Entulho legal – Congresso tem 52 medidas provisórias nunca votadas

O Congresso Nacional tem 52 medidas provisórias que esperam votação desde 2001, quando a Emenda Constitucional 31/2001 alterou o rito de aprovação das MPs. A informação é de reportagem do jornal O Estado de S.Paulo.

Apelidadas de “entulho legal”, as MPs tratam de temas importantes, mas não são analisadas pelo Parlamento. Nesta situação provisória encontram-se o Código Florestal, três agências reguladoras — Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) e Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) — formas de funcionamento da Advocacia-Geral da União, entre outras.

Leia o texto do repórter João Domingos, publicado no jornal O Estado de S.Paulo deste domingo

O Congresso deu início a um novo debate sobre a necessidade de promover mudanças na forma de tramitação das medidas provisórias, sob o argumento de que elas impedem o funcionamento do Legislativo. Mas deputados e senadores ainda não conseguiram resolver a situação de 52 MPs que, apesar de serem parte importante da legislação recente do país, nunca foram votadas e, em 2001, acabaram numa espécie de limbo legislativo — à espera de que os parlamentares um dia resolvam o que fazer com elas.

Nessa situação, que os congressistas apelidaram de “entulho legal”, encontram-se, por exemplo, o Código Florestal, três agências reguladoras — Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) e Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) —, o Sistema Nacional Antidrogas, as normas para a federalização de bancos estaduais, formas de funcionamento da Advocacia-Geral da União (AGU), compensação para as empresas do setor elétrico que tiveram prejuízo com o apagão de 2001, artigos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) destinados a dar maior rapidez às ações trabalhistas, acesso ao patrimônio genético no Brasil e na plataforma continental e a regulamentação dos planos privados de Previdência.

O governo Fernando Henrique Cardoso acabou em 31 de dezembro de 2002, depois de oito anos. Mas a estrutura da Presidência da República e de todo seu ministério, mudada em 1999 por meio da MP 2.216, nunca foi votada. Fernando Henrique reeditou a MP 37 vezes (três anos e um mês) para garantir que seu ministério e o Palácio do Planalto funcionassem do jeito que havia planejado. Até que, em 2001, o Congresso decidiu mudar a forma de tramitação de MPs, sob o argumento de que atrapalhavam o funcionamento do Legislativo. O mesmo de agora.

Os debates em torno das medidas provisórias resultaram na Emenda Constitucional 32, promulgada no dia 11 de setembro de 2001. Essa emenda estabeleceu que, depois de 45 dias de edição, as MPs passariam a trancar a pauta da Câmara e do Senado até que fossem votadas, pois em 120 dias caducariam. Também ficou decidido que a votação ocorreria separadamente na Câmara e no Senado. Antes disso, se uma MP não fosse votada dentro de um mês, o presidente da República poderia reeditá-la indefinidamente. Foi o que ocorreu com a da estrutura do ministério de Fernando Henrique, com a do Código Florestal, reeditada por 67 vezes (cinco anos e sete meses) e com outras 50 medidas provisórias.

Como a prioridade do Congresso em 2001 era mudar a forma de tramitação das MPs, houve um acordo para que as regras das 52 que não tinham sido votadas continuassem valendo até que os parlamentares decidissem seu futuro. A Emenda 32 proibiu que o presidente da República editasse, a partir de setembro daquele ano, MPs sobre cidadania, partidos políticos, Direito Eleitoral, Processo Penal e Civil e até mesmo confisco de poupança.

Curioso é que sete dias antes Fernando Henrique havia baixado a MP 2.225, mudando parte do Processo Penal. Com base na emenda constitucional, essa medida provisória foi questionada no Supremo Tribunal Federal (STF). A Corte, no entanto, decidiu que seus efeitos continuavam valendo, pois a proibição de edição de MP a respeito de questões processuais ocorrera uma semana depois.

O presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), reconhece que a situação das 52 MPs do limbo é estranha, pois nunca foram votadas. Acha, no entanto, que a urgência maior é alterar o rito de tramitação atual das MPs, para evitar que continuem a trancar a pauta do Legislativo. “Em segundo lugar, precisamos passar um pente-fino na legislação que ficou para trás, tomar conhecimento dos detalhes de cada uma das MPs e levar à deliberação do Congresso.”

Chinaglia disse que vai conversar com o presidente do Senado, Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), para negociar a convocação do Congresso exclusivamente para tratar das medidas provisórias do “entulho legal”. “Hoje as MPs nem mais são analisadas em sessão do Congresso (Senado e Câmara, reunidos em sessão conjunta e unicameral). Teremos de encontrar tempo para tratar dessas que ficaram para trás”, observou. Ele determinou que a assessoria técnica da Câmara faça um estudo sobre as MPs do limbo, para que entrem em negociação. Como estão em vigor há quase sete anos, quase todas poderiam ser aprovadas por consenso.

Revista Consultor Jurídico

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