Direito Autoral – Autores e usuários divergem sobre mudança na legislação

por Marina Ito

O governo entende que é necessário mudar a Lei de Direito Autoral. Mas não pretende fazer isso sem antes ouvir os interessados e a sociedade em geral. Pelo clima dos seminários promovidos pelo Ministério da Cultura (MinC), a tarefa vai ser das mais árduas, já que existe um grupo que é terminantemente contra mudanças, enquanto outro reivindica modificações na lei.

Alexandre Kruel Jobim, da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), resumiu bem o encontro. “Não podemos tratar dessa questão como se fosse uma arena”. De fato, o seminário A defesa do Direito Autoral: gestão coletiva e papel do Estado, promovido pelo MinC, no Rio de Janeiro, nos dias 30 e 31 de julho, mostrou que as divergências não estavam apenas nas mesas de debates. A platéia também estava, claramente, dividida. Para Alexandre Kruel, os direitos autorais têm de ser pensados e não tratados como prestação de contas.

Uma parte dos participantes defende com unhas e dentes a gestão coletiva dos direitos do autor, da maneira como é feita hoje. A gestão é exercida, no caso de obras musicais, pelo Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad). De outro, há os que querem mudanças no sistema, exigindo, entre outras coisas, fiscalização do Ecad pelo Estado.

Em comum, segundo as duas correntes, a defesa dos direitos autorais. Portanto, a divergência está, para alguns, no modo como os direitos autorais são cobrados dos usuários de música (eventos, restaurantes, emissoras, hotéis, academias) e, para outros, a maneira como o valor é distribuído aos autores.

A supervisora executiva do Ecad, Glória Braga, defendeu os critérios utilizados para a cobrança dos direitos autorais pelo órgão. Ela comparou os parâmetros usados pelo Brasil com os de outros países como Espanha, França, México e Peru. Nesses países, conforme informou, a cobrança de direitos autorais de emissoras de televisão, por exemplo, também se dá por uma porcentagem do faturamento bruto das empresas. Hoje, o Ecad cobra 2,5% do faturamento das emissoras. “Não existe abusividade nenhuma”, disse Glória Braga.

Já o advogado Marcos Bitelli criticou a definição dos critérios pela Assembléia Geral do Ecad. Segundo ele, quem dá as regras sobre os preços cobrados são os intermediários. Bitelli citou, ainda, as constantes ações judiciais que colocam em pólos opostos Ecad e emissoras de rádio e TV, cinemas e hotéis.

Fiscalização do Estado

Bitelli defende modificações na legislação de Direito Autoral para definir os parâmetros de cobrança. Ele também acredita que é preciso a fiscalização do Estado sobre a atividade do Ecad. Bitelli não é o único. Os advogados Alexandre Kruel e Allan Rocha de Souza também acham que deve ter um órgão regulador no setor.

Glória Braga lembrou que já existiu no país um órgão regulador, o Conselho Nacional de Direito Autoral (CNDA), criado em 1973. Segundo a advogada, alguns dos critérios utilizados atualmente foram aprovados pelo Conselho na época em que ele existia.

O compositor e presidente da União Brasileira de Compositores (UBC), Fernando Brant, afirmou que não faz sentido “ressuscitar” ou criar algo semelhante ao CNDA. Brant criticou, duramente, o MinC. Segundo ele, há uma tentativa de mudar a legislação para diminuir os direitos dos autores.

Kruel também não entende ser necessário mudar a lei. Ele defendeu uma Câmara de Arbitragem. “Os juízes desses rincões do Brasil têm intelectualidade suficiente em Direito do autor para dar respostas em tempo hábil?”, perguntou. Para ele, a resposta é negativa.

Distribuição dos direitos

Um dos motivos pelo qual o Ecad tem sido criticado é a reclamação de alguns autores que alegam não receber pelos seus direitos. Glória Braga chamou a atenção para a necessidade de que o autor seja filiado a alguma das associações que compõe o Ecad. Se a pessoa não recebe, explicou, é porque não está filiada. As declarações de Braga geraram aplausos e protestos.

Para o advogado Daniel Campello, o maior problema está justamente no modo como os valores arrecadados pelo Ecad são distribuídos aos autores. Campello entende que os recursos são muito concentrados. Ele acredita que é preciso dar mais transparência e publicidade às decisões que envolvem a distribuição dos direitos autorais.

O seminário realizado no Rio faz parte de uma série de debates que o Ministério da Cultura tem promovido sobre direitos autorais. O coordenador-geral de Direito Autoral do MinC, Marcos Alves de Souza, informou que o tema é questão de Estado, motivo pelo qual, mesmo com a saída de Gilberto Gil, as discussões vão continuar. Ele também informou que a proposta para discutir o assunto não é apenas do MinC, mas da Casa Civil e de outros ministérios.

O próximo seminário, Usuários e consumidores de obras protegidas, vai ser realizado em São Paulo, nos dias 27 e 28 de agosto. As inscrições serão abertas na próxima semana.

Revista Consultor Jurídico

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