a mediação não alcançou resultado útil. Dissídio jurisprudencial comprovado. (RE 94.747-7-GO, de 22/09/81).

O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, em incidente de uniformização de jurisprudência confirmou esse entendimento, decidindo que:

Não se tendo aperfeiçoado o negócio jurídico em face da desistência, à derradeira hora, manifestada pelo interessado comprador, não faz jus a corretora à comissão pleiteada. (RE 238.305-MS, de 17/08/2000).

Constitui a corretagem obrigação de resultado, sendo devido o pagamento da intermediação apenas de for realizado o negócio almejado. (RE 278.028-PE, de 19/12/2000).

O serviço de corretagem somente se tem como aperfeiçoado quando o negócio imobiliário se concretiza, posto que o risco é de sua essência. (RE 193.067-PR, de 21/09/2000).

O 2º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo também vem decidindo no mesmo sentido, confirmando que o corretor somente tem direito de receber comissão se o negócio se a venda de consumar:

A comissão referente à mediação na venda de imóveis somente é devida se aperfeiçoado o negócio, formalizando-se o evento por instrumento idôneo. (Ap. 516.400, 2ª Câm., Rel. Juiz Peçanha de Moraes, j.18.05.98).

Portanto, não pode ser cobrada nenhuma comissão se o negócio não se consumou, não servindo para comprovar a concretização do negócio o documento acostado à inicial, pois é um documento provisório desprovido de eficácia e de validade para compra e venda de imóvel.

Convém salientar, também, que a rescisão operou-se por mútuo acordo entre o requerido e os vendedores, não se ressalvando ônus a nenhuma das partes, nem atribuindo a nenhuma delas o dever de pagar qualquer comissão, como se dessume do documento de fls.16. Caso houvesse ônus do requerido de pagar a comissão ao requerente, deveria estar perfeitamente esclarecido no documento de rescisão, sob pena de não valer contra o requerido, na medida em que a comissão de corretagem somente era devida pelos vendedores, conforme usos e costumes do mercado imobiliário e conforme ficou ajustado na cláusula 13ª do documento de fls.15, onde os vendedores confessaram-se devedores da comissão. Sem o devido esclarecimento, não vale a remissão apontada pelo requerente, pois caracteriza cláusula abusiva e leonina, de caráter obscuro e que só favoreceria o requerente, em detrimento das partes contratantes.

A referida rescisão, reafirme-se, foi pactuada sem prejuízo a nenhuma das partes, e não pode o requerente valer-se de entrelinhas daquele instrumento, por ser parte ilegítima na transação, uma vez que não lhe dizia respeito as cláusulas e condições do negócio, por inexistir legitimidade do requerente para figurar como parte no contrato.

Permitir que o requerente fundamente sua pretensão nas entrelinhas do documento de fls.16 é afrontar as disposições do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor, na medida em que ele não era parte na transação e tal permissivo confundiria-se com cláusula abusiva e leonina, posto de interpretação dúbia e obscura, e portanto sem efeito, com base no que dispõe o Código de Defesa do Consumidor. Ademais, convém lembrar que a comissão, conforme pactuado inicialmente, seria de exclusiva responsabilidade dos vendedores do imóvel e esse ônus somente poderia ser invertido se houvesse expressa e clara determinação a respeito. Como não houve, então incabível a pretensão do autor!

E mais, o imóvel objeto daquela transação já foi vendido a outrem e o requerente, tendo intermediado a transação, já recebeu sua comissão. Portanto, permitir que ele venha a juízo e novamente receba pelo mesmo serviço, nada mais é do pactuar com a tentativa de enriquecimento ilícito do requerente, e por isso também a demanda não merece prosperar. Para provar, o requerido requer a intimação e o depoimento dos vendedores e dos novos compradores do referido imóvel, bem como permissão para juntada de documentos e certidões.

Diante do exposto, pelas provas presentes e pelas que serão produzidas no decorrer da demanda, o requerido vem à presença de V.Exa. para requerer a improcedência total da ação, condenando-se o requerente no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios.

Pretende provar por todos os meios admitidos, sem exclusão de nenhum deles, principalmente pela juntada, exibição e requisição de documentos e certidões, depoimento das partes e oitiva de testemunhas que serão oportunamente arroladas, especialmente as partes que compuseram a nova compra e venda acima mencionada, cuja intimação desde já fica requerida.

Por fim, requer que as intimações dos atos processuais sejam feitas nas pessoas dos advogados DR. …. e DR. , com escritório na Rua ………, anotando-os na contracapa dos autos.

Termos em que, Pede e Espera Deferimento.

São Paulo, … de ……. de …..

Advogado

Fonte: Escritório Online

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