Fato notório – SBT se livra de indenizar Nicolau por chamá-lo de ladrão

por Lilian Matsuura

Chamar Nicolau dos Santos Neto de ladrão, sem vergonha e de lalau, em rede nacional de televisão, não é motivo para o pagamento de indenização por dano moral. O entendimento é da juíza Ângela Moreno Pacheco de Rezende Lopes, da 2ª Vara Cível de Osasco, que livrou o SBT e os apresentadores Ratinho e Hebe Camargo de indenizarem o juiz aposentado.

Nicolau, condenado a 26 anos e seis meses de prisão por desvio de R$ 170 milhões da construção do Fórum Trabalhista de São Paulo, entrou na Justiça para questionar a forma como foi tratado pelos apresentadores do SBT.

A juíza concluiu que o juiz aposentado não tem nada a receber, pois “é fato notório que o autor envolveu-se no desvio de verbas públicas”. Para ela, os programas apenas veicularam, de forma objetiva, atos criminosos de autoria dele. A decisão saiu na quinta-feira (28/8). Cabe recurso.

“Não pode o autor subverter a natureza das coisas e imputar aos programas de televisão forma agressiva de vilipêndio à sua imagem, pois os próprios fatos, conteúdo dos programas, é que foram uma afronta aos telespectadores”, escreveu a juíza. Ela disse que os apresentadores apenas cumpriram a sua função de informar.

Na ação, os advogados do juiz afirmaram que os comentários levados ao ar em todo o país passaram dos limites constitucionais da liberdade de expressão. “Tais programas são de auditório e entretenimento, não possuem qualquer cunho jornalístico, e as exibições de imagens e comentários despropositados não tiveram quaisquer tipos de censura por parte da ré, e foram marcados pelo elevado grau de sensacionalismo”, argumentaram.

O SBT, representado pela advogada Marina Draib, sustentou ser incontroverso o fato de que o juiz Nicolau “tornou-se ícone da corrupção Brasil”. A pena de 26 anos e seis meses de prisão também foi citada na defesa para comprovar que os comentários não foram gratuitos. “Mesmo tendo os apresentadores da ré proferido palavras duras contra a conduta do autor, agiu corretamente, sem qualquer intenção ofensiva contra a honra do autor, limitando-se ao exercício do dever/direito constitucional de informar”, afirmou a advogada. A tese que foi acolhida pela Justiça.

Leia a sentença

Autos nº 421/01.

2ª Vara Cível de Osasco.

VISTOS.

NICOLAU DOS SANTOS NETO ajuizou ação de indenização por danos morais, pelo rito ordinário, em face de TV SBT CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A alegando que sofreu danos à sua imagem e honra em razão de programas televisivos exibidos no Programa do Ratinho e Programa da Hebe, veiculados pelos apresentadores Carlos Massa e Hebe Camargo, respectivamente. Referidos programas, levados ao ar para todo o País, nos quais extensos comentários não observaram os limites constitucionais de liberdade de expressão, desrespeitou-o de todas as formas, incitando a população e tratando-o como “Lalau”, “Ladrão”, “Sem Vergonha”.

Tais programas são de auditório e entretenimento, não possuem qualquer cunho jornalístico, e as exibições de imagens e comentários despropositados não tiveram quaisquer tipos de censura por parte da ré, e foram marcados pelo mais elevado grau de sensacionalismo. A emissora ré preocupa-se apenas em aumentar seus índices de audiência desrespeitando a Lei de Imprensa, não expondo os fatos de forma ética e com a devida parcimônia.

Portanto, é indiscutível o direito à indenização pelos danos morais, em decorrência da violação dos direitos personalíssimos, pelos atos praticados pela ré. Pleiteia, assim, seja a ré condenada a indenizar por dano moral, bem como nas custas processuais e honorários advocatícios. Inicial instruída (fls. 34/47).

Citada, a ré ofereceu contestação alegando, em preliminar, a decadência ao direito do autor e ainda a ausência da preservação das matérias entendidas como ofensivas ao seu direito.

No mérito, aduziu em síntese que o autor notificou a ré para a preservação das matérias após o prazo de trinta dias previsto no art. 58 da Lei da Imprensa. É incontroverso que o autor tornou-se ícone da corrupção no Brasil, e o crime cometido por ele foi comprovado e assim foi condenado a vinte e seis anos e seis meses de reclusão. No entanto, ajuizou a presente ação insurgindo-se contra expressões como “Lalau”, “Ladrão”, que na linguagem popular é um “ladrão” e todos se referiam ao autor como “Lalau”, identificação até hoje conhecida.

O autor, ao envolver-se no desvio de dinheiro público, sendo fato de interesse público envolvendo políticos, inegável o dever dos órgãos de comunicação divulgar tais acontecimentos. Portanto, mesmo tendo o os apresentadores da ré proferidos palavras duras contra conduta do autor, agiu corretamente, sem qualquer intenção ofensiva contra honra do autor, limitando-se ao exercício do dever/direito constitucional de informar.

Assim, em nenhum momento, o autor apresenta um começo de prova para fundamentar seu pedido, já que não houve qualquer manifestação ofensiva ao autor. Pugnou, pois, pela improcedência (fls. 171/187). Juntou documentos (fls. 166/169).

Réplica a fls. 211/234.

O autor especificou provas (fls. 237/238). O réu pugnou pelo julgamento antecipado da lide (fls. 239/240).

É o relatório.

DECIDO.

Conheço diretamente do pedido, com base no art. 330, I, do Código de Processo Civil, pois basta a prova documental produzida para o deslinde da causa. A preliminar argüida em defesa não merece acolhimento, pois a ré foi notificada, e a juntada das provas, em cartório, foi deferida às fls. 60, nos termos do artigo 58, § 1º, da Lei nº 5.250/67 da Lei de Imprensa.

No mérito, não obstante o empenho do digno Procurador do autor, o pedido inicial não merece acolhimento. O autor afirma que em decorrência de programas televisivos exibidos pela emissora da ré, sofreu danos à sua imagem e honra. Pretende a condenação da ré à indenização por danos morais. É fato notório que o autor envolveu-se no desvio de verbas públicas para construção de Fórum Trabalhista e foi condenado, vendo seu nome largamente inserido nos noticiários de todo o país. E, pelo momento em que o país viveu com a situação de corrupção, tem-se que os programas exibidos pela ré, apenas veicularam fatos verdadeiros, de forma objetiva, os atos criminosos praticados pelo autor.

Não pode o autor subverter a natureza das coisas e imputar aos programas de televisão forma agressiva de vilipêndio à sua imagem, pois os próprios fatos, conteúdo dos programas, é que foram uma afronta aos telespectadores.

Com efeito, o autor ao praticar atos de improbidade no exercício de sua função de magistrado na área trabalhista, cargo público e de interesse de todo o povo, deu causa à ligação de seu nome à alcunha “Lalau”, “Ladrão”. Ademais, não há nada nos autos que comprove que as expressões “Lalau”, “Ladrão” tenham sido criadas pela ré ou mesmo pelos apresentadores do programa. Aliás, os atos praticados pelo autor eram quase que diariamente veiculados na imprensa falada e escrita, referindo o autor como “Lalau”, identificação até hoje conhecida.

Assim, o autor, sentiu-se perturbado e atacado moralmente ao ser exposto na mídia, ao ser chamado de “Ladrão”, o que não podia evitar pelos atos que ele mesmo praticou, e a ré, como empresa que explora o meio de comunicação, e tendo além de outras, a função de informar transmitindo a verdade, não causou danos à imagem do autor nem ofendeu a sua honra e dignidade, imagem essa ofendida por ele próprio.

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido inicial e condeno o autor ao pagamento das custas e despesas processuais, com correção monetária desde o desembolso, além de honorários advocatícios de 20% sobre o valor atualizado da causa.

P.R.I.

Osasco, 28 de julho de 2008.

ANGELA MORENO PACHECO DE REZENDE LOPES

JUÍZA DE DIREITO

Revista Consultor Jurídico

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