A demissão de servidor que cede sua senha pessoal a terceiro com o objetivo de burlar o controle eletrônico de ponto não é desproporcional nem irrazoável. A decisão da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) mantém sanção imposta a técnico judiciário do próprio Tribunal.
A Defensoria Pública da União (DPU) sustentou que o processo administrativo seria nulo em razão da presença de servidores não estáveis na comissão de sindicância, da falta de diligência do procedimento, da presença de testemunhos questionáveis e na falta de conhecimento pelo colegiado administrativo do teor do voto do relator originário. Alegou, ainda, que a chefia do servidor avaliava seu desempenho de forma positiva quanto ao zelo na manutenção do sigilo das informações a que tinha acesso. Já o Ministério Público Federal (MPF) opinou pela substituição da pena de demissão pela de suspensão por 30 dias, já que a senha não permitiria o acesso a dados sigilosos.
O ministro João Otávio de Noronha apoiou seu voto parcialmente na própria manifestação do MPF para afastar as alegações da DPU. O parecer registra que não há prova, nem houve questionamento durante o processo disciplinar, de que os membros da comissão de sindicância seriam ocupantes única e exclusivamente de cargos em comissão, o que seria vedado pela ausência do requisito da estabilidade.
Tampouco haveria prova, afirma o MPF, de que os ministros integrantes do Conselho de Administração do STJ não teriam tomado conhecimento do voto do relator – mais favorável ao ex-servidor. Conforme o MPF, além de dois pedidos de vista sucessivos, a matéria foi discutida por ao menos três sessões distintas, não podendo, por isso, alegar-se desconhecimento dos fatos e votos.
Quanto às testemunhas, o MPF também afirma que eventual inimizade ou suspeição não foram, em nenhum momento, alegadas pela defesa, que acompanhou a tomada de todos os depoimentos, nem mesmo contraditadas. Além disso, afirma ainda o parecer, a comissão processante teria se baseado em outras provas, técnicas, como o controle de ponto e de catracas, para formar sua convicção.
O relator acrescentou que, em relação ao excesso na pena aplicada, ele não existiria. O ministro Noronha afirmou que a pena proposta pelo MPF – suspensão de 30 dias – seria cabível ao servidor que, após ingressar no Tribunal e registrar no ponto eletrônico sua entrada, se ausentasse, deixando de trabalhar as horas lançadas. Mas, no caso, a situação fora mais grave: o repasse a terceiros da senha que dá acesso ao sistema eletrônico expõe a riscos as informações do Tribunal, atualmente armazenadas, em sua maioria, em meios digitais.
“Ora, nada obstante o intento do impetrante de auferir vencimentos sem a respectiva contra-prestação de serviços – fato que por si é grave, pois denota a intenção de lesar a administração pública (no caso, empregador) –, não se pode desconsiderar que o impetrante deixou a descoberto a segurança do sistema de informática do STJ, a que tinha acesso em razão das atribuições de seu cargo. Daí o porquê de o fato amoldar-se perfeitamente ao estabelecido nas disposições do artigo 132, IX, da Lei n. 8.112, de 1990”, entendeu o ministro.
Como esse dispositivo prevê de forma específica a pena de demissão e dispensa a comprovação de dano efetivo – não importaria a amplitude do acesso aos sistemas garantida pela senha ou o efetivo acesso a dados sigilosos –, não seria possível a aplicação do princípio da proporcionalidade. “O princípio da proporcionalidade serve para dosar a pena a ser aplicada, mas não para descaracterizar o tipo a que os fatos se subsumem”, concluiu o relator.