A Itália é país com 60 milhões de habitantes e 301.302 km2. É um estado unitário que se divide em 20 regiões (semelhantes aos nossos estados) e em diversas províncias (semelhantes aos nossos municípios).
O curso de Direito na Itália tem a duração de 5 anos, a presença não costuma ser obrigatória e as classes costumam ser enormes, por vezes com centenas de alunos. Aos formados abrem-se três vias de trabalho: a) concurso para Notário, de todos o mais procurado, em razão dos rendimentos que proporciona; b) concurso para a magistratura (que inclui o MP); c) exame junto à Ordem dos Advogados.
A Justiça na Itália é prestada por duas diferentes esferas, ou seja, a Justiça Ordinária e a Justiça Administrativa. Fora do sistema judicial, porém com grande importância, há o Tribunal Constitucional e a Corte de Contas. Na Itália a magistratura é composta por juízes e agentes do Ministério Público, em uma só carreira, todos chamados de magistrados.
A Justiça Ordinária, de todas a maior, conta com cerca de 10.000 magistrados. O primeiro passo para tornar-se juiz da Justiça Ordinária ou Comum é ser graduado em Direito. Não há limite mínimo de idade nem necessidade de prática forense. O concurso é muito disputado, concorrendo cerca de 7.000 a 8.000 candidatos para aproximadamente 250 vagas. Há 3 provas escritas e uma oral.
Uma vez aprovado no concurso, o candidato será nomeado como Auditor e ficará em estágio probatório por 2 anos. No início da carreira receberá cerca de 3.500 euros e, com o passar dos anos, seus vencimentos aumentarão, chegando ao máximo, como juiz da Suprema Corte de Cassação, em aproximadamente 12.000 euros. O cargo é vitalício, como no Brasil. Contudo, por má conduta, o juiz pode ser demitido em processo que tramita no Conselho Superior da Magistratura.
A primeira instância divide-se em Tribunais (não se usa a palavra Foro) civis e criminais. A promoção será para uma Corte de Apelação, que poderá ser Civil ou Criminal (D´Assisi). Os juízes da região de Bozzano, próxima da Áustria, devem obrigatoriamente falar alemão e permanecer no local por pelo menos 10 anos.
As promoções são sempre por antiguidade e todos os juízes, com o passar dos anos, costumam chegar à Corte de Cassação, que conta com cerca de 360 juízes e que se constitui a cúpula do Poder Judiciário. Inexiste na Itália o chamado quinto constitucional.
Ao lado da Justiça Ordinária há a Justiça Administrativa, competente para processar e julgar as ações contra os órgãos do Poder Público, devendo a parte demonstrar legítimo interesse. Cada uma das 20 Regiões tem um Tribunal Administrativo, conhecidos como TARs. O número de juízes varia conforme o volume de serviço. Os TARs julgam em Câmaras, cada uma com 5 juízes, dos quais 3 são de carreira e 2 são leigos. Os juízes administrativos têm os mesmos direitos e deveres dos juízes ordinários e estão subordinados ao Conselho de Justiça Administrativa. Acima dos TARs está o Conselho de Estado, que dá a última palavra em matéria administrativa, seguindo o modelo francês.
O Conselho de Contas foi criado em 1862 para fiscalizar a administração do Estado, prevenir e impedir a má gestão do dinheiro público. Ele tem sede na capital, Roma, e é composto pelo Presidente, Procurador Geral, Presidente Adjunto e 4 magistrados escolhidos entre professores e advogados, estes com mais de 20 anos de prática forense. Nas Regiões não há juízes, mas atuam procuradores.
O Tribunal Constitucional, previsto nos artigos 134 a 137 da Constituição, não pertence ao Poder Judiciário. Constitui-se de 15 juízes, com mandato por 9 anos, sendo 1 terço indicado pelo Presidente da República, 1 terço pelo Parlamento e 1 terço pela Suprema Corte de Cassação.
Só a Corte Constitucional julga a constitucionalidade de uma lei. Se um juiz ordinário considera uma lei inconstitucional, suspende o andamento do processo e remete-o à Corte para decisão. O julgamento é rápido, no máximo em 1 ano, e é possível determinar a reunião dos casos envolvendo a mesma matéria para julgamento único. Em 14.4.2010 a Corte Constitucional decidiu ser inadmissível o casamento entre homossexuais.
As promoções, remoções, o regime disciplinar, a administração da Justiça enfim, é gerida pelo Conselho Superior da Magistratura, órgão com 21 membros, dos quais 14 são juízes de carreira eleitos pela classe e 7 são indicados pelo Parlamento. Ao CSM compete, inclusive, indicar o Presidente da Suprema Corte de Cassação, órgão máximo da Justiça Ordinária.
Finalmente, há os Juízes de Paz, que decidem pequenos casos e que, por isso, recebem pequena remuneração.
A Justiça da Itália é rigorosa na esfera criminal, sendo usual a prisão dos acusados. Todavia, ressente-se do mesmo problema da Justiça brasileira, ou seja, a morosidade. Não há ações coletivas na Itália nem direito das ONGs ingressarem em Juízo representando a coletividade. O Ministério Público não tem entre as suas atribuições a defesa da sociedade nem legitimidade para ingressar em Juízo representando-a. Os prédios dos Tribunais são formais e elegantes. A estrutura de trabalho, contudo, não contém os avanços do Brasil, por exemplo, o processo eletrônico.
Atualmente, depara-se a Justiça italiana com uma questão para nós desconhecida. Seus julgamentos, mesmo com trânsito em julgado, podem ser revistos pelo Tribunal da Comunidade Européia. Há certa dificuldade dos operadores do Direito em adaptaram-se a esta nova situação.
Itália e Brasil guardam, entre si, grande identidade cultural. Seus sistemas judiciais descendem do sistema romano. Seus magistrados (juízes e procuradores da República), ao longo da história, têm prestado relevantes serviços ao país, como no caso do combate à poluição hídrica nos anos 1970, à Máfia (vide assassinato do magistrado Giovani Falcone, em 1989) e a “Operação Mãos Limpas”, contra a criminalidade nos serviços públicos e nos meios políticos.
Em suma, a magistratura italiana é respeitada pela sociedade e presta um bom serviço ao seu país.
Vladimir Passos de Freitas desembargador Federal aposentado do TRF 4ª Região, onde foi presidente, e professor doutor de Direito Ambiental da PUC-PR.