A relação jurídica mantida entre os conselhos regionais de fiscalização profissional e seus empregados é tipicamente celetista, cabendo à Justiça do Trabalho julgar controvérsias decorrentes desse vínculo. Com esse entendimento, a 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT/MT) manteve sentença da 9ª Vara do Trabalho de Cuiabá que analisou processo ajuizado por um ex-assessor do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA/MT).
A decisão se deu em recurso interposto pela entidade, por meio da qual reiterou a alegação da incompetência da Justiça do Trabalho para tratar da questão, como havia argumentado na vara trabalhista.
Conforme insistiu no pedido ao Tribunal, os conselhos regionais de fiscalização possuem natureza jurídica de autarquia federal, com personalidade jurídica de direito público, de forma que estariam submetidos ao regime jurídico administrativo, o que atrairia a competência da Justiça Federal Comum.
O argumento, entretanto, não convenceu o relator do recurso no TRT, desembargador Tarcísio Valente, que já de início apontou o fato de que o ex-assessor executivo formulou seus pedidos em uma suposta relação de emprego que entendia existir entre ele e o CREA. Desse modo, somente em razão da natureza dos pedidos formulados já estaria definida a competência da Justiça do Trabalho, a quem cabe declarar a existência ou não da relação de emprego, conforme estabelece o artigo 114 da Constituição Federal.
Além disso, como ressaltou o relator, o entendimento pacífico do Tribunal Superior do Trabalho (TST) é o de que os conselhos regionais são autarquias atípicas, porque se mantém com recursos exclusivamente de seus associados, portanto da esfera privada. Assim, a relação que essas entidades mantêm com seus funcionários não é de cunho administrativo e sim do regime jurídico celetista.
No mesmo sentido, o desembargador-relator concluiu que não se aplica ao caso o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário 573202, contrariando a argumentação do CREA. Ao recorrer, o Conselho sustentou que, com a decisão do Supremo, foram suspensos os efeitos do caput do artigo 39 da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional 19/1998. Dessa maneira, e tendo em conta que o ex-assessor foi admitido após a decisão do STF, deveria ser aplicado o dispositivo em sua redação anterior, segundo o qual “A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas”.
Mas a conclusão do julgado do Supremo não cabe à questão do ex-empregado do CREA, esclareceu o desembargador, pois é específico para a hipótese de “contratação temporária regida por legislação local anterior à Constituição de 1988”, o que não é o caso.
O relator prosseguiu explicando que, por se tratar de uma entidade com natureza jurídica de autarquia atípica, não incide a regra do artigo 39 da Constituição Federal, que se aplica às autarquias propriamente ditas. Por essa razão, afirmou ser “infértil a discussão acerca da ADI 2135-DF do Supremo Tribunal Federal quanto ao dispositivo constitucional em questão” e, da mesma forma, não cabe à hipótese o julgado proferido na Reclamação 5381-4, também do STF, “porque se refere à competência referente às causas decorrentes de vínculo jurídico administrativo com o Poder Público, o que não é o caso”.
Ao final, reconheceu a competência da Justiça do Trabalho, mantendo a decisão da 9ª Vara de Cuiabá, ainda que sob outro fundamento. Na sentença, a competência foi declarada com base no fato do ex-assessor ter ocupado cargo em comissão regido pela CLT. No Tribunal, entretanto, o entendimento foi o de que isso não afeta a delimitação da competência, porque não altera a natureza jurídica da relação entre o conselho fiscalizador e seu funcionário, que foi de relação de emprego, com a consequente aplicação do artigo 114 da Constituição Federal.
Ao final do julgamento, a 1ª Turma manteve também a condenação ao CREA do pagamento de horas extras, intervalos e recolhimento de FGTS ao ex-assessor. Acrescentou, entretanto, a condenação do Conselho em fazer a anotação na Carteira de Trabalho de todo o período trabalhado, uma vez reconhecida a natureza celetista da relação, independentemente do fato do ex-empregado ter ocupado cargo em comissão.
Processo: (PJe) 0000714-73.2017.5.23.0009
Fonte: TRT/MT