Competência para indiciar – Polícia não precisa da anuência do STF para investigar

por Rafael Andreata

A autoridade policial, que tiver ciência da prática de uma infração penal sujeita à Ação Penal Pública incondicionada, tem o dever de instaurar inquérito policial de ofício e dar início às investigações em face do princípio da obrigatoriedade a que está submetida.

Claro que há exceções ao dever de instaurar o procedimento administrativo intitulado inquérito policial, entre elas:

a) extinção da punibilidade pela prescrição ou outro meio;

b) causa de escusa absolutória;

c) quando o fato criminoso for cometido por juiz ou membro do MP, já que, surgindo notícias da participação desses agentes políticos, compete ao Tribunal ou ao Procurador Geral proceder às investigações conforme às respectivas Leis Orgânicas.

Não nos parece razoável condicionar ao Supremo Tribunal Federal a instauração de inquérito policial relativo aos crimes cometidos por membros do Congresso Nacional e outras autoridades. Não há na Constituição Federal, nem na lei processual penal, nenhum dispositivo que vede à polícia judiciária dar início às investigações sem a anuência de um ministro relator do STF, diferentemente, como já dito, do caso de juízes e promotores que, de acordo com suas leis de regência, não podem ser indiciados em inquérito policial. E não iremos entrar no mérito sobre se tais leis complementares foram ou não recepcionadas pela nova ordem constitucional.

Parece-nos que, com a nova decisão do Plenário do , foi criada outra imunidade formal aos membros do Congresso Nacional e a autoridades detentoras de foro especial por prerrogativa de função.

Se não se pode mais indiciar o parlamentar sem a anuência do STF, como proceder à lavratura de um auto de prisão em flagrante em caso de crime inafiançável contra uma dessas autoridades? O indiciamento, a nosso ver, é conseqüência natural da prisão em flagrante.

O acórdão, em questão, suprimiu da esfera de atribuições do delegado de Polícia Judiciária o indiciamento criminal, transferindo-o ao procurador geral. Outra aberração, já que este ato era de exclusividade da autoridade policial e inerente ao inquérito policial.

Além disso, pela leitura da decisão, o STF poderá dar início às investigações, contrariando o parecer do titular da Ação Penal (no caso, a Procuradoria Geral da República). Neste caso, foi adotado o juizado de instrução no Brasil, deformando o sistema acusatório, que é adotado entre nós.

Depois de terem acabado com a autorização da casa para processar o parlamentar, o STF a recriou, tornando obrigatória sua licença para que a polícia dê início às investigações.

O argumento da Corte Constitucional para tal decisão foi de que abusos poderão ser cometidos se não houver a supervisão de um ministro relator.

Mesmo antes, quaisquer medidas excepcionais como interceptação telefônica ou busca domiciliar, por se tratarem de cláusula de reserva de jurisdição, só poderiam ser autorizadas e supervisionadas pelo Tribunal Maior e, se houvesse abusos, ali seriam coibidos, sendo desnecessária anuência prévia.

Mais à frente, não resta a menor dúvida que essa decisão se estenderá aos que detêm foro por prerrogativa de função em outros Tribunais inferiores, em razão dos princípios da correlação e da isonomia de tratamento.

Ainda que o indiciamento irregular não tenha o condão de afetar a Ação Penal, vamos nos deparar com inúmeros Habeas Corpus com pedido de trancamento e invalidação dos atos anteriores à referida decisão em outros processos penais.

Só nos resta agora aguardar a pressão da sociedade para que o Supremo Tribunal Federal modifique seu entendimento.

Revista Consultor Jurídico

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