Um abaixo-assinado online endereçado ao ministro da Justiça Tarso Genro foi criada para contestar a indenização que os cartunistas Ziraldo Alves Pinto e Sérgio de Magalhães Gomes Jaguaribe, o Jaguar, ganharam da Comissão de Anistia.
A comissão do Ministério da Justiça decidiu, na sexta-feira (4/4), indenizar os cartunistas pela repressão sofrida durante a ditadura militar. Jaguar receberá uma pensão mensal de R$ 4.375,88 e uma bolada retroativa de pouco mais de R$ 1 milhão. Ziraldo terá direito ao mesmo valor mensal, mais R$ 1 milhão. Ao todo, 104 processos de jornalistas foram mapeados e considerados como prioridades legais. Do total, a comissão concluiu que 54 já poderiam ser julgados.
Os dois cartunistas, fundadores do Pasquim e colaboradores de diversos veículos da imprensa brasileira nos últimos 40 anos, foram indenizados com o argumento de que foram vítimas da opressão do Estado na ditadura militar (1964-1985).
A carta que introduz o abaixo-assinado diz que a decisão do Ministério da Justiça é um equívoco lamentável. “Tudo à custa de nosso trabalho, raspado de nossos bolsos, em decisão que enxovalha o Estado de Direito e a seriedade no trato dos dinheiros públicos.”
Segundo o texto do abaixo-assinado, a ditadura causou sofrimento a todos os brasileiros e, por isso, não pode ser encarado como negócio. “A ditadura não só não provocou danos terríveis a Ziraldo e Jaguar, como agora os enriquece e os tornam milionários à custa de um país de miseráveis e doentes.” O texto é aberto com uma frase de Millôr Fernandes: “Então eles não estavam fazendo uma rebelião, mas um investimento”.
“Exigimos mais critério, seriedade e parcimônia na concessão de tais indenizações pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça. Para que se evitem espetáculos bisonhos como o que assistimos”, finaliza o documento.
Leia a carta
Repúdio às imorais indenizações de Ziraldo e Jaguar
“Então eles não estavam fazendo uma rebelião, mas um investimento.”
(Millôr Fernandes)
Exmo. Sr.
Tarso Genro
Ministro da Justiça
Brasília – DF
Excelência,
Repudiamos a decisão imoral da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, que – de forma afrontosa, absurda e injustificável — premiou os cartunistas Ziraldo Alves Pinto e Sérgio de Magalhães Gomes Jaguaribe, o “Jaguar”, fundadores de “O Pasquim”, com acintosas e indecentes “indenizações”.
Sem desconhecer ou negar os méritos do extinto jornal e sua corajosa participação na luta contra o regime implantado pelo golpe de 1964, não se pode, de forma alguma, aceitar esse equívoco lamentável do Ministério da Justiça, que nos custará a bagatela de R$ 1.253.000,24 (hum milhão duzentos e cinqüenta e sete mil reais e vinte e quatro centavos) para Ziraldo, e outros R$ 1.027.383,29 (hum milhão vinte e sete mil trezentos e oitenta e três reais e vinte e nove centavos) para Jaguar, além de polpudas pensões mensais e vitalícias. Isso tudo à custa de nosso trabalho, raspado de nossos bolsos, em decisão que enxovalha o Estado de Direito e a seriedade no trato dos dinheiros públicos.
Há que se registrar a cupidez vergonhosa de dois jornalistas do nível de Ziraldo e Jaguar, que encerram suas vidas profissionais desenhando em tinta marrom a charge da desmoralização de suas lutas e da degradação moral de suas biografias. Transformaram em negócio o que pensávamos ter sido feito por dignidade pessoal e bravura cívica. Receberam, por décadas, o nosso aplauso sincero. Agora, por dinheiro, escarnecem de toda a cidadania, chocada e atônita com a revelação de suas verdadeiras personalidades e intenções.
Com a ditadura sofreram todos os brasileiros. Por isso não encaramos como negócio lucrativo, prebendário e vergonhoso o que se fez por idealismo, honradez e dever. A ditadura não só não provocou danos terríveis a Ziraldo e Jaguar, como agora os enriquece e os torna milionários à custa de um país de miseráveis e doentes.
Aplaudimos os demais jornalistas que fizeram o saudoso semanário pela decisão de não acompanharem Ziraldo e Jaguar nessa pilhagem, roubando dos brasileiros o dinheiro que deveria (e poderia) estar sendo utilizado na construção de hospitais, num país de doentes; de escolas, num país de analfabetos; na geração de empregos, num país de desempregados.
Que se degradem, que se desmoralizem, que se mostrem publicamente de uma forma que jamais poderíamos esperar. Mas não à custa de nossos bolsos, surrupiando o dinheiro suado de milhões de brasileiros que sofreram com o regime de exceção, mas nem por isso se acham no direito de “ganhar na loteria”.
Exigimos mais critério, seriedade e parcimônia na concessão de tais indenizações pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça. Para que se evitem espetáculos bisonhos como o que assistimos.
Revista Consultor Jurídico