por Fernando Rizzolo
O conceito de soberania entre os romanos, classificada como suprema potestas, era o poder supremo do Estado na ordem política e administrativa. Posteriormente, passaram a denominá-lo poder de imperium, com amplitude internacional. Historicamente, é bastante variável a formulação do conceito de soberania, no tempo e no espaço.
No Estado grego antigo, como se nota na obra de Aristóteles, falava-se em autarquia, significando um poder moral e econômico, de auto-suficiência do Estado. Já entre os romanos, o poder de imperium era um poder político transcendente que se refletia na majestade imperial incontrastável, e talvez seja aí, durante o império romano que a essência do conceito territorial soberano se expandiu.
O que observamos hoje, contudo, é que existe um viés conceitual do espaço soberano de um país, que é legitimado pelo livre espaço de atuação dos grupos que se diferem ideologicamente num mesmo território, ou em territórios onde deveriam “a priori” ser respeitado o nobre conceito. Porém até onde grupos guerrilheiros têm legitimidade para sua atuação? Os EUA no decorrer dos últimos anos têm tido uma posição de questionamento do conceito de soberania face à sua “guerra contra o terrorismo”; muito mais uma política republicana do que propriamente americana em si, contudo, vale uma reflexão ao analisarmos até que ponto a disseminação desse conceito não acaba sendo abarcado por outros países como o que ocorreu na Colômbia.
A grande questão é que, se existe um grupo guerrilheiro entendendo apenas que seus objetivos devam se alcançados através de expedientes espúrios, teriam eles legitimidade para existirem? Não estariam eles nos norteando e nos legitimando a atacá-los aonde quer que estejam? O mais interessante dessa questão é que do ponto de vista dos guerrilheiros o inverso do conceito é o mesmo. Assim sendo, teríamos que lançar uso de um fator preponderante maior, que daria base as investidas dessa natureza, e aí, nos esbarramos no que é ético, aceitável, e humano para uma sociedade.
As Farc há muito deixaram de exercer uma trajetória de cunho marxista num plano estratégico de poder. Tornaram-se um grupo isolado, perverso, e comercial, baseando suas atividades do narcotráfico, no seqüestro, e na intimidação que são práticas abomináveis. Ora, nesse contexto acredito que a soberania relativa poderia se assemelhar a uma figura penal jurídica de “estado de necessidade”, ou como na persecução, um “estado de flagrância”. Não há como convivermos com grupos terroristas, e a compreensão de agressão de um Estado a outro, deve ser minimizada face à ideologia e ética de grupos violentos que oferecem perigo à sociedade.
Não estou com isso aprovando a incursão da Colômbia ao Equador, mas de certa forma, entendendo como legítima em casos extremos uma reavaliação desse aspecto da soberania, até porque, temos que levar em consideração o fato do aumento do radicalismo quer religioso, quer oportunista ou terrorista, como no caso das Farc e do fundamentalismo islâmico.
O presidente Correa, do Equador, sabia que esse grupo permeava seu território, até porque, guerrilheiros se sentiam seguros por lá. Isso é ético? Com certeza não é, da mesma forma que atravessar a fronteira para atingir um desiderato bélico, como assim fez a Colômbia. Mas o que é pior à sociedade? A soberania relativa deve ser analisada com profunda reflexão e os Estados devem analisar caso a caso, sem maiores paixões bélicas ou nacionalistas, e com maior visão de proteção à sociedade das atividades de grupos desestabilizadores da democracia.
Revista Consultor Jurídico