por Gustavo Piva de Andrade
Com a promulgação da Lei da Inovação (10.973/04) e da Lei do Bem (11.196/05), o tema inovação definitivamente passou a ocupar um lugar de destaque no debate desenvolmentista nacional. Nesse contexto, torna-se fundamental revisitar a obra de Joseph Schumpeter (1883-1950), o mais influente pensador que se debruçou sobre a matéria e quem melhor conseguiu explicar a lógica da dinâmica capitalista ao decretar que inovação é a principal força propulsora do desenvolvimento econômico e industrial.
Ele cunhou a extraordinária metáfora “destruição criativa” para designar o constante processo de transformação que fomenta o progresso por meio da eliminação de agentes e produtos defasados, em um cenário de seleção em que só os agentes inovadores se sobressaem e conseguem sobreviver. Esta é, segundo Schumpeter, a essência do capitalismo e ocorre, notadamente, através da introdução de um novo bem ou tecnologia no mercado ou da descoberta de um novo meio de produção ou de prestação de um serviço.
“Destruição criativa” na forma de inovação, portanto, se dá na substituição do walkman pelo discman e deste pelos modernos MP3 players; ou na substituição do telégrafo pelo telefone tradicional e deste pelo serviço de discagem gratuita via internet. Não importa o mercado. Quando a empresa ou o produto inovador chega, a tendência é que eles simplesmente “destruam” seus concorrentes ou então os obriguem a inovar, sob pena de serem suplantados. Absolutamente justificável, pois, que uma empresa recém-criada como a Skype atraia tanta atenção ou que a Apple e o Google sejam freqüentemente citados como dois dos maiores ícones do capitalismo da atualidade.
Como inovação nada mais é do que a introdução de uma novidade ou aperfeiçoamento tecnológico no ambiente social ou produtivo, seu desenvolvimento encontra-se intrinsecamente ligado à possibilidade do inovador se apropriar e colher os frutos das suas criações. É exatamente aí que a propriedade intelectual se insere e o sistema de patentes passa a exercer um papel fundamental em qualquer economia de mercado.
Na ausência de patentes e de um sistema de proteção patentária eficiente, agentes inovadores não têm como proteger suas criações e ficam a mercê de usurpadores que, na ausência de impedimento legal, inexoravelmente copiarão a invenção ou o aperfeiçoamento. O resultado é um cenário em que o agente não inova ou prefere manter suas invenções secretas, privando a sociedade e o mercado de um produto inovador e de suas importantes informações técnicas.
Diversos países já compreenderam isso e conferem ao sistema de proteção à propriedade intelectual status de verdadeira política de estado. Enquanto isso, no Brasil, a impressão que se tem é que o país se encontra na contramão deste processo, mergulhado na burocracia e num ambiente de considerável insegurança jurídica no que diz respeito à proteção de patentes e demais ativos intangíveis.
O desestímulo ao empreendedorismo inovador começa pela própria ineficiência do INPI, o qual, apesar de alguns avanços administrativos recentes, ainda leva, em média, nada menos que oito anos para examinar um pedido de patente. Também é impossível não destacar os inúmeros entraves burocráticos que agentes inovadores encontram para obter e licenciar seus direitos, como, por exemplo, a necessidade de anuência prévia da Anvisa para a concessão de patentes farmacêuticas, a legislação demasiadamente restritiva na área da biotecnologia e o grande atraso na análise e averbação de contratos de transferência de tecnologia e de assistência técnica.
Bastante prejudicial, outrossim, a interferência política sobre assuntos que deveriam ser examinados sob um enfoque exclusivamente técnico, tais como a patenteabilidade de polimorfos e a concessão de patentes de segundo uso na área médica. Isso sem contar que o governo brasileiro decretou o licenciamento compulsório da patente de um importante anti-retroviral, numa perigosa indicação de qual é a atual política governamental acerca do respeito aos direitos de empresas que investem em pesquisa e desenvolvimento.
Por tudo isso, resta claro que, para criar um ambiente propício à inovação, o Brasil deve ir além dos marcos legislativos mencionados e implementar mudanças de cunho estrutural e ideológico, que façam com que direitos de propriedade intelectual efetivamente integrem a cultura e a política do país e não sejam apenas lembrados como instrumento de barganha quando da negociação de acordos de livre comércio.
Sem um sistema de proteção à propriedade intelectual forte e eficiente, não há inovação. E sem inovação, não há desenvolvimento. Logo, caso o Brasil realmente pretenda se inserir na economia global e concorrer em nível de igualdade com seus competidores, faz-se necessária uma drástica mudança de rumos, sob pena de o país não promover a Destruição Criativa de Schumpeter e contradizer, em última análise, a própria essência do capitalismo.
Revista Consultor Jurídico