por Roger Lima de Moura
Não bastasse a mal fadada Súmula 11, agora o ataque é contra as interceptações telefônicas. Jogam no mesmo “balaio” interceptações telefônicas autorizadas pela justiça realizadas na forma da Lei 9.296/2006, interceptações telefônicas autorizadas pela justiça realizadas fora do que determina a Lei 9296/2006 e interceptações telefônicas clandestinas realizadas por particulares, tais como detetives particulares, empresas de espionagem e etc, como se tudo fosse a mesma coisa. Há que se distinguir cada situação:
A Lei 9.296/1996, que regulamenta o inciso XII, parte final, do artigo 5º da Constituição Federal dispõe em seu artigo 3º que: “A interceptação das comunicações telefônicas poderá ser determinada pelo juiz, de ofício ou a requerimento:
— da autoridade policial, na investigação criminal;
— do representante do Ministério Público, na investigação criminal e na instrução processual penal.
Porém, o artigo 6º da Lei 9.296/1996, em seu artigo 6º caput, assim dispõe: “Deferido o pedido, a autoridade policial conduzirá os procedimentos de interceptação, dando ciência ao Ministério Público, que poderá acompanhar sua realização.”
Ou seja, o procedimento de interceptação telefônica somente poderá ser conduzido por autoridade policial, no caso, o delegado de Polícia, cabendo ao Ministério Público o acompanhamento de sua realização. Não há que se falar em interceptação telefônica sendo conduzida por outro órgão que não a polícia judiciária. Há de se questionar no caso de interceptações telefônicas realizadas sem a participação da autoridade policial judiciária, quem está analisando tais áudios? Quem está tendo acesso à sigilos protegidos por lei? Servidores administrativos? Polícias que não tem atribuição de polícia judiciária?
Também têm que se controlar com rigor os grampos clandestinos realizados por particulares por se tratar de crime previsto em lei e também o controle sobre quem tem acesso a estes tipos de equipamentos, pois pela ordem constitucional vigente o monitoramento telefônico se trata de uma atividade policial e de polícia judiciária e o que se tem noticiado nos jornais é que órgãos que não exercem polícia judiciária estão adquirindo tais equipamentos, assim como é farta a venda de tais equipamentos para particulares e neste caso há de se questionar qual a finalidade e quem está exercendo tal monitoramento. Qual a finalidade de aquisição de tais equipamentos por órgãos fazendários, polícias rodoviárias, polícias militares, órgãos Legislativos, Judiciários, Ministério Público, Empresas e Particulares.
Não obstante o acima descrito, vejo comentários dos mais diversos “especialistas” (de âncora de jornal, à comentarista esportivo, advogados, revistas especializadas em direito e etc…) sobre a “grampolândia”, (quando somente 3,5% dos inquéritos da Polícia Federal se utilizam desta medida cautelar) ou como o equipamento guardião pode interceptar milhares de telefones, interceptando automaticamente outro telefone quando este faz contato com um telefone interceptado.
Ou seja, uma lenda urbana que de tantas vezes repetidas acaba parecendo realidade. O aparelho guardião, ou outro aparelho qualquer similar é um aparelho passivo que grava as conversas desviadas pela operadora de telefonia, mediante a apresentação da ordem judicial à operadora. Trata-se de um aparelho passivo e não ativo, ou seja, se não houver o desvio da operadora, não há como interceptar uma ligação e para que outro número seja interceptado necessita do mesmo procedimento, ou seja, pedido de autorização judicial, ordem judicial para a operadora e desvio do número para a Polícia Federal.
Portanto, todo monitoramento realizado em operações da Polícia Judiciária que utiliza tais tipos de equipamentos passam pelo controle do Ministério Público que opina favoravelmente ou não pela interceptação telefônica pedida e somente pode ser efetuado após a autorização judicial e expedição de ofício à operadora. Já há um rígido controle do judiciário e do Ministério Público sobre tal monitoramento, que é feito por quem tem a atribuição constitucional para tanto, ou seja, a Polícia Judiciária e sob o controle e acompanhamento legal do Ministério Público e autorização do Judiciário.
Agora, pretende-se fazer à “toque de caixa” um controle sob as interceptações telefônicas, mas, ao contrário do que se esperava, busca-se controlar as interceptações telefônicas realizadas de forma legal, deixando-se para posterior os chamados grampos ilegais, através de um projeto de lei para controlar a venda de tais equipamentos pelas empresas fornecedoras, projeto este que deve ter o mesmo fim do plano de segurança pública, tão comentado durante os ataques do PCC às instituições policiais, parado em algum lugar no congresso.
Transfere-se o controle de um órgão jurisdicional para um órgão híbrido, cuja atribuição constitucional é o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, conforme dispõe o artigo 103 B da Constituição da Republica. Tal órgão por ter sua origem e criação voltada para o controle externo do Judiciário é composto, inclusive por advogados criminalistas e cidadãos de notório saber jurídico, como é o caso do CNJ, que agora passará a ter acesso à todos os números interceptados com autorização judicial.
A pergunta que se faz é: Qual a finalidade de tal controle? Se é controlar o mérito das decisões judiciais, porque não se fazer também o registro de todos os pedidos de prisões deferidos e também dos alvarás de soltura? É de se concluir não ser esse controle de mérito, o que se pretende, e que o discurso do estado de direito e observância da legalidade, parecem estar mascarando sutilezas. Quais? Só tempo dirá. Por outro lado, se não é controle de mérito, qual a necessidade de se ter acesso aos números interceptados legalmente?
Revista Consultor Jurídico