A Juíza de Direito Karla Aveline de Oliveira, titular do 2º Juizado da Vara Cível do Foro da Tristeza da Comarca de Porto Alegre, concedeu liminar a favor de cinco ferreiros que há mais de 40 anos trabalham e ocupam uma área dentro do Jockey Club do Rio Grande do Sul. Eles pedem na Justiça a manutenção da posse do bem e indenização pelas benfeitorias realizadas ao longo das décadas, como construção de galpões e plantio de várias espécies de árvores, inclusive frutíferas.
Caso
Os cinco autores ajuizaram ação de interdito proibitório cumulada com pedido indenizatório contra o Jockey Club do Rio Grande do Sul e Multiplan Empreendimentos Imobiliários S.A., alegando que desde 1977 trabalham como ferreiros no Jockey Club, o qual colocou à disposição um terreno ao lado das cocheiras dos cavalos para que eles pudessem construir seus galpões de trabalho.
Eles alegaram que cinco galpões e uma casa foram construídos com dinheiro próprio e que estão na posse mansa e pacífica desta parte do imóvel há 40 anos. Os autores sustentaram ainda que a Multiplan divulgou o Projeto Jockey Área II, que engloba o local em que o grupo trabalha, levando à condição de perda da posse. Em uma tentativa de acordo não houve êxito.
Decisão
No termo de audiência consta que a Multiplan está preparando uma nova Vila Hípica onde não haveria local para estes trabalhadores, visto que não houve planejamento de espaço para esta finalidade. A mudança está prevista para o mês de março.
A Juíza Karla Aveline ressaltou que, em audiência, falou-se bastante do dano imaterial que os autores estão na iminência de sofrer, já que ficarão sem trabalho a partir de março, depois de mais de 40 anos trabalhando como ferreiros para os treinadores que cuidam dos cavalos alojados nas baias do Jockey Club. Como se vê nas gravações realizadas, tratam-se de homens com mais de 60 anos de idade, ferreiros há bem mais de 40 anos de trabalho no Jockey Club e que sempre estiveram à disposição dos treinadores, das 6h às 22h.
Ao longo da decisão, a magistrada fez uma relação entre o avanço do mercado imobiliário e a chegada de novas tecnologias que afastaram o apostador do turfe. Esses seriam motivos que levaram ao empreendimento que será construído na área, ao custo aproximado de R$ 2,5 bilhões. O presidente do Jockey Club afirmou que não interessa mais ao clube a manutenção de um espaço próprio para a ferraria na nova Vila Hípica, já que outros ferreiros trabalham com tecnologias mais modernas, sem necessidade de usar espaço e as ferramentas utilizadas pelos autores desta ação.
Nesse contexto o grupo de trabalhadores recorreu ao judiciário postulando a proteção da posse do local onde exercem seu ofício por mais de 40 anos.
Ao conceder a liminar, a magistrada afirmou: “Essa força de trabalho humana, que já foi imprescindível ao negócio desenvolvido pelo Jockey Club, quando passa a ser considerada desnecessária, não pode ser meramente ¿descartada’ sob um viés meramente economicista e contratual, impondo-se, por conseguinte, a cuidadosa análise dos impactos pessoais, sociais, familiares e psicológicos da decisão tomada por quem sempre se valeu dessa especialidade.”
Para ela, é preciso reconhecer e fortalecer as garantias dos direitos socioeconômicos, pois não há direitos humanos ou estado de bem-estar social sem a satisfação dos principais direitos, como no caso, o direito humano e universal de ter direito a um trabalho.
Por fim, vedou que a Multiplan e o Jockey Club turbem/esbulhem a posse dos autores, delimitada aos galpões, construções da ferraria, no perímetro das árvores já plantadas e identificadas pela ré. A magistrada também determinou que seja permitido o acesso dos ferreiros para que possam exercer o seu ofício livremente até decisão judicial em contrário. “Qualquer ato que venha a ser tomado em detrimento da posse dos autores (turbação ou esbulho) implicará na incidência de multa no valor de R$ 30 mil para cada evento.”
As partes terão prazo para contestar a decisão.
Processo nº 001/11801189995
Fonte: TJ/RS