por Gláucia Milicio
“Quando o pai ou a mãe recorre ao Judiciário para pedir a guarda compartilhada dos filhos, muitas vezes, se busca a própria conveniência e não o interesse do menor.” A afirmação é da juíza Fernanda Xavier, da 3ª Vara de Família de Brasília. Ela disse à revista Consultor Jurídico que considera a lei da guarda compartilhada desnecessária. A Lei 11.698/08 entrou em vigor nesta sexta-feira (15/8). Antes mesmo da sanção pelo presidente Lula, ela já era vista com restrições por alguns especialistas do Direito de Família.
A lei altera os artigos 1.583 e 1.584 do Código Civil e prevê que seja dada preferência a esse tipo de tutela em qualquer processo de separação, mas com o consentimento dos pais. Ou seja, com a guarda compartilhada, o pai e a mãe passam a dividir direitos e deveres relativos aos filhos e as decisões sobre a rotina deles.
A juíza explicou, no entanto, que antes da lei já era possível aplicar essa divisão de responsabilidade entre os pais. Assim, segundo ela, não havia necessidade de se criar uma lei específica para disciplinar essa tutela. “Até porque muitos pais buscam a conveniência. Eles acham que dividindo a guarda do filho deixarão de pagar pensão alimentícia, o que não é verdade. A criança não pode ser usada como moeda de troca”, explicou.
Fernanda Xavier ressaltou que a verdadeira guarda compartilhada não chega o Judiciário. Isso porque se há consenso entre os pais da criança não faz sentido levar o caso para a Justiça resolver. A juíza disse, ainda, que muitos pais pensam que a guarda compartilhada é o mesmo que a guarda alternada. E não é.
Na guarda alternada, a mãe fica com o filho metade de um determinado tempo e o pai a outra metade. De acordo com a juíza, esse tipo de guarda não é visto com bons olhos pelo Judiciário. Motivo: tira o referencial da criança que precisa de rotina.
A advogada Márcia Carraro Trevisioli já era contra a proposta desde que o Senado aprovou o texto, em novembro de 2007. Ela considera impossível que um casal que se separou por dificuldades na convivência possa compartilhar a educação de um filho.
“A guarda compartilhada seria ideal, desde que a relação dos pais fosse excelente, caso estabelecessem projetos semelhantes. Mas, isso é pura utopia. O que vejo nos tribunais são pais utilizando os filhos para negociar o pagamento dos alimentos e a partilha do patrimônio. Como esperar que pessoas feridas possam compartilhar a guarda de um filho se não souberam compartilhar uma vida em comum?”, questionou na ocasião.
Nessa linha, a juíza Fernanda Xavier também destacou que se fosse aplicada a guarda compartilhada compulsoriamente, sem o consentimento desses pais, a demanda de litígios iria aumentar. “Teríamos de receber ações para decidir se a criança vai fazer natação, por vontade do pai, ou inglês — por vontade da mãe. Ou então se vai ser budista ou católica”, exemplificou.
Por fim, ela destacou que o parágrafo 2º, do artigo 1.584, dá dupla interpretação. Para ela, esse artigo dá entender que o juiz pode aplicar a guarda de maneira compulsória. O que não deve ser feito, segundo a juíza.
O artigo dispõe que quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será aplicada, sempre que possível, a guarda compartilhada.
O juiz da 6ª Vara de Família de Brasília e presidente no Distrito Federal do Instituto Brasileiro de Direito de Família, Arnoldo Camanho, está em outra direção. Para ele, a guarda compartilhada é o sistema que melhor atende os interesses da criança e não se confunde com a guarda alternada.
“Este sistema prevê que a criança passe períodos alternados nas casas dos pais. Já o novo regime permite que o menor mantenha um domicílio fixo, mas com visitas diárias do pai ou da mãe. O outro passa a ter acesso ao cotidiano da criança, podendo desenvolver atividades diárias, como buscar na escola”, explicou Camanho quando a lei foi sancionada.
Mediação no caminho
A advogada Sylvia Maria Mendonça do Amaral, especialista em direito de família e sucessões, afirma que esse tipo de guarda pode ser a solução para muitos litígios. Ela conta que vai ajuizar, na segunda-feira (18/8), duas ações em que os pais pedem a guarda compartilhada dos filhos.
De acordo com ela, a proposta é resolver a situação de uma maneira tranqüila, mas com a mediação do juiz para evitar um possível desgaste entre o casal. A advogada explicou que a ação é um convite para se chegar ao bem estar da criança porque muitas vezes a mãe assume uma postura de afastar o filho do pai.
“Por causa disso, acaba-se criando uma situação de alienação parental, que é o afastamento que o guardião promove em relação ao pai”, destacou a advogada. Ela acrescentou, ainda, que a mãe muitas vezes afasta o filho para conseguir algum benefício como aumentar o valor da pensão ou por mágoas não resolvidas durante o relacionamento.
Revista Consultor Jurídico