Por Eduardo César Fidelis Bechepeche e Maurício Morimoto Doi
A Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06), vigente desde o final de 2006, trouxe um instituto do direito americano para o âmbito do nosso ordenamento jurídico. Trata-se da possibilidade de o juiz estabelecer uma distância mínima, como medida de urgência e proteção à mulher, a ser guardada pelo agressor em relação à vítima.
Muito se discute quanto à constitucionalidade de tal lei, haja vista que o mesmo não poderia ser estatuído para o homem agredido, apesar de haver precedente nesse sentido, em Mato Grosso, no qual o Juizado Especial Criminal Unificado de Cuiabá aplicou por analogia a Lei 11.340/06. Assim, ficou a mulher proibida de se aproximar a menos de 500 metros de seu ex-marido.
Longe de se querer discutir se há compatibilidade ou não constitucional dessa lei, em virtude do princípio da isonomia, quer-se trazer sugestão da incorporação do instituto da distância mínima ao universo do direito brasileiro. Isso porque em vários outros casos que nada têm a ver com violência praticada no âmbito do lar, mostra-se salutar estabeceler um limite físico entre pessoas que correm risco de dano à sua incolumidade física. Isso se dá, por exemplo, no caso de testemunha presencial de homicídio e o beneficiário de delação premiada em organizações criminosas (promovendo a melhor colheita da prova pela maior proteção à testemunha), vítimas de ameaça (tanto homens como mulher, independentemente de relação doméstica) e, ao alvedrio do bom senso que norteia a prestação jurisdicional, toda vez que houvesse o risco justificado de violência e efetividade no estabelecimento da distância mínima.
Tantas são as opções em que pode a fixação de uma distância mínima ajudar na paz social que, como exemplo, dá-se o de um magistrado norte-americano, em eleições, determinando quanto metros deveriam ficar as pessoas de filas de quem votaria, com o fim de evitar pressões e assédio. Com isso, defendeu-se a liberdade política do eleitor. Mais conhecidos são os exemplos de violência ou possibilidade desta entre pessoas que não coabitam e às vezes nem sequer se conhecem — a atriz estadunidense Kirsten Durnst já teve estabelecida distância mínima de um fã para com ela, por tentativa de invasão de seu domicílio pelo admirador e a alegação deste de que teriam “ligação espiritual”. Claro está o risco que corre a atriz, bem como não existe liame com o Direito de Família.
No Brasil, haveria progresso nos Juizados Especiais Criminais que, atualmente, são vistos por alguns como ineficazes para a pacificação social (decorrência da concessão de benefícios legais que levam à não aplicação da pena ao criminoso de menor potencial ofensivo, a exemplo das cestas básicas em transação penal). É comum haver progressão criminosa em razão do sentimento de impunidade, por pouco atingir o resultado do processo a vida rotineira do ofensor.
Assim, reclama o direito brasileiro que seja o instituto da distância mínima estendido a outros de seus ramos, como forma inclusive de efetivação de direitos essenciais da pessoa humana, por se tratar de garantia à integridade física e mental. Seu isolamento na Lei Maria da Penha e um histórico de sucesso em seu uso demonstram que sua ampliação acrescentaria maior pacificação social.
[Artigo publicado originalmente no jornal Correio Braziliense, de 11/5/2009]