Estado não deve pagar duas pensões por morte em serviço

A 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul julgou improcedente pedido de revisão de benefícios feito pela viúva de um policial falecido há 14 anos. Os desembargadores não só reconheceram a prescrição quinquenal do “fundo de direito” como entenderam que, à época, o Executivo estadual concedeu um plus aos beneficiários do servidor, a título de pensão estatutária, já que a legislação previdenciária não previa o pagamento da pensão na integralidade dos vencimentos. A decisão, que reformou a sentença, é do dia 7 de dezembro.

O marido da autora da ação morreu em serviço no ano de 1993. Em 1996, o Governo do Estado mandou publicar o ato concessivo de pensão complementar, a contar da data do óbito. Como o Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul (Ipergs) passou a pagar pensão previdenciária integral aos beneficiários do servidor, o estado deixou de depositar a pensão estatutária, de caráter especial. A viúva, então, ajuizou ação ordinária na 11ª Vara da Fazenda Pública do Foro do Partenon, em Porto Alegre, solicitando a retomada do pagamento do Governo Estadual.

A defesa da viúva sustentou que os benefícios decorrem de relações jurídicas diversas, sendo um previdenciário e outro indenizatório. Portanto, acumuláveis. Pediu que seja declarado o seu direito em receber a pensão integral, sem abater a quantia honrada pelo Ipergs, e os atrasados, correspondente aos vencimentos integrais do servidor falecido.

O estado do Rio Grande do Sul, por meio da Procuradoria-Geral do Estado (PGE-RS), argumentou, preliminarmente, a prescrição do “fundo de direito”. A expressão é empregada para significar os direitos de ser funcionário público ou os direitos a modificações que se admitem com relação a esta situação jurídica fundamental, como reclassificações, reenquadramentos, adicionais por tempo de serviço, gratificações por prestação de serviço especial etc. A pretensão do fundo de direito prescreve, em Direito Administrativo, em cinco anos, a partir da data da violação.

No mérito, a defesa do Estado alegou a impossibilidade de acumulação da pensão paga pelo Ipergs com a pensão pretendida, ressaltando que o benefício previdenciário já é pago de forma integral. Explicou que a pensão estatuária visava apenas à complementação da pensão previdenciária paga na forma do artigo 27 da Lei do Ipergs, até atingir o montante relativo à integralidade da remuneração do servidor.

O Ministério Público estadual (MP-RS) opinou pela extinção do processo, sem resolução de mérito, com base no artigo 267, inciso IV, do Código de Processo Civil (CPC).

Preliminarmente, o juiz de Direito Maurício Alves Duarte disse que apenas as parcelas anteriores a cinco anos do ajuizamento da ação estão prescritas, permanecendo íntegro o fundo de direito. Quanto ao mérito da ação, o magistrado afirmou que o dependente de servidor policial civil falecido em serviço tem direito à dúplice pensão. Isto é, àquela paga pelo Ipergs, de natureza previdenciária, prevista no artigo 72 da Lei 7.366/80; e à pensão de natureza infortunística, com cunho indenizatório, prevista no artigo 71 da mesma lei.

Citando a jurisprudência do tribunal, o juiz de Direito justificou que a pensão indenizatória não é complementável, mas acumulável. “São direitos distintos, decorrentes de relações jurídicas diversas; um a cargo da autarquia previdenciária, devido aos dependentes do segurado que contribuiu para a previdência social na forma do plano previdenciário; o outro a cargo do Estado, em razão de disposição especial, devida aos familiares do servidor morto em consequência de acidente ou agressão no exercício de suas atividades.”

Assim, por entender que os benefício são acumuláveis e se complementam na interpretação do artigo 71 da Lei 7.366/80, o julgador considerou a demanda procedente.

O estado foi condenado a restabelecer a pensão estatutária na integralidade dos vencimentos do segurado e sem compensação com a pensão previdenciária, pagando as diferenças vencidas e a vencer, desde o cancelamento do benefício, respeitada a prescrição quinquenal.

Virada no Tribunal de Justiça
Derrotado, o estado do Rio Grande do Sul apelou ao Tribunal de Justiça, sob os mesmos argumentos exibidos no primeiro grau. Após a apresentação de contrarrazões, o MP foi consultado, opinando pelo desprovimento do recurso.

O relator da Apelação na 1ª Câmara Cível, desembargador Jorge Maraschin dos Santos, aceitou o argumento de prescrição do fundo do direito, uma vez que a decisão administrativa sobre a pensão foi proferida em 22 de novembro de 1996. “A pensão do artigo 71 da Lei 7.366/80 (infortunística) foi concedida em 1993. Em novembro de 1996, foi concedida uma pensão só, integral, descontando-se o benefício pago pelo Ipergs”, destacou o relator, citando o boletim com o ato assinado pelo então secretário de Segurança Pública.

O ato diz que será concedido, a partir de 17 de abril de 1993, aos menores e à viúva, “uma pensão mensal correspondente sempre ao total das vantagens a que esse último teria direito, descontando-se o benefício a cargo do Instituto de Previdência do Estado, de conformidade com o artigo 71 da Lei nº 7366, de 29.03.1980”. Para o relator, o próprio direito à pensão dupla foi negado já em novembro de 1996.

Além disso, a ação foi ajuizada depois do quinquênio do fato gerador da pretensão inaugural, 21 de maio de 2010; logo, ocorreu a prescrição do fundo do direito, nos termos do Decreto 20.910/32. Por isto, o desembargador relator votou por prover a Apelação do estado do Rio Grande do Sul, reconhecendo a prescrição do fundo do direito e julgando improcedente o pedido feito na inicial.

O desembargador Luiz Felipe Silveira Difini acompanhou o voto do relator e observou que a pensão paga pelo estado do Rio Grande do Sul possui nítido cunho indenizatório, já que não se confunde com o pensionamento a ser arcado pelo Ipergs, este, sim, com índole previdenciária. “Contudo, há que se ter em conta que a intenção do legislador, à época da edição da norma em questão, foi a de conceder um plus aos beneficiários do servidor falecido em atividade ou em decorrência da função, já que a legislação previdenciária não previa o pagamento do pensionamento, aos dependentes, na integralidade dos vencimentos percebidos pelo servidor”, continuou.

“Não existem duas pensões, mas uma só, paga pelos dois institutos”, concluiu. Idêntico entendimento foi compartilhado pelo desembargador Irineu Mariani, que preside o colegiado.

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