Uma disputa entre os cartórios e os incorporadores imobiliários deve chegar em breve ao Supremo Tribunal Federal (STF). Em assembleia em Camboriú (SC), a Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg-BR) decidiu entrar com um mandado de segurança contra um procedimento de controle administrativo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que impede a cobrança de múltiplos registros para imóveis parcelados em lotes ou apartamentos.
“Entendemos que o CNJ extrapolou suas funções, ao interferir em um tema de natureza legislativa”, diz Francisco Rezende, diretor da Anoreg-BR para a área de registros de imóveis. A ação deverá ser ajuizada pelo advogado Frederico Viegas, de Brasília. A polêmica começou com a lei que instituiu o programa “Minha Casa, Minha Vida” – Lei nº 11.977, de 2009. Antes, não havia uma regra única para todos os Estados sobre a cobrança de registros. A norma mudou o artigo 237-A da Lei nº 6.015, de 1973, e determinou que os registros por parte dos incorporadores “serão considerados como ato de registro único, não importando a quantidade de unidades autônomas envolvidas ou de atos intermediários existentes”.
Os cartórios do Rio de Janeiro tentaram manter a cobrança de múltiplos registros, alegando que a mudança na lei de 1973 só valeria para os imóveis construídos dentro do programa habitacional do governo. Mas no último dia 20 de março, motivada por um pedido do Sindicato da Indústria da Construção do Rio de Janeiro (Sinduscon-RJ), a ministra Eliana Calmon, corregedora nacional de Justiça, decidiu que a alteração “trata de norma de direito registral geral, não restrito ao âmbito do programa Minha Casa, Minha Vida” e recomendou a adoção deste entendimento por todos os tribunais de justiça estaduais.
Em seu voto, a ministra afirma que a lei que criou o programa habitacional trata de diversos temas, indo além da questão do subsídio para a construção de casas populares. “Não se mostra correta a interpretação calcada unicamente no elemento literal”, diz Eliana Calmon. “Deve-se interpretar o sistema como um todo e assim evitar contradições, inclusive a maior delas, que vem a agredir o texto constitucional.” Segundo a ministra, a intenção da lei estava clara na exposição de motivos encaminhada pelo governo, em que se afirma “o propósito de tornar homogêneo o sistema de cobrança de registros efetuados nas matrículas de empreendimentos imobiliários”.
“A cobrança de registros individualizados por imóvel parcelado traz um impacto de 2% a 5% no preço final. Não faz sentido criar este custo para um mercado que já está com preços em elevação em todos os seus insumos e serviços”, afirma o presidente do Sinduscon-MG, Luiz Fernando Pires. “É um cálculo absolutamente exagerado. O impacto é da ordem de 0,4%”, contesta Rezende.
O valor do registro varia percentualmente conforme o preço do imóvel. Atualmente, um empreendedor pode hipotecar parte de um lançamento para obter financiamento para sua construção, fazendo um registro único, não importando se a propriedade terá uma ou mil unidades autônomas. Se os cartórios conseguirem mudar o entendimento legal, para dar parte do empreendimento em garantia para financiamento, o empreendedor teria que fazer registro lote por lote, ou apartamento por apartamento.