Durante a análise de um Habeas Corpus (HC 106139), a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) anulou decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) – em um recurso especial – a fim de que outro julgamento seja realizado com a atuação da Defensoria Pública da União (DPU). A votação ficou empatada, portanto permaneceu a decisão mais favorável ao réu que, no caso, foi a de que seja realizado novo exame da questão pelo STJ.
O HC foi impetrado no Supremo pela Defensoria Pública da União em defesa de A.P.M. contra decisão do STJ desfavorável ao acusado e já transitada em julgado (sem possibilidade de recurso). A DPU alega contrariedade ao artigo 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal, argumentando que ela [a Defensoria] foi intimada para atuar na defesa de A.P.M. em um recurso especial interposto pelo Ministério Público mineiro no STJ, mas que não conseguiu acessar o conteúdo dos autos virtuais porque o recurso tramitava em segredo de justiça.
O Caso
Com base em informações prestadas nos autos, a relatora da matéria, ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, informou que a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais era responsável, inicialmente, pela defesa do acusado. O recurso especial foi incluído na pauta de julgamento do STJ em 24 de agosto de 2010 e a Defensoria Pública da União intimada no dia 19 de agosto de 2010 a fim de que passasse a atuar no processo.
Conforme o relatório, a matéria foi julgada pelo STJ em 26 de agosto de 2010 e somente no dia 31 de agosto, a Defensoria Pública da União protocolou uma petição afirmando que não conseguiu acessar os autos em razão do segredo de justiça. Tal fato não permitiu que a DPU visualizasse o conteúdo dos autos, motivo pelo qual requereu a atualização dos dados do processo.
Até então, a Defensoria Pública mineira fazia o acompanhamento do processo e tinha acesso aos autos virtuais, que tramitavam em segredo de justiça. Em 16 de setembro de 2010, ou seja, 20 dias após o julgamento, que a solicitação da DPU foi atendida, passando a constar na autuação dos autos a informação de que o recorrido A.P.M. era assistido a partir daquele momento por um defensor público da União.
O Superior Tribunal de Justiça esclareceu que a alteração é feita exclusivamente quando há solicitação da Defensoria Pública da União com posterior deliberação por meio de análise de questão de ordem. No dia 27 de setembro de 2010, foi publicado o acórdão no Diário de Justiça eletrônico, sendo encaminhado à DPU o mandado de intimação para a citação. Após o prazo, sem qualquer manifestação, houve o trânsito em julgado do processo
Voto
A ministra Cármen Lúcia votou no sentido de denegar a ordem. Para ela, “a defesa do ora paciente não esteve impossibilitada de ter acesso aos autos virtuais do recurso especial porque o paciente vinha sendo assistido pela Defensoria Pública de Minas Gerais, que tinha acesso aos autos, durante todo o tempo até o julgamento”.
Segundo a relatora, a Defensoria Pública da União se manifestou tardiamente no sentido de ela também ter acesso aos autos junto com a Defensoria Pública mineira. “Ademais, ela foi intimada do acórdão proferido no julgamento do recurso especial e, tendo acesso aos autos virtuais, não interpôs recurso antes do trânsito”, disse a ministra, ao ressaltar que o trânsito em julgado ocorreu em 5 de novembro de 2010 e, desde o dia 16 de setembro de 2010, a DPU “tinha pleno acesso a todos os documentos virtuais”.
“Portanto, a impetrante teve a oportunidade de comparecer ao julgamento no recurso especial, de manifestar-se em defesa do ora paciente, de insurgir-se posteriormente contra o resultado e preferiu não fazê-lo, motivo pelo qual não há que se falar em contrariedade ao artigo 5º, incisos LIV e LV da CF”, entendeu a relatora. O ministro Ricardo Lewandowski também votou nesse sentido.
Divergência
Divergiram os ministros Marco Aurélio e Luiz Fux, ao concederem a ordem. “Ocorreu uma corrida de revezamento. A proteção passou a ser implementada pela Defensoria Pública da União, tanto assim que ela foi intimada para a ciência da data do julgamento do recurso e não teve acesso porque o processo corria em segredo de justiça, o que foi certificado pela Secretaria do STJ”, salientou o ministro Marco Aurélio.
“A meu ver, existe o vício porque ficou a Defensoria Pública da União que patrocinava os interesses da parte junto ao Superior Tribunal de Justiça, impossibilitado de ter acesso aos dados do processo que não se mostrou um processo físico, mas sim eletrônico”, afirmou. Conforme ele, “dizer-se, a esta altura, que houve o trânsito em julgado é, a meu ver, amesquinhar a ação constitucional, que é a ação do habeas corpus. Essa ação não sofre as peias da coisa julgada”.
“Ter sido intimada da sessão de julgamento e não ter acesso aos autos para preparar uma sustentação e nada é a mesma coisa”, avaliou o ministro Luiz Fux.