O Juízo da 1ª Vara da Subseção de Montes Claros proferiu sentença, no dia 2 de fevereiro de 2020, em ação ajuizada contra a União e a ECT (Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos), afastando a configuração de dano moral por alegada demora na solução de processo judicial, cujos autos foram extraviados.
Na petição inicial, as requerentes relataram que, no dia 8 de janeiro de 2016, o caminhão da ECT que transportava o malote com os autos do processo que moviam contra o Departamento Nacional de Estradas de Rodagem foi abordado por dois indivíduos armados, tendo eles levado o caminhão e o que estava contido nele.
Sustentou a parte requerente que, quando os autos foram extraviados, encontravam-se prestes a receber a última decisão em grau de recurso, após dezoito anos de tramitação, e, em decorrência de tal fato, foi frustrado o seu direito à resolução do litígio em tempo razoável, o que lhe causou problemas financeiros e de saúde.
Na sentença, o juiz federal substituto Leônder Magalhães da Silva entendeu que, embora a “razoável duração” do processo seja garantia fundamental prevista no art. 5º, LXXVIII da CF/88, não se pode dizer que a demora na solução judicial de um conflito configure dano moral in re ipsa (dano moral presumido).
Pontuou o magistrado que “não se deve confundir a rápida solução judicial do conflito com a garantia constitucional à ‘duração razoável’ do processo, ressaltando que é razoável a duração do processo que é solucionado em tempo condizente com a sua complexidade e peculiaridades. Com efeito, causas mais complexas tendem a ter solução mais demorada, ao passo que causas mais simples normalmente são julgadas em menor tempo, como é o caso dos procedimentos no âmbito dos juizados especiais”.
Considerou ainda o magistrado que a duração razoável do processo deve levar em conta a realidade do Judiciário brasileiro. Nesse caminho, observou que “em um País dominado pela cultura da judicialização dos conflitos, é natural que o número de demandas judiciais extrapole, e muito, a capacidade humana de trabalho dos magistrados e servidores, tratando-se de “um problema não exclusivo do Judiciário, mas um problema social: a cultura da litigiosidade é grande empecilho para a rápida solução das demandas”.
O magistrado esclarece, na sentença, que “o fato de ter havido o extravio dos autos, por si, não permite dizer que houve extrapolação à duração razoável do processo”, levando em conta que, no caso daquele processo, houve tramitação condizente com a complexidade da causa. “Extraviados os autos, a solução é proceder à restauração, como foi feito, e não haver compensação com indenização por dano moral. Ademais, ainda que a duração do processo não fosse razoável, essa constatação não permite configurar, por si, o dano moral, devendo ser aferida a ligação da demora injustificada do na solução judicial do conflito com os danos alegados”.
Segundo o juiz federal substituto, deve ser observado que, em se tratando de responsabilidade civil objetiva, aplica-se a teoria da interrupção do nexo causal ou do dano direto e imediato, sufragada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do paradigmático RE 130.764-1/PR, no qual o Ministro Moreira Alves consignou que a teoria do dano direito e imediato, prevista no art. 1060 do Código Civil de 1916 (correspondente ao art. 403 do CC/02) para a responsabilidade contratual, também se aplicaria à responsabilidade aquiliana. Assim, os sofrimentos apontados pelas autoras, decorrentes de problemas financeiros e de saúde, não decorrem, de forma direta e imediata, da demora da solução do processo, e sim de outros fatores.
Veja a decisão.
Processo nº 1002709-84.2019.4.01.3807