por Lilian Matsuura
Quatro ministros do Supremo Tribunal Federal entenderam que é constitucional o artigo da Lei de Biossegurança (Lei 11.105/05) que autoriza o uso células tronco embrionárias em pesquisas científicas. Os outros quatro que votaram fizeram inúmeras ressalvas quanto a possibilidade das pesquisas científicas. A sessão no plenário do Supremo deve ser retomada às 14 horas desta quinta-feira (29/5) para receber os votos dos ministros Marco Aurélio, Celso de Mello e do presidente Gilmar Mendes.
“Proibir a pesquisa é fechar os olhos para o desenvolvimento científico”, afirmou o ministro Joaquim Barbosa, ao se aliar ao grupo de integrantes da Corte que votaram pela constitucionalidade da lei, sem restrições (Carlos Britto, Ellen Gracie e Cármen Lúcia). Não cabe ao Estado, segundo ele, decidir os rumos da vida. “Cada indivíduo tem os seus sentimentos, valores, religião e entende da sua forma a origem da vida”, disse ao lembrar da laicidade do Estado brasileiro. O ministro ressaltou, entretanto, que o legislador tem de estabelecer parâmetros para as pesquisas e criar órgãos de fiscalização.
Nos votos emitidos nesta quarta-feira, ficou clara a tendência dos ministros em aperfeiçoar a legislação em julgamento. Os quatro ministros que impuseram restrições ao uso das células embrionárias em pesquisas, na verdade fizeram uma proposta de regulamentação do artigo da lei em discussão.
Ao longo de seu voto, Joaquim Barbosa fez uma comparação entre a legislação brasileira e a de países como Inglaterra, Bélgica e França, que já permitem as pesquisas. Em todas elas identificou três pontos em comum: as pesquisas têm de visar o bem comum através de tratamentos; só podem ser feitas com embriões criados com a fertilização in vitro; devem contar com o consentimento expresso dos genitores. “A legislação brasileira segue critérios mínimos”, concluiu.
Joaquim Barbosa entende que se as pesquisas forem proibidas, num futuro próximo, o país terá diante de si outra questão complicada. Decidir se permitirá ou não tratamentos criados a partir de pesquisas desenvolvidas em país que autorizam o uso de células-tronco embrionárias.
Cezar Peluso, que também votou na tarde desta quarta-feira (28/5), votou pela improcedência da ação direta de inconstitucionalidade, mas fez diversas ressalvas à possibilidade de pesquisas. Para ele, a vida é uma sucessão de mudanças, um processo contínuo. E a fertilização em laboratório não é nada por si só. Se o embrião não for colocado em um útero não haverá transformação, portanto, vida.
“A potencialidade do zigoto de criar um ciclo vital não basta para se identificar como uma vida ou reivindicar a aplicação do Estatuto Ético da vida”, disse. Peluso acrescentou: “é difícil dizer que um óvulo ou um espermatozóide têm capacidade, por si só, de criar uma vida”.
O ministro enfatizou o seu entendimento de que não há vida sem a capacidade de se mover por si mesmo ou desenvolver com autonomia o ciclo da vida. Para ilustrar, ele colocou duas hipóteses. Perguntou: “se um laboratório está pegando fogo e há uma criança de cinco anos e dois embriões, quem você salva?. E depois, se no laboratório que pega fogo há um adulto de 25 anos e uma criança de cinco, quem você salva? “Entre um adulto e uma criança a decisão não é tão óbvia”, disse.
Mas ressaltou que é imprescindível que os genitores autorizem o uso das células para pesquisas. “Não se encontra fundamento algum para tirar do casal o direito sobre os embriões.” Com a doação, eles perdem o poder jurídico sobre eles, entende. Além disso, Cezar Peluso fez a ressalva de que as células-tronco não podem ser usadas para nenhuma experiência eugênica. “Jamais podem ser usadas para sondagem ou manipulação genética.”
Por fim, defende que o uso de células embrionárias seja restrito a pesquisas para desenvolvimento de tratamentos.
Até esta quarta-feira (28/5) oito ministros votaram no julgamento da Ação Direita de Constitucionalidade 3.510, proposta pelo ex-procurador-geral da República Claudio Fonteles. Carlos Britto (relator), Ellen Gracie, Cármen Lúcia e Joaquim Barbosa votaram pela improcedência da ADI. Ricardo Lewandowski e Menezes Direito julgaram procedente a ação, com ressalvas. Eros Grau e Cezar Peluso concluíram pela improcedência da ADI, com ressalvas.
Na quinta-feira (29/5), Marco Aurélio, Celso de Mello e Gilmar Mendes apresentam os seus votos. A partir daí, o Plenário do Supremo Tribunal Federal passará a discutir as ressalvas impostas pelos ministros. O ministro Celso de Mello, em comentários no próprio plenário do Supremo, já deu a entender que deve votar a favor da constitucionalidade das pesquisas.
Revista Consultor Jurídico