Peça inicial contra companhia de energia elétrica, objetivando, mediante antecipação de tutela, ordem judicial para proibir a suspensão do fornecimento de energia por falta de pagamento da conta

Sergio Wainstock
Advogado – Consultor Jurídico no Rio de Janeiro
Direito Civil e Comercial
Tel. 0.XX.21.78368444 ou 0.XX.21.91134375
http://br.yahoo.com/sergiowainstock/index.html
http://br.geocities.com/sergiowainstock/consultorjuridico.html

Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da Comarca de _______

Fulano___, _____, casado, aposentado, portador do CPF nº ______, residente e domiciliado na _______, vem propor, como de fato propõe, uma AÇÃO DE RESSARCIMENTO E DE EXECUÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, contra a ___Companhia de Eletricidade…. , com sede na _____, pelos fatos e fundamentos que, a seguir, passa a expender:

DOS FATOS

Há cerca de um ano um funcionário da Companhia__ compareceu na residência do autor e afirmou que teria constatado a existência de uma suposta fraude no relógio que marca o consumo da energia elétrica. Assim, sob ameaça de corte de fornecimento de energia elétrica, o que iria acarretar um grande transtorno ao autor, a Companhia___ exigiu que este assinasse uma confissão de dívida e concordou no parcelamento do pretenso débito em 24 (vinte e quatro) parcelas de R$ 500,00 (quinhentos reais), perfazendo um montante de R$ 11.500,00 (onze mil e quinhentos reais).

Ocorreu, de fato, a coação irresistível prevista no art. 98 do Código Civil.

Além do mais, cumpre salientar que, na ocasião, o autor não estava em perfeitas condições de saúde e com discernimento suficiente para bem avaliar as consequências da assinatura de tal contrato; fato este que será devidamente comprovado, possibilitando, assim, que seja declarada a sua anulação.

Deve ser, ainda, esclarecido que foi cumprida algumas parcelas do acordo e, agora, mais recentemente, o autor foi conscientizado de que o referido contrato de “financiamento de débito” não tem suporte legal, pelo argumento de que o débito a que se refere é totalmente inexistente.

E, ademais, não poderia ser cobrada, a parcela derivada do contrato de “financiamento de débito “, juntamente com a tarifa de fornecimento atual de energia elétrica pois que são de natureza diferentes; e, além disso, a possibilidade do não pagamento da fatura, na sua totalidade (incluída a parcela do financiamento), poderia implicar no corte de fornecimento de energia elétrica – atitude esta que seria totalmente ilegal.

O fornecimento da energia e luz elétrica é controlado pelo medidor ou relógio e, mensalmente, a Companhia__ remete ao autor a respectiva conta que deve ser paga, rigorosamente, em dia, nos respectivos vencimentos.
Esta é a obrigação do consumidor.

Mas, no entanto, na hipótese dos autos, insiste a ré no pagamento dos exorbitantes valores constantes na fatura (documentos em anexo), sob ameaça de desligamento no fornecimento de energia e luz elétrica (conforme se comprova com o documento em anexo), sujeitando, o autor, a irreparáveis e elevadíssimos prejuízos e transtornos.

Em consequência, o autor vem se socorrer das medidas judiciais adequadas para a proteção de seu direito, no sentido de que a Companhia___ se abstenha a cobrar o débito constante no “contrato de financiamento”, juntamente com a fatura que demonstra o valor da tarifa, correspondente ao consumo atual do fornecimento da energia elétrica; e que se abstenha de suspender ou interromper o fornecimento da energia elétrica pelo não pagamento das parcelas constantes no referido contrato de financimanto.

DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS

A Companhia…. é uma sociedade anônima, com personalidade jurídica de empresa privada, não se podendo transfigurar-lhe em sociedade de economia mista ou ente paraestatal. O simples fato de ser concessionária de serviço público, não lhe retira a condição de ente privado ? sociedade anônima, regida pela Lei de Sociedades Anônimas.

A Companhia…. é regida pela Lei de Sociedades Anônimas e objetiva lucros através das tarifas cobradas dos usuários; tarifas estas que não tem conotação tributária.

Tem-se a condição de serviço público quando o Estado, por si ou por uma concessionária, oferece utilidade ou comodidade material à coletividade, ao público (serviço público) que dela se serve, se quiser. Neste caso, pelo serviço ofertado ao público, se irá cobrar ?tarifas?, que correspondem à contrapartida que os usuários pagarão ao prestador daquela comodidade ou utilidade pelo serviço que lhes está prestando.

Isto quer dizer que a prestação do serviço público é feita em nome do poder público só que há a obrigação de manter-se o equilíbrio econômico-financeiro inicial, no caso desrespeitada pela concessionária quando altera a permissão quebrando aquele equilíbrio; no caso, desrespeitada pela concessionária quando altera os princípios de direito cobrando valores à título de ?revisão de faturamento? sem a correspondente contraprestação da utilização do serviço; ou seja, sem a contraprestação do fornecimento de energia elétrica.

A tarifa, referida por Oswaldo Aranha Bandeira de Mello é, obviamente, aquela cobrada ao usuário pela utilização do serviço, nunca aquela imposta coativamente ao permissionário que faz às vezes do Estado na prestação do serviço. Por isso, embora concorde-se em que o Estado ou a concessionária possa cobrar preço público ou tarifa por um serviço prestado, isto não implica, necessariamente, em que tal cobrança se faça, de forma arbitrária e coercitiva.

Por isso, embora o mestre Hely Lopes Meirelles afirme ?ser comum nos contratos de concessão de serviço público a fixação de um preço, devido pelo concessionário ao concedente, a título de remuneração dos serviços de supervisão, fiscalização e controle da execução dos ajustes a cargo deste último? , nem por isso poderá o concessionário quebrar aquele equilíbrio, numa imposição a posteriori do que foi ajustado, ainda que sob o argumento “revisão de faturamento”, ou mesmo, de uma suposta fraude, a não ser que esta seja devidamente comprovada.

Tanto assim que o mestre Hely Lopes Meirelles é claro em afirmar que tal remuneração é prevista nos contratos, cuja natureza jurídica pressupõe consenso, acordo de vontades, nunca imposição a posteriori, manu militari, ofensiva do já lembrado equilíbrio econômico-financeiro que é a viga mestra de todo o pacto.

Na dicção do art. 22 do Código de Defesa do Consumidor, os órgãos públicos, por si ou por suas empresas, concessionárias, permissionárias, ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos (Lei nº 8.078/90, arts. 6º, X e 22).

A Lei nº 8.987/95 assim dispõe:

Art. 6º. Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato.
§ 1º. Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.
Art. 7º. Sem prejuízo do disposto na Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, são direitos e obrigações dos usuários:
I – receber serviço adequado;

Assim, qualquer acréscimo que supere o valor real do consumo é ilegal (art.39,V; 51, I, IV, XV, do CDC), injusto e imoral; é arbitrário. A suspensão do fornecimento de serviço público tão essencial (não é possível nem para o inadimplente, nem mesmo na hipótese de eventual furto de energia elétrica) é a negação dos deveres do Estado.

A ré, na verdade, pretende abolir o direito do consumidor à continuidade da prestação do serviço público essencial como é a energia elétrica (art. 22, CDC).

A impossibilidade jurídica do corte de energia resulta exatamente da natureza dessa. Não há lugar para aplicação do art. 1.092 do Código Civil, quer por inexistir inadimplemento contratual, quer porque não se cuida de relação de direito privado. Seria pura arbitrariedade com todas as consequencias jurídicas.

Em suma, a tarifa, que é a remuneração dos serviços públicos, deve ser avaliada e medida através dos meios próprios, qual seja, do relógio ou medidor instalado pela própria concessionária; não pode prevalecer uma cobrança arbitrária, injustificada, sob fundamento de uma pseudo fraude, altamente prejudicial ao usuário e ofensiva ao direito, ainda mais quando não devidamente comprovada.

Em prosseguindo, ressalta o autor que, tendo em vista a deficiência quanto a manifestação de vontade do ato jurídico, inclusive a existência de coação – como se provará no decorrer do presente feito – impingida ao autor, o referido ” contrato de financiamento de débito” é totalmente nulo.

Washington de Barros Monteiro, discorrendo sobre as imperfeições dos atos jurídicos, esclarece:

?Essas imperfeições provêm de uma das três causas seguintes: a) por falta de um elemento essencial e, portanto, indispensável a sua existência (consentimento, objeto, causa). Em tais condições é evidente que o ato, não tendo chegado a se completar, nenhum efeito pode produzir. A doutrina caracteriza essa situação com o termo inexistente melhormente chamado ato incompleto ou ato inacabado no direito alemão; b) o ato, reunindo embora todos os elementos fundamentais, foi praticado com violação da lei, é contrário a ordem pública, ou aos bons constumes ou não observou a forma legal. Por tais razões, fica ele eivado de visceral nulidade, recusando-lhe a ordem jurídica os efeitos que produziria se fosse perfeito. São os atos nulos (de ne nullus – nenhum); c) finalmente o defeito pode vir da imperfeição da vontade, ou porque emanada de um incapaz, ou porque sua declaração se inquinou de alguns dos vícios do consentimento (erro ou ignorância, dolo e coação), ou ainda porque a mesma vontade, desviando-se da lisura e da boa – fé, atuou no sentido de prejudicar a outrem, ou de vulnerar a lei. Atos anuláveis é a expressão empregada para assinalar essa anomalia de menor gravidade. Nosso Código não se referiu, de modo explícito, à primeira categoria, tida presentemente como inútil complicação. O legislador pátrio considerou o ato inexistente como simples fato, inidôneo à produção de consequências jurídicas (Curso de Direito Civil, Ed. Saraiva, vol. 1º, 1964, págs. 272/273)?

ORLANDO GOMES, decerto o civilista pátrio que melhor doutrinou a respeito, explica que os dois elementos básicos para a concepção de qualquer negócio jurídico são o consentimento e o objeto. Apenas no que tange ao primeiro pressuposto, escreveu:

?Todo negócio jurídico é, por definição, uma declaração de vontade. Não se pode conceber a sua existência se lhe falta esse pressuposto necessário a seu nascimento. Uma vontade extorquida pela violência ou declarada por erro obstativo não é defeituosa por vício que possibilite a anulação do negócio. Há, no caso, ausência completa de consentimento, que caracteriza a inexistência. Mais clara ainda, quando falta a vontade de manifestação (?Introdução ao Direito Civil?, Forense, 6ª edição, pg. 522).

Em considerando que o ato jurídico tem por conteúdo uma declaração de vontade, o agente deve ser capaz para ?querer?, validamente, faltou, portanto, na hipótese dos autos, o principal elemento consubstanciador da consumação do contrato de reconhecimento de dívida, qual seja, a manifestação de vontade válida, livre de qualquer coação, e, portanto, o ato negocial que dela derivou é totalmente nulo.

Ademais, estando, o autor, sob ameaça de corte de energia de luz elétrica, em virtude do não pagamento do parcelamento (cobrado juntamente com a tarifa de consumo atual), com a perspectiva de se ver impossibilitado de exercer suas atividades e de sofrer um prejuízo irreparável, justifica-se a concessão da tutela antecipada, prevista no art. 273 do CPC.

Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, anterior, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança, da alegação e:
I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou
II – fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.

Na verdade, o instituto da tutela antecipatória desempenha papel fundamental no equacionamento e solução de grande parte dos problemas que hoje preocupam não só o Poder Judiciário e sua crise, mas sobretudo seu destinatário: o jurisdicionado.

Nesse sentido, o preclaríssimo mestre LUIZ GUILHERME MARINONI, na célebre obra “A Tutela Antecipada na Reforma do Processo Civil” (Malheiros Editores, 1995, pág. 14), ao cuidar do assunto, afirma que “o procedimento ordinário é injusto às partes mais pobres, que não podem esperar, sem dano grave, a realização dos seus direitos. Todos sabem que os mais fracos ou pobres aceitam transacionar sobre os seus direitos em virtude da lentidão da Justiça, abrindo mão da parcela do direito que provavelmente seria realizado, mas depois de muito tempo. A demora do processo, na verdade, sempre lesou o princípio da igualdade.”

Por essas razões, o direito a uma prestação jurisdicional dentro de um prazo razoável é, indiscutivelmente, um direito de cidadania, e neste sentido novamente argumenta, com muita propriedade, o Professor JOSÉ ROGÉRIO CRUZ E TUCCI (Tribuna do Direito, pág. 4), citando, inicialmente, como suporte jurídico para seu posicionamento, o multimencionado § 2º do artigo 5º da Lex Fundamentalis, que invoca os tratados e convenções, dos quais o Brasil seja signatário, para depois dizer que: “Oportuno lembrar, nesse particular, que o nosso País aderiu, em 26.05.92, à Convenção Americana sobre Direitos Humanos, assinada em San José, Costa Rica, em 69, que preceitua em seu art. 8º, 1: `Toda pessoa tem direito de ser ouvida com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido por lei anterior…’. Ora, a despeito da garantia do `due process of law’ (art. 5º, LIV, CF), pressupor, por óbvio, o direito ao rápido desfecho do litígio ou da `persecutio criminis’, encontra aplicação, no ordenamento jurídico brasileiro, dada sua inequívoca compatibilidade, a regra contida na supratranscrita norma”.

Frente ao importante objetivo da tutela antecipada, torna-se indispensável que os Juizes, tenham não só a real latitude deste instituto, mas principalmente a compreensão de usá-lo de forma adequada, se não afastando, pelo menos diminuindo esse risco da morosidade da prestação jurisdicional.

Em suma, impõe-se, à hipótese, data venia, a concessão da tutela antecipada a fim de que o autor não venha a sofrer qualquer medida violenta, consistente no corte de fornecimento de energia ou de luz elétrica, em especial em virtude do não pagamento das parcelas de financiamento, o que caracterizaria uma arbitrariedade e ilegalidade, provocando, sem dúvida, dano e transtorno irreparável ao autor.

DO PEDIDO

Isto posto, REQUER:

Que seja deferida a tutela antecipada, referida no art. 273 do CPC, para que a ré desmembre as contas (uma de financiamento do débito e uma outra que represente a tarifa pelo efetivo e atual consumo de energia elétrica); que se abstenha de suspender ou interromper o fornecimento de energia elétrica no caso do não pagamento das parcelas especificadas no contrato de financiamento, no endereço do autor, na ________, desde que sejam pagas, mensalmente, as tarifas correspondentes ao consumo real, registrados, mês a mês, no relógio ou medidor, a fim de evitar danos e transtornos irreparáveis ao autor.

Que seja determinada a citação da ré, na pessoa de seu representante legal para responder ao presente feito, no prazo legal, sob pena de revelia.

Que seja condenada a ré ao pagamento de custas judiciais e honorários advocatícios de 20%, sobre o valor da causa.

Que seja deferida a produção de provas documentais, orais e periciais, se for o caso;

Valor da causa: R$ 7.200,00.

Termos em que,

E. Deferimento.

Cidade, __ de ______ de _____

Fonte: Escritório Online

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.


Você está prestes a ser direcionado à página
Deseja realmente prosseguir?
Init code Huggy.chat End code Huggy.chat