Indenização para juiz gaúcho ofendido em petições

Sentença homologada pelo juiz Diógenes Vicente Hassan Ribeiro, do JEC do Foro Regional da Tristeza, em Porto Alegre, concedeu ontem (22) reparação financeira no valor de R$ 10.200,00 ao magistrado Alex Gonzáles Custódio, titular da Vara Cível do mesmo foro. A ação tramita sem segredo de justiça.

A condenação alcança um homem que, em março deste ano, ingressou no JEC do Foro Central de Porto Alegre contra a OAB gaúcha, contra seu presidente Claudio Lamachia e contra o chefe de gabinete da entidade Júlio Cesar Caspani.

Na ação era pedido, entre outras coisas, o direito do requerente de obter inscrição como estagiário da Ordem. Nesse caso, depois de ser determinada a citação dos requeridos, foi determinada a extinção do feito, sem julgamento do mérito, porque a competência seria da Justiça Federal. (proc. nº 001/3.10.0003201-4)

Na ação agora movida pelo juiz Alex Gonzáles Custódio são juntados um boletim de ocorrência policial realizado pelo réu (04/09/2008), no qual ele se diz vítima de “perseguições por parte de funcionários e juízes do Foro da Tristeza”. Foi também apresentada cópia de petição protocolada (proc. n.º 001/3.10.0003208-1), na qual o magistrado é duramente atacado.

Também foram juntadas cópias de dez pedidos e reclamações contra servidores e juízes do Foro Regional da Tristeza.

Em defesa escrita assinada pelo próprio réu da ação cível, este reiterou as acusações contra o juiz , informando que “proferiu as ofensas de corrupto e outras, pois não teve seus pedidos de celeridade processual atendidos pelo demandante”.

O homem em tela ainda apresentou um contrapedido para que, ele sim, fosse indenizado pelo juiz Custódio. Esse requerimento foi rechaçado pela sentença.

A juíza leiga Luciana Berbigier Lucas reconhece que o prejuízo sofrido pelo juiz autor “é evidente, tendo em vista que, além dos processos administrativos junto à Corregedoria de Justiça, sofreu exposição vexatória junto ao 5º Juizado Especial Cível do Foro Central, em cujo cartório foi protocolada a petição em que constavam as ofensas”.

Prossegue o julgado: “tratando-se de ofensa à honra subjetiva do autor, não é necessária a comprovação expressa do prejuízo sofrido, pois se trata de modalidade de dano moral puro”.

Adiante, dá relevo de que “a conduta e a reputação profissional do autor são ilibadas, sendo que jamais restou comprovada qualquer das alegações de corrupção ou prevaricação que foram objeto de procedimentos administrativos junto à Corregedoria de Justiça”. (Proc. n.º 001/3.10.0010614-0)


ÍNTEGRA DA SENTENÇA 6º Juizado Especial Cível da Comarca de Porto Alegre/RS – Foro Regional da Tristeza
Processo n.º 001/3.10.0010614-0
Autor: Alex Gonzáles Custódio
Réu: Horaldo Martins Amaro
Juiz de Direito: Diógenes Vicente Hassan Ribeiro
Juíza Leiga: Luciana Berbigier Lucas


Vistos, etc.


Dispensado o relatório, nos termos do art. 38, “caput”, da Lei n.º 9.099/1995.


O autor requer a condenação do réu ao pagamento de indenização a título de danos morais, no valor de R$ 10.200,00 (dez mil e duzentos reais), em razão de ofensas contra a sua honra subjetiva e imagem. A fim de embasar a sua pretensão, juntou os documentos de fls. 11-128, dentre os quais importa mencionar os seguintes:


– Boletim de ocorrência policial realizado pelo réu, datada de 04/09/2008, no qual se disse vítima de perseguições por parte de funcionários e juízes do Foro da Tristeza, bem como que teria sido mal tratado pelo autor (fl. 13);


– Petição protocolada nos autos do processo n.º 001/3.10.0003208-1, na qual o autor refere que o ora autor seria corrupto e homossexual (fl. 55);


– Relação de processos em que o requerido figura como parte na comarca de Porto Alegre (fls. 80-86);


– Diversos pedidos e reclamações contra servidores e juízes do Foro Regional da Tristeza (fls. 51, 56, 61, 64, 65, 71, 76, 109, 118, 120).


Em defesa escrita assinada pelo próprio réu, este reiterou as acusações contra o autor, informando que proferiu as ofensas de corrupto e homossexual, pois não teve seus pedidos de celeridade processual atendidos pelo demandante. Informa que tal circunstância não gerou dano moral, pois não houve vinculação pública dos xingamentos. Por sua vez, juntou os documentos de fls. 131-186.


De plano, não recebo o contrapedido formulado pelo requerido em sua defesa escrita, tendo em vista que os requerimentos ali realizados são juridicamente impossíveis. Assim, considerando que a possibilidade jurídica do pedido é uma das condições da ação e que, nos termos do art. 295, § único, inciso III, do Código de Processo Civil, a petição inicial deve ser indeferida em tal circunstância, não deve ser conhecido o pedido contraposto.


Inexistindo preliminares a serem examinadas, passa-se ao exame do mérito da questão, que diz respeito à ocorrência de violação à honra subjetiva e imagem do autor, capaz de ensejar a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais.


Nos termos do art. 927, combinado com o art. 186, ambos do Código Civil, a responsabilização civil depende da demonstração efetiva da ocorrência do evento danoso, do real prejuízo sofrido pela vítima, do nexo de causalidade entre o primeiro e o segundo pressupostos e da culpa do agente.


Ainda, nos termos do art. 333, inciso I, do código de Processo Civil, cabe a parte autora o ônus de comprovar os fatos constitutivos de seu direito. Desta forma, para que a pretensão seja julgada procedente é imprescindível que o demandante tenha logrado êxito em demonstrar a ocorrência dos pressupostos antes referidos.


O ato ilícito, que corresponde à violação de direito alheio, restou amplamente demonstrado através dos documentos juntados, sobretudo o de fl. 55. De fato, não houve contestação às ofensas proferidas, visto que o próprio demandado, em seu depoimento pessoal à fl. 188, confessou ter chamado o autor de corrupto, homossexual e desleal.


O prejuízo sofrido pelo autor, neste caso, é evidente, tendo em vista que, além dos processos administrativos junto à Corregedoria de Justiça, sofreu exposição vexatória junto ao 5º Juizado Especial Cível do Foro Central, em cujo cartório foi protocolada a petição em que constavam as ofensas. Não obstante, a declaração do Sr. Ronaldo Ribas à fl. 189 corrobora com a tese inicial, uma vez que o informante refere que os insultos geraram abalo ao autor, na medida em que as reclamações e imputações são inverídicas e superaram parâmetros da normalidade.


Além disso, tratando-se de ofensa à honra subjetiva do autor, não é necessária a comprovação expressa do prejuízo sofrido, pois se trata de modalidade de dano moral puro. Ainda, importante mencionar que o réu possuía plena ciência de seus atos e tinha, de fato, a intenção de ofender o autor, pois afirmou em seu depoimento pessoal (fl. 188) que não proferiu as ofensas “pessoalmente pois sabia que receberia ordem de prisão imediatamente, pois o autor é Juiz”.


Não obstante, mostra-se relevante referir que a conduta e a reputação profissional do autor são ilibadas, sendo que jamais restou comprovada qualquer das alegações de corrupção ou prevaricação que foram objeto de procedimentos administrativos junto à Corregedoria de Justiça.


Por fim, quanto ao nexo de causalidade não é necessário tecer grandes comentários acerca da vinculação direta entre as ofensas e o prejuízo, pois o requisito está expressamente demonstrado.


A fim de ilustrar o entendimento aqui defendido, colacionam-se os seguintes precedentes:


APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. OFENSAS VERBAIS. DANO MORAL CARACTERIZADO. DEVER DE REPARAÇÃO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. 1. A autora logrou comprovar os fatos articulados na exordial, no sentido de que foi ofendida moralmente pelo réu em seu local de trabalho, situação esta que veio a atingir direitos inerentes a personalidade daquela, como a imagem e a honra. 2. As testemunhas ouvidas no feito corroboram as alegações postas na inicial, de que a parte autora foi ultrajada. A prova colhida no processo se mostrou coesa e coerente, suficiente para a procedência da demanda. 3. Ademais, o local no qual as ofensas foram proferidas toma vulto maior, na medida em que os fatos ocorreram no interior da Secretaria de Agricultura, ambiente profissional no qual a imagem da veterinária autora deve ser mais preservada, pois se aquela é tisnada pode acarretar até mesmo prejuízos à atividade por ela desenvolvida. 4. No que tange à prova do dano moral, por se tratar de lesão imaterial, desnecessária a demonstração do prejuízo, na medida em que possui natureza compensatória, minimizando de forma indireta as conseqüências da conduta da parte demandada, decorrendo aquele do próprio fato. Conduta ilícita do demandado que faz presumir os prejuízos alegados pela parte postulante, é o denominado dano moral puro. 5. O valor a ser arbitrado a título de indenização por dano imaterial deve levar em conta o princípio da proporcionalidade, bem como as condições da parte ofendida, a capacidade econômica do ofensor, além da reprovabilidade da conduta ilícita praticada. Por fim, há que se ter presente que o ressarcimento do dano não se transforme em ganho desmesurado, importando em enriquecimento ilícito. Dado provimento ao recurso. (Apelação Cível Nº 70031561004, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto, Julgado em 16/12/2009)


APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. OFENSAS VERBAIS. DANO MORAL CARACTERIZADO. DEVER DE REPARAÇÃO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. 1. O autor logrou comprovar os fatos articulados na exordial, no sentido de que foi ofendido moralmente pelo réu em seu local de trabalho, situação esta que veio a atingir direitos inerentes a personalidade daquele, como a imagem e a honra. 2. As testemunhas ouvidas no feito corroboram as alegações postas na inicial, de que a parte autora foi ultrajada. A prova colhida no processo se mostrou coesa e coerente, suficiente para a procedência da demanda. 3. Nessa seara, a palavra “veadinho¿ no contexto em que foi usada, em um Estado de cultura patriarcal e conservadora como o Rio Grande do Sul, ganha ares de ofensa, maculando a honra pessoal do postulante, pois em terra de caudilhos onde a hombridade tem valor destacado, por certo que o homem médio deste rincão não toma a expressão utilizada como elogio, mas como afronta, que foi o caso dos autos. 4. Ademais, o local no qual as ofensas foram proferidas toma vulto maior, pois no ambiente profissional é que a imagem dos trabalhadores deve ser mais preservada, pois se aquela é tisnada pode acarretar até mesmo a perda de oportunidades de trabalho e uma carreira exitosa sofrer um verdadeiro deblaque. 5. No que tange à prova do dano moral, por se tratar de lesão imaterial, desnecessária a demonstração do prejuízo, na medida em que possui natureza compensatória, minimizando de forma indireta as conseqüências da conduta da parte demandada, decorrendo aquele do próprio fato. Conduta ilícita do demandado que faz presumir os prejuízos alegados pela parte postulante, é o denominado dano moral puro. 6. O valor a ser arbitrado a título de indenização por dano imaterial deve levar em conta o princípio da proporcionalidade, bem como as condições da parte ofendida, a capacidade econômica do ofensor, além da reprovabilidade da conduta ilícita praticada. Por fim, há que se ter presente que o ressarcimento do dano não se transforme em ganho desmesurado, importando em enriquecimento ilícito. Dado provimento ao recurso. (Apelação Cível Nº 70030714588, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto, Julgado em 12/08/2009)


Quanto ao valor da condenação, considerando que as ofensas foram proferidas em diversas oportunidades e que foram veiculadas no local de trabalho do réu, bem como em atenção às finalidades reparatória e pedagógica do instituto, arbitra-se a indenização em R$ 10.200,00 (dez mil e duzentos mil reais).


Ante todo o exposto, opino pelo não conhecimento do contrapedido e pela procedência do pedido inicial, a fim de que o réu seja condenado ao pagamento de indenização por danos morais ao autor, no valor de R$ 10.200,00 (dez mil e duzentos reais), corrigidos monetariamente pelo IGPM, a contar da data deste julgado, e com incidência de juros moratórios a razão de 1% ao mês, a partir da citação.


Fica a parte ré intimada a efetuar o pagamento espontâneo da condenação em 15 dias, do trânsito em julgado, sob pena de aplicação de multa de 10% sobre o montante devido, nos termos do art. 475-J do CPC.


Publique-se.


Registre-se.


Intime-se.


Porto Alegre, 21 de julho de 2010.


Luciana Berbigier Lucas
Juíza Leiga


 

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