Advogado é condenado por ofender juiz

O conceito de que o advogado tem imunidade profissional para dizer o que bem entender nas peças processuais não é tão indiscutível assim, pelo menos na opinião do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal. Em duas ações, ele negou pedidos de advogados que recorreram à corte contra condenações por ofensas feitas a juízes nos autos.

“As expressões então utilizadas pelo recorrente, no sentido de que o recorrido teria cometido erros de forma proposital, com o único objetivo de favorecer o executado e que ‘com certeza o Dr. Juiz está atendendo pedido do executado ou de pessoas influentes’ em nada se referem ao objetivo da petição então lançada nos autos, e certamente refogem ao âmbito do razoável e do limite do direito de crítica a uma decisão judicial, para assacar graves acusações contra a pessoa do magistrado, no sentido de que favoreceria deliberadamente uma das partes do processo, certamente a pedido de pessoas influentes”, disse o ministro ao negar provimento ao Recurso Extraordinário do advogado Amarílio de Aquino Malaquias, no último dia 4 de setembro.

Em 2001, o advogado foi condenado pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro a indenizar em 200 salários mínimos, por danos morais, o juiz Carlos André Lahmeyer Duval, que dirigia um processo patrocinado pelo advogado. Segundo a corte, o advogado ofendeu a honra do juiz em menções feitas em pedido de Exceção de Suspeição ajuizado no TJ, quando o advogado patrocinava uma ação em favor do Banco de Brasília.

Segundo o juiz, o advogado lhe atribuiu conduta criminosa, ao insinuar que ele agiu com interesse pessoal ao despachar uma carta precatória. O crime está previsto no artigo 319 do Código Penal. O Banco de Brasília, incluído no polo passivo da ação de indenização, alegou não ter legitimidade para responder pela conduta do advogado, e conseguiu sair da briga. Já Malaquias, não.

Na decisão, Dias Toffoli lançou mão de uma decisão recente do Supremo sobre o tema. “A imunidade profissional do advogado não compreende o desacato, pois conflita com a autoridade do magistrado na condução da atividade jurisdicional”, diz acórdão da Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.127, publicado no dia 11 de junho, relatado pelo ministro Ricardo Lewandowski. “A imunidade profissional, garantida ao advogado, quer pela norma do artigo 133 da Constituição Federal, quer pelo disposto no parágrafo 2º do artigo 7º do Estatuto da Advocacia, não abrange os ilícitos civis decorrentes dos excessos cometidos pelo profissional em afronta à honra de quaisquer das pessoas envolvidas no processo”, disse ele ao rejeitar o recurso.

Em outro processo, julgado no dia 17 de agosto, o ministro negou liminar em pedido de Habeas Corpus feito pelo advogado paulista Marcos Alves Pintar. Ele pedia o arquivamento da Ação Penal a que responde por difamação contra uma juíza da Comarca de Nova Granada (SP). Para Pintar, os fatos dos quais é acusado estão cobertos pela imunidade profissional do advogado no exercício de suas atividades. O HC já havia sido negado pelo Superior Tribunal de Justiça.

Nessa decisão, Toffoli já deixava clara sua posição: “o Supremo Tribunal Federal já fixou o entendimento de que não é absoluta a inviolabilidade do advogado, por seus atos e manifestações, o que não infirma a abrangência que a Magna Carta conferiu ao instituto, de cujo manto protetor somente se excluem atos, gestos ou palavras que manifestamente desbordem do exercício da profissão, como a agressão (física ou moral), o insulto pessoal e a humilhação pública”. Ele negou a liminar alegando que o pedido esvaziaria o mérito da ação, para o que seria necessário um exame mais aprofundado do caso.

Recurso Extraordinário 503.370/RJ
HC 105.134/SP

Leia a decisão no pedido de liminar.

Vistos.

Habeas corpus , com pedido de liminar, impetrado em causa própria pelo advogado Marcos Alves Pintar, a quem se imputa a prática de crime de difamação praticado contra Magistrada da Comarca de Nova Granada/SP.

Aponta como autoridade coatora o Ministro Arnaldo Esteves Lima , do Superior Tribunal de Justiça, que denegou a medida liminar no HC nº 119.510/SP, impetrado àquela Corte.

Sustenta o impetrante, em síntese, o constrangimento ilegal a que se encontra submetido, falecendo justa causa à ação penal instaurada contra o paciente.

Aduz, ainda, a ocorrência da prescrição antecipada do delito, em vista da pena que em perspectiva possa vir a ser aplicada; decadência do direito de representação e imunidade profissional do advogado no exercício de suas atividades.

No mais, afirma que o caso concreto autoriza o afastamento do enunciado da Súmula nº 691 desta Suprema Corte.

Requer, liminarmente, seja ordenada a suspensão da ação penal em trâmite contra sua pessoa perante a Comarca de Nova Granada/SP e, no mérito, seja concedida em definitivo ordem, para o trancamento da causa.

Examinados os autos, decido.

A concessão de liminar em habeas corpus , como se sabe, é medida de caráter excepcional, cabível apenas se a decisão impugnada estiver eivada de ilegalidade flagrante, demonstrada de plano.

Pelo que se tem na decisão proferida pelo Ministro Arnaldo Esteves Lima , da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, não se vislumbra, neste primeiro exame, nenhuma ilegalidade, abuso de poder ou teratologia que justifique o deferimento da liminar.

Ademais, as razões invocadas pelo impetrante para o deferimento da medida excepcional possuem caráter satisfativo, pois se confundem com o mérito da impetração, o que recomenda seu indeferimento conforme reiterada jurisprudência desta Suprema Corte. Nesse sentido: HC nº 94.888/SP-MC, Relator o Ministro Menezes Direito , DJ de 12/6/08; HC nº 93.164/SP-MC, Relator o Ministro Cezar Peluso , DJ de 22/2/08; HC nº 92.737/SP-MC, Relatora a Ministra Cármen Lúcia , DJ de 29/10/07; e HC nº 85.269/RJ-MC, Relator o Ministro Eros Grau, DJ de 2/2/05, entre outros.

Avento, ainda, que esta Suprema Corte já pacificou entendimento no sentido de que o trancamento da ação penal por ausência de justa causa em sede de habeas corpus é medida excepcional, justificando-se apenas quando despontar, fora de dúvida, atipicidade da conduta, causa extintiva da punibilidade ou ausência de indícios de autoria, o que não é possível aferir em análise perfunctória dos fatos nesta fase embrionária da impetração.

De outra sorte, igualmente ressalto que o Supremo Tribunal Federal já fixou o entendimento de que não é absoluta a inviolabilidade do advogado , por seus atos e manifestações, o que não infirma a abrangência que a Magna Carta conferiu ao instituto, de cujo manto protetor somente se excluem atos, gestos ou palavras que manifestamente desbordem do exercício da profissão, como a agressão (física ou moral), o insulto pessoal e a humilhação pública a proclamada imunidade profissional do advogado não é absoluta (HC nº 69.085/RJ, Primeira Turma, da relatoria do Min. Celso de Mello , DJ 26/3/1993; HC nº 80.881, Rel. Min. Maurício Correa , DJ de 24/8/01; HC nº 84.795, Rel. Min. Gilmar Mendes , DJ de 17/12/04; HC nº 84.389, Rel. Min. Carlos Velloso , DJ de 30/4/04; HC nº 75.783, Rel. Min. Octávio Gallotti , DJ de 12/3/99; AI nº 153.311, Rel. Min. Francisco Rezek , DJ de 16/9/93; RHC nº 69.619, Rel. Min. Carlos Velloso , DJ de 20/8/93 e HC nº 69.366, Rel. Néri da Silveira, DJ de 12/3/93).

Com essas considerações, não tendo, no momento, como configurado constrangimento ilegal passível de ser afastado mediante o deferimento da liminar ora pretendida, indefiro-a.

Solicitem-se as informações da autoridade apontada como coatora.

Oficie-se, ainda, ao Juizado Especial Criminal da Comarca de Nova Granada/SP, solicitando informações atualizadas sobre a situação processual da ação penal instaurada contra o paciente.

Após, vista ao Ministério Público Federal.

Publique-se.

Brasília, 17 de agosto de 2010.
Ministro Dias Toffoli, Relator .

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.


Você está prestes a ser direcionado à página
Deseja realmente prosseguir?
Atendimento