por Fernando Porfírio
O Tribunal de Justiça de São Paulo suspendeu o sigilo da investigação que envolve o delegado Pedro Luiz Pórrio. E ainda: mandou a Polícia e o Ministério Público abrirem à defesa os dados do inquérito policial. A investigação envolve Pórrio e outros dois delegados, além de quatro investigadores, acusados de extorquir US$ 800 mil do megatraficante colombiano Juan Carlos Ramírez Abadía.
A 15ª Câmara Criminal entendeu que a decisão da juíza do Departamento de Inquéritos Policiais (Dipo), que impediu a extração de cópias e vistas do advogado, afronta os princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório.
“Vigora no país o estado democrático de direito”, lembrou o desembargador Ribeiro dos Santos, relator do mandado de segurança impetrado pelos advogados Hélio Bialski e Daniel Leon Bialski. “Impossível um advogado prestar a defesa ou orientação de alguém sem nada saber, pois lhe é vedado conhecer o que está sendo apurado”, reconheceu o relator.
Para a turma julgadora, é exatamente o contrário o que se espera da investigação: a segurança que alicerça o processo penal é a garantia de um julgamento pautado pela isonomia, Justiça e pela defesa do acusado. O Tribunal de Justiça reconheceu como acertado o receio do delegado Pedro Luiz Pórrio de ser ouvido na investigação sem a presença de seu advogado, com conhecimento do inquérito policial.
O inquérito policial, instaurado pela 2ª Delegacia de Crimes Funcionais da Corregedoria Geral da Polícia Civil, apura a prática do crime de formação de quadrilha e concussão (extorsão cometida por funcionário público).
Em janeiro, promotores de Justiça do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), convocaram o delegado Pórrio para prestar depoimento na instituição. O fundamento para a convocação sem que a defesa tivesse conhecimento do inquérito foi o de que o interesse do Estado de sobrepõe ao do particular.
O Dipo alega que como não se conhece os suspeitos da investigação, o delegado foi chamado prestar declarações. A linha da investigação é a de que os envolvidos teriam recebido dinheiro de Abadia para o resgate de pessoas de seu grupo que teriam sido seqüestrados por policiais e cujo suposto cativeiro seria a sede do Denarc.
“Os tempos mudaram. Se estivesse vivendo há algumas décadas, nem se poderia pensar na solução encontrada. Os comandos vinham de uma ‘entidade’ fardada que proibia quase tudo, em amplitude de defesa nem se podia falar”, afirmou o desembargador Pedro Gagliardi, lembrando que não estamos mais vivendo os tempos da ditadura militar.
“Hoje se fala em ampla defesa, consagra-se a regra do contraditório, e louvam-se as garantias constitucionais”, completou Pedro Gagliardi. Ele apontou que o direito é uma ciência e que a imutabilidade é das religiões e não dos juristas. “Estamos no Brasil de 2008. Só vale o resultado se o método usado para obtê-lo for legal”, afirmou.
A mesma linha de argumento foi trilhada pelo desembargador Roberto Mortari. “É preciso colocar de lado a argumentação hipócrita, e reconhecer que o sigilo absoluto, irrestrito, incondicionado, só se prestou até hoje para gerar situações de abuso e aviltamento aos direitos fundamentais do indivíduo, o que atenta contra o estado democrático de direito”, afirmou Mortari.
O inquérito tem como base grampos da Polícia Federal em outra investigação — a do traficante colombiano Juan Carlos Ramírez Abadía. De acordo com o inquérito, Pórrio e seus colegas teriam cobrado dinheiro do megatraficante. As fitas gravadas pela PF foram repassadas à Corregedoria da Polícia Civil e ao Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaerco).
Revista Consultor Jurídico