Defensoria não pode ser substituta processual de menor

A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu, por maioria, que não cabe a atuação obrigatória da Defensoria Pública como curador especial de menores quando eles não são partes do processo. A obrigatoriedade descartada pelo tribunal, no caso, refere-se a abuso sexual de menores em ação ajuizada pelo Conselho Tutear. A entidade pediu a intervenção da Defensoria. O Recurso Especial, apresentado pelo Ministério Público do Rio, foi acolhido pelo voto-vista do ministro Sidnei Beneti, que divergiu da relatora do processo Nancy Andrighi. A decisão poderá servir de precedente para outras ações em que se discute a atuação do curador especial.

“Para essa proteção do destinatário da decisão judicial atua, em primeiro lugar, a própria função jurisdicional, por intermédio do Juiz e, em segundo, no caso, o Ministério Público, como representante da sociedade, à qual interessa que crianças e incapazes sejam o mais possível preservados contra as ações lesivas das partes, alertando o Juízo e requerendo e promovendo diligências que os resguardem, não se podendo presumir que sobre essas figuras institucionais paire, superior, a relevante função da Defensoria, como se sem ela o órgão julgador e o representante do Ministério Público fossem incapazes de zelar por crianças e adolescentes”, destaca o acórdão.

“A Defensoria trabalha com a tese de que o interesse da criança quando ela está relacionada ao processo deve prevalecer, sendo , parte ou não,”, afirmou à Consultor Jurídico o defensor público do estado de São Paulo, Diego Vale de Medeiros. O defensor conta que esse entendimento segue em consonância com a Convenção Internacional sobre Direitos da Criança e princípios que regem o Estatuto da Criança e do Adolescente. “É um pensamento inovador e, infelizmente, de uma minoria. Esse entendimento não se limita a ver a criança como objeto da relação processual. Se a sua representação processual é precária, então é necessário garantir o seu interesse”, destaca Medeiros.

De acordo com o decidido pelo STJ, a intervenção obrigatória só existiria para crianças ou adolescentes que sejam partes diretamente e não para casos em que existem a ameaça ou a violação de algum direito seu. De acordo com Medeiros, o risco de uma visão exclusivamente positivista, pode deixar de lado princípios que busquem preservar a vontade e interesse do menor. “Uma convenção internacional e o ECA já são suficientes para entender que o mundo caminha nesse sentido”.

O Caso
O Conselho Tutelar ajuizou a ação contra os pais dos menores sob acusação de abuso sexual. A alegação de que a Defensoria deveria atuar obrigatoriamente, além do Ministério Público na qualidade de custos legis, fundamentou-se no artigo 9º, I, do Código de Processo Civil, e do artigo 148, parágrafo único, f, do Estatuto da Criança e do Adolescente. No entanto, segundo o STJ, nenhum dos dos dispositivos invocados estabelece a obrigatoriedade de intervenção da Defensoria.

“A Curadoria Especial exerce-se apenas em prol da parte, visando a suprir-lhe a incapacidade na manifestação de vontade em Juízo. Não é exercida para a proteção de quem se coloque na posição de destinatário da decisão judicial.” Ainda segundo o acórdão, essa proteção, primeiramente, deve ser pela atuação dos genitores ou representantes legais, seguido dos Conselhos Tutelares e, ainda, por intermédio da vigilância de custos legis [fiscal da lei] do Ministério Público na aplicação da Lei.

O ECA dispõe, no artigo 148, que o curador especial “deve atuar em casos de apresentação de queixa ou representação, ou de outros procedimentos judiciais ou extrajudiciais em que haja interesse de criança ou adolescente”. No entanto, o ministro Sidnei Beneti, destaca que a combinação do dispositivo com o art. 4º, XVI, da Lei Complementar 80/94, sobre as normas para a organização das Defensorias Públicas nos Estado, não leva à obrigatoriedade se os menores não são partes.

O ministro Beneti também faz a ressalva de que não há impedimento para a Defensoria vir a atuar, por exemplo, como assistentes em casos específicos. Assim, o ministro concede o provimento que anula a participação obrigatória da Defensoria, mas com observação no recurso de que, se necessário, o MP determina o envio à Defensoria, se entender apropriada, tomar as providências cabíveis.

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