Recurso ordinário trabalhista – Preliminar de cerceamento de defesa por negativa de adiamento de audiência para oitiva de testemunhas – Mérito sobre horas extras (sobrejornada)

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA MM. XX VARA DO TRABALHO DE SÃO PAULO.

Processo número -XXXXXX

RECORRENTE, já qualificada nos autos do processo em epígrafe, que move contra RECORRIDO, por seus advogados e bastantes procuradores que esta subscrevem, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, por não se conformar com a r. sentença de fls., interpor o presente RECURSO ORDINÁRIO, na forma das razões anexas, requerendo seu regular processamento bem como sua oportuna remessa ao Egrégio Tribunal ad quem, para os devidos fins de direito.

Nestes termos,
Pede deferimento.

São Paulo, 16 de novembro de 2005.

ADVOGADA

PELA RECORRENTE

RAZÕES DE RECURSO ORDINÁRIO

EGRÉGIA TURMA
PRECLAROS JULGADORES,

PRELIMINARMENTE

I – Do Cerceamento de Defesa

1. Argúi a Recorrente cerceamento de defesa em face do indeferimento, pelo Magistrado a quo, do pedido de adiamento da audiência uma vez que suas testemunhas estavam ausentes por impossibilidade médica, fato superveniente à vontade de ambas, restando prejudicada a prova da sobrejornada. Tempestivamente, a Recorrente consignou seus protestos em ata, às fls. 87. Vale ressaltar que às fls. 58 a Recorrida obteve a chance de adiamento da referida audiência por ausência injustificada de suas testemunhas. Naquela oportunidade, especificamente, uma semana anterior, a Recorrente estava regular em audiência, com a prova da sua sobrejornada resguardada, ante o escorreito comparecimento de suas duas testemunhas.

2. A prova tem por finalidade precípua a formação da convicção do Julgador, seu principal destinatário, como bem elucida o insigne juslaboralista Manoel Antônio Teixeira Filho, em obra sobre o assunto. A admissibilidade encontra-se na esfera discricionária do Juiz, que vai averiguar da necessidade e conveniência de sua produção, em busca da verdade real.

3. A iniciativa da prova cabe às partes, e ao Juiz compete selecioná-la. O d. Juízo Monocrático não poderia indeferir pleito para redesignação de nova data para oitiva de testemunhas quando, de forma inexorável, baseia-se seu julgado única e exclusivamente, nos depoimentos colhidos em audiência e, desconsiderando a alegação de jornada diferenciada pela Recorrida, o que lhe atraiu o ônus de provar que a verídica jornada laboral era cumprida. Desconsiderou toda a farta e verídica documentação trazida aos autos pela Autora.

4. Vale ponderar que a prova testemunhal, ainda que mal interpretada, constituiria único meio de prova de que a Recorrente dispõe para confirmar a verdadeira jornada exercida no contrato havido entre as partes. Os seus cartões de ponto não foram colacionados aos autos por inexistentes, de acordo com a defesa da Recorrida, desrespeitando a norma cogente do art. 74, parágrafo 2º. Consolidado. Ressalte-se que, in casu, a discussão se concentra efetivamente em torno da sobrejornada, o que torna fundamental a produção da prova requerida.

5. Outrossim, a Lex Fundamentalis, em seu art. 5°, LV, assegura aos litigantes o direito ao contraditório e à ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. Dentre propalados meios está incluída a produção de provas. O indeferimento à solicitação da Recorrente de redesignação da audiência para a oitiva de testemunhas que seria essencial para esclarecer o ponto crucial sobre a existência da excessiva sobrejornada, impõe derradeira a nulidade do processado, por cerceamento de defesa.

6. Sua redesignação e consequente oitiva foi preterida acerca de adventício interpretativo cujo perfeito desenrolar do processo restou atingido. Nesse estado das coisas, a preclusão do direito da Recorrente só poderia ter sido levada a efeito quando esgotados todos os meios de prova em direito admitidos, eis que desigual a deferência do d. Juízo monocrático para com Recorrente e Recorrida. Basta a verificação as atas de fls. 58 e 87, constante dos autos, para verificação dos prejuízos exarcebados da Autora.

7. Tais motivos são nulificadores do ato em apreciação, à conta do que dispõem dispositivos legais pertinentes, com respaldo indecomponível da iterativa jurisprudência de nossos Pretórios.

8. Assim, o desacerto que contamina a decisão impugnada provém da interpretação meramente exegética, ainda que propiciada pela sempre elogiado Magistrado a quo, cujo entendimento esposado, infelizmente, incidiu em equívoco. Pelo que é a presente para requerer a reabertura da instrução processual nos autos, designado-se nova audiência, com a escorreita oitiva das partes e testemunhas, sendo declarada a nulidade de todos os atos praticados até o presente, para que seja restabelecido os elementos necessários para firmar o convencimento, bem como base legal em que se fundará novo julgamento.

9. Neste sentido é a jurisprudência de nossos Pretórios:

Cerceamento de defesa. Oitiva de testemunha. Caracteriza cerceamento de defesa a dispensa da oitiva da única testemunha do autor, presente à audiência com a finalidade de provar vínculo de emprego. (TRT/SC/RO-V 6718/99, Ac. 1720/2000, Rel. Juiz Dilnei Ângelo Biléssimo, pub. no DJ/SC de 17-02-2000)

Cerceamento de defesa. Indeferimento de prova testemunhal. Prova testemunhal pertinente à tese esposada nos autos não pode ser indeferida, sob pena de cerceio de defesa, ainda mais quando há protesto tempestivo e a sua não realização causa prejuízo à parte no julgado, mormente quando seu requerimento vem sendo realizado desde a apresentação da inicial. (Ac. 3ª T. 7386/95. Proc. TRT/SC/RO-V 1648/94. Unânime. Rel.: Juiz Gracio Ricardo Barboza Petrone. Publ. 04.10.95).

Cerceamento de defesa. Nulidade. Tendo sido oportunamente requerida pela parte a produção de prova testemunhal e havendo tempestiva insurgência contra o seu indeferimento, além de provado o prejuízo advindo do procedimento do magistrado de primeiro grau, presentes estão os requisitos elencados nos arts. 794 e 795, ambos do Texto Consolidado, ensejadores da nulidade do processado. (Ac. 1ª T. 6507/95. Proc. TRT/SC/RO-V 0785/94. Unânime. Rel.: Juiz Dilnei Ângelo Biléssimo. Publ. 01.09.95).

Cerceamento de defesa. O indeferimento do pedido de prova testemunhal necessária à demonstração da realidade fática que envolve o litígio implica cerceamento de defesa. (Ac. 2ª T. 6001/95. Proc. TRT/SC/RO-V 5518/93. Unânime. Rel.: Juiz Umberto Grillo. Publ. 23.08.95).

10. Demonstrado o repudiado e abusivo cerceamento de defesa que prejudicou a Recorrente, resta configurado o malferimento a Lei Maior, em seu artigo 5º., inciso LV, consequentemente, a nulidade do processado, devendo ser determinada a reabertura da instrução processual, pelo que a r. sentença recorrida merece reforma também neste particular.

MERITORIAMENTE

11. Na improvável hipótese de ser ultrapassada a preliminar arguida, merece ser integralmente reformada a decisão cujo emérito Julgador entendeu totalmente improcedente a ação trabalhista. Erige prudente a manifestação da Recorrente no que se remete a apreciação da Extensa Sobrejornada a que estava submetida constante nos autos, mormente por imprescindível o reexame da matéria e a aplicação da inversão do ônus probandi, vez que a Recorrida atribui horário diferente em sua peça contestatória, às fls. 91, parágrafo 8º.: “laborava das 08:30 às 17:50” e por seu preposto em audiência: “a reclamante trabalhava das 08:00 às 17/18 horas”, daquele informado na peça vestibular pela Autora, mas queda inerte quanto à sua prova sob a já derrubada alegação de cargo de confiança, por esta revelar-se em inconformidade com o rigoroso entendimento do D. Juízo de 1º. Grau e a severa construção jurisprudencial de nossas cortes judicantes em torno da hipótese dos autos, à vista das asserções aqui expostas.

12. Em proêmio, cumpre esclarecer que não era a Recorrente ocupante de cargo de confiança ou tivesse atribuições inerentes ao exercício da fidúcia. Restou descaracterizado o cargo de confiança ante a confirmação da Autora e Ré quanto ao fato da reclamante ser trainee e, vez que não detinha poder decisório isoladamente, mas dependia da palavra do gerente de setor. Ora, não bastassem as confirmações da Recorrente na peça vestibular e em audiência; da Recorrida, em sua defesa, às fls. 88 a 95; foi também a formal assertiva do preposto da Recorrida, Sr. xxxxx, senão vejamos: “que isoladamente a reclamante não podia admitir ou demitir empregados, o que podia fazer apenas com o gerente do seu setor”. (grifo nosso).

13. As formalidades legais atinentes à concreção da defesa suficiente e do contraditório no direito processual derivam do princípio do “due process of law”, de índole constitucional. O constitucionalista Delosmar Mendonça Júnior, em seu compêndio “Princípios da Ampla Defesa e do Contraditório – Ed. Atlas”, concluiu que os procedimentos são constituídos a partir do princípio da ampla defesa em razão da complexidade do direito material envolvido, sendo possível plenitude de defesa em harmonia com a efetividade do processo, permitindo o acesso à ordem jurídica justa.

14. Nesse desiderato, as garantias constitucionais de ampla defesa e do contraditório, contidas no artigo 5º., inciso LV, da Constituição Federal, são perfeitamente enquadráveis ao procedimento em voga, por expresso comando da Lei Maior.

15. Desta feita, nunca é demasiado transcrever o valor invocado, in verbis:

“LV- aos litigantes, em processo judicial ou administrativo e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. (sublinhamos).

16. Entretanto a respeitável decisão hostilizada, a despeito de sua irrepreensível fundamentação, partiu de equivocada premissa, desvencilhando-se da ordem legal inserta no Diploma Consolidado, em seu artigo 74, parágrafo 2º., além de descartar outras falhas procedimentais coligidas no procedimento impugnado, que resultaram em discrepâncias na análise da matéria de fundamental relevância, fato que teve influência preponderante no julgamento.

17. Ao descaracterizar o cargo de confiança e admitir o horário laboral diferente pela Recorrida, insigne em sua decisão às fls., o MM. Juízo a quo atraiu, de tal sorte, apreciação de mérito cujo ônus derivaria, naquela oportunidade, à Recorrida, que atribuiu efeito impeditivo das alegações da Autora, diverso daquele estatuído pelo oblívio desta, e, de per se, matéria que deveria ser objeto de prova de Reclamada, da qual não se desincumbiu. Inteligência da Súmula n. 338 do Colendo Tribunal Superior do Trabalho, verbis:

“REGISTRO DE HORÁRIO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. É ônus do empregador que conta com mais de 10 (dez) empregados o registro da jornada de trabalho na forma do art. 74, § 2o, da CLT. A não apresentação injustificada dos controles de frequência gera presunção relativa de veracidade da jornada de trabalho, a qual pode ser elidida por prova em contrário”. (negritamos)

18. Com efeito, conforme se extrai da análise dos autos, ter-se-á a pretensão da Recorrida demonstrar horário diferenciado da peça vestibular, atribuindo um efeito impeditivo e modificativo quanto ao horário quando manifesta na sua frágil alegação a liberalidade de horário e o cargo de fidúcia à Recorrente, senão vejamos:

a) Em sua defesa, às fls. 90, a partir do parágrafo 7º., abaixo transcrito, informou a Recorrida.:

“….”A Autora, como admite na exordial , exercia a função de trainee…( omissis)… . a Reclamante não era sujeita a controle de horário… (omissis)… a reclamante não ultrapassava a jornada normal de trabalho, sendo certo, que geralmente laborava das 8:30 às 17:50 com duas horas de intervalo… Em tempo, aponta-se que por todo o retro exposto, não há que se falar em juntada de controles de ponto, por inexistentes…” (sic) (negritamos).

b) Na segunda audiência realizada, quando ocorreu o comparecimento das testemunhas da Recorrida, foi a assertiva de seu preposto que pretendeu modificar o horário alegado na exordial:

“….a reclamante trabalhava das 8 às 17/18 horas…”(sic).

Traz-se à colação o entendimento esposado pelo ilustre Min. Lélio Bentes Corrêa, abaixo:

“Se o empregador apresenta os controles de horário de modo incompleto, sem qualquer justificativa para tanto, atrai a presunção de que sonegou a prova que lhe seria desfavorável. Nesta hipótese há de prevalecer a jornada declinada na exordial, no período correspondente aos meses, cujos controles restaram sonegados “. (TST ERR 700243/200, DJU de 29/08/03 – SBDI-1 Unânime).

19. De consequência, à luz da Súmula 338, tem-se que a obrigação de provar o horário tornou-se dever da Recorrida, ônus este que não logrou êxito em desincumbir, devendo ser reformada a r. sentença para deferir o labor extraordinário efetivamente prestado, reconhecendo-se como verídicos os apontamentos constantes da peça vestibular e condenando a Recorrida ao pagamento das horas extras e todos os seus reflexos, na forma do pedido inicial

20. Em consonância com o pedido no libelo da Autora, agrega-se a exegese ensinada pelo artigo 74 do Diploma Celetista, confirmado pela já suscitada Súmula 338 do TST vigente:

” o art. 74, § 2o, da CLT, que atribui ao empregador que conte com mais de dez empregados a obrigatoriedade de manter controle de horários de seus trabalhadores:

a) possui natureza jurídica processual atinente à prova, uma vez que fixa ônus sob o aspecto subjetivo. Vale dizer: orienta a atividade a ser desenvolvida pela parte;

b) impõe ao empregador o ônus da prova da jornada de trabalho. A prova, no caso, é pré-constituída e obrigatória. Vale dizer, a única prova admitida do empregador será a prova documental, uma vez que dele é o dever de manter, fiscalizar, conservar e ter sob sua posse e vigilância os controles de horários de seus trabalhadores.

21. Revela-se, pois, inviável, interpretar de outro modo o disposto no preceito legal inserto no artigo 74 e seus parágrafos, entendendo-se como um comando de natureza meramente administrativa. À luz de uma exegese mais alinhada com os princípios gerais e específicos do Direito do Trabalho, especialmente o da proteção, não há como deixar de conferir caráter processual à regra, de onde deriva toda a implicação na distribuição do ônus probatório.

22. Sendo ônus do empregador a prova da jornada de trabalho e, tratando-se de prova pré-constituída obrigatória, presumir-se-á a veracidade da jornada de trabalho alegada na petição inicial diante de:

a) da inexistência injustificada (ausência de caso fortuito ou força maior) dos controles de jornada;

b) da existência de documento inidôneo como, v.g. com registro de horários invariáveis.

23. Nesse sentido foi conclusão unânime da SBDI-1 no recurso de ERR-416053/1998 (17-10-2003). Segundo o Relator, Min. João Oreste Dalazen, “o registro de ponto constitui prova obrigatória na legislação brasileira para o empregador com mais de dez empregados. Sonega essa prova substancial ao julgamento da lide o empregador que deixa de exibir em Juízo o controle por escrito do horário de trabalho, ou (…) o exibe, mas, inequivocamente, os documentos não espelham a realidade fática. Em um e em outro caso, descumpre o empregador a lei e daí emana a presunção comum favorável ao alegado pelo empregado”.

24. Sendo os registros de horários prova pré-constituída obrigatória, cumpre ao empregador voluntariamente, ou seja, independentemente de determinação judicial (CPC, art. 359), exibi-la nos autos, sob cominação de se presumirem verdadeiras as afirmações do autor.

Têm sido o entendimento esposado em nosso Colendo Tribunal Superior do Trabalho:

“Quando a reclamada aponta, na defesa, jornada diversa da inicial, atrai para si o ônus da contraprova, na medida em que sua afirmação tem nítida natureza de fato impeditivo. A juntada dos controles de jornada, portanto, tornam-se imprescindível, independente de determinação judicial.” (SBDI – 1 E RR 493559/1998 , IN DJU de 15/08/03, Rel. Min. Milton de Moura França)

25. A apresentação de registros de horário que não abrangem todo o período contratual, com falhas na anotação (como, v.g., sem a assinatura do empregado) ou a sua simples supressão, gera presunção de veracidade das afirmações da Autora, ora Recorrente.

26. Mas não é só. A presunção de veracidade que emerge no caso em comento é juris tantum, admitindo prova em contrário. Essa prova, entretanto, já deveria ter sido produzida nos autos… Entretanto, entendeu por bem a Recorrida por não fazê-la.

27. Logo, vislumbrar-se-á a existência de inversão de ônus probandi para condenar a Recorrida ao pagamento do labor extraordinário alegado na peça vestibular, certamente, ensejará a eficácia da atual legislação, mormente, o artigo 74 e seus parágrafos, bem como a Súmula 338 do Tribunal Superior do Trabalho, que amplamente rechaça a r. sentença prolatada pelo não menos I. Juízo monocrático.

28. Embora o MM. Juízo prescinda de maiores oblações, remanescentes aqui os princípios iuria novit cúria e acessorium sui principales naturam sequitor.

29. Em síntese, traduz-se em medida essencial destacar tópico impeditivo aventado na defesa da Recorrida, fato este imprescindível para reexame da matéria cuja inserção se fez declinável na quaestio jurídica que ensejou a propositura da ação originária, e reformando r. decisum em comento, para colacionar à Recorrente a inesgotável justiça que emana nas nossas cortes trabalhistas, devendo, neste particular e de forma incontornável, ser reformada.

30. Pelo exposto, espera e confia a RECORRENTE seja conhecido e provido o presente apelo para o fim de ser acolhida a matéria preliminar arguida ou, uma vez superada, para ser reformada a r. sentença recorrida e julgada totalmente procedente a ação, sem prejuízo do reconhecimento da procedência das horas extras, seus reflexos e suas integrações decorrentes, atualização monetária e a responsabilização da demandada ao recolhimento integral da contribuição previdenciária e do imposto de renda e, por tudo mais que dos autos consta, requer o conhecimento e provimento do presente Recurso, para reformar in totum a sentença de 1ª instância, condenando a Recorrida ao seu escorreito pagamento, por ser de Direito.

Nestes Termos
Pede deferimento.
São Paulo, .

 

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