Excesso de proteção – Qual é o limite do pagamento de créditos trabalhistas?

por Clarissa Mazarotto

Talvez nem mesmo o então presidente Getúlio Vargas quisesse proteger tanto o trabalhador quando implementou esforços para colocar em vigor a Consolidação das Leis do Trabalho nos idos de maio de 1943, quanto agora querem os juízes e a própria Justiça do Trabalho.

O trabalhador é sim credor de respeito, direitos e proteção do Estado e do Judiciário, pelo que não se duvida da importância da garantia constitucional alçada ao mesmo. Será, porém, o trabalhador um néscio, desqualificado e alienado que necessite ser tão altamente protegido a ponto de perder o direito de optar? Será tão frágil, ignorante e desprovido de informação o trabalhador a ponto de seus direitos prevalecerem em detrimento e colisão com quaisquer outros direitos também alçados à garantia constitucional?

Não. Penso que não. O trabalhador é credor de direitos tão importantes quanto os demais cidadãos protegidos por princípios constitucionais intangíveis e absolutamente indiscutíveis tais como a propriedade, a garantia da coisa julgada e do ato jurídico perfeito, dentre vários outros.

Mas, além disto, o trabalhador tem que poder optar pelo que lhe convém sob pena de tornar-se ‘boi de piranha’ no oceano de interesses políticos e empresariais dos quais é protagonista.

Sentir-se protegido pelo colo estatal e pelo paternalismo danoso é péssimo para o trabalhador em tempos de globalização e extrema demanda de capacidades para se manter produtivo, atuante e perspicaz como todo profissional deve ser. Acreditar em direitos garantidos de forma irrestrita, incondicional e exagerada, não sempre, mas na maioria dos casos, condiciona o trabalhador a não pensar, não empreender, não buscar melhorar, aprimorar, estudar e conceber novas idéias. Quem sabe não seja este mesmo o interesse estatal?

A evolução do capital, da produção e da tecnologia não deixa dúvidas de que o trabalhador deve se preparar para as mudanças e novidades do mundo, de modo que esta proteção exacerbada pode sim e cada vez mais afastá-lo do crescimento profissional e humano, fadando sua vida à mediocridade.

Mais do que isto, esta proteção exacerbada acaba, como dito acima, colidindo com outros interesses de ordem constitucional que são violados no ‘frigir dos ovos’ das decisões judiciais no âmbito do Poder Judiciário Trabalhista.

Tem sido inúmeras e lamentáveis as decisões que permitem que os bens de sócios desligados há mais de década de uma empresa/sociedade respondam por dívidas trabalhistas, isto sem falar nos terceiros que, tidos por “desavisados” e quase sempre mal orientados, adquirem bens móveis e imóveis para, no futuro próximo, perdê-los em favor da garantia do débito trabalhista.

Nenhuma generalização é inteligente, mas são inúmeras as decisões judiciais emanadas do Poder Judiciário Trabalhista que entendem pela pretensa ‘superioridade’ do crédito trabalhista ao permitir a penhora de imóveis pertencentes a pessoas que nunca tiveram nenhuma relação, conhecimento ou noção de que poderiam ser prejudicados por tal entendimento.

Ao adquirir um imóvel, o comprador, presume-se, deveria consultar certidões e documentos para verificar a existência de dívidas ou problemas que implicassem em possível invalidade do negócio perpetrado. Com isto, presume-se, o comprador deveria ficar tranqüilo e devidamente garantido a respeito da validade da aquisição levada a efeito, não podendo supor ou ter premonições a respeito de eventuais fraudes ou problemas que atingiriam seu direito de propriedade.

Mas é isto que vem ocorrendo em situações corriqueiras nas quais o terceiro de boa-fé, mesmo adquirindo imóveis de pessoas que não tiveram nenhum tipo de relação jurídica envolvendo empresa e reclamante (trabalhador), acaba perdendo seus bens por força de decisões judiciais que mantém penhoras e determinam a expropriação dos mesmos.

Direitos de ordem constitucional, tais como o direito de propriedade, o direito à preservação do ato jurídico perfeito, o direito de publicidade, de obtenção de informações e certidões de interesse particular, coletivo e para esclarecimento de situações merecem o mesmo tipo de proteção conferida ao trabalhador.

Portanto, não se pode conceber que direitos constitucionais alçados ao mesmo patamar dos direitos do trabalhador sejam desconsiderados e simplesmente ignorados em prol de uma suposta proteção que, além de estimular o aumento da informalidade nas relações de trabalho, é suficientemente danosa a ponto estimular sua acomodação em detrimento do crescimento pessoal.

Revista Consultor Jurídico

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.


Você está prestes a ser direcionado à página
Deseja realmente prosseguir?
Atendimento