JF/SP: Juiz rejeita denúncia contra comediante “Batoré” por vídeo que pede o fechamento de instituições

O juiz federal Tiago Bologna Dias, da 2a Vara Federal de Guarulhos/SP, rejeitou ontem (1/6) a denúncia contra o humorista Ivanildo Gomes Nogueira, mais conhecido como “Batoré”, e outro acusado (F.L.C) por violação ao art.22, IV c/c art.18 da Lei n 7.170/83, que define os crimes contra a segurança nacional, a ordem política e social.

Segundo a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal (MPF), no dia 28/2 foi publicado um vídeo pelo canal do YouTube “Pátria Amada PE”, bem como pelo canal “Vlog do Lisboa” na mesma plataforma, cujo título era “Agora não tem mais volta – fecha o STF, fecha o Senado, fecha a Câmara – Bolsonaro”, em que os denunciados pediam o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal.

Diante desses fatos, o MPF solicitou uma ordem judicial para obrigar o YouTube a encaminhar uma cópia do referido conteúdo, caso ainda disponível, bem como informar a data de sua divulgação e remoção e a quantidade de acessos que o referido conteúdo teve no período.

Além disso, o órgão requereu que o YouTube informasse os dados cadastrais do titular do canal “Pátria Amada PE”, bem como os endereços de IP e máscaras de sub-rede utilizados para publicar o referido vídeo, tornando indisponível, no prazo de 48 horas, o seu conteúdo. “Ocorre que, a despeito das razões invocadas, entendo que o vídeo em tela não configura qualquer ilícito penal, sendo a conduta tanto dos acusados quanto do titular do canal ‘Pátria Amada PE’ atípica”, afirma o juiz na decisão.

Tiago Dias acrescenta que o que se imputa aos acusados e ao titular não identificado do referido canal, é que teriam feito propaganda de crime de tentativa de impedir, com violência ou grave ameaça, o livre exercício dos Poderes Legislativo e Judiciário, por terem publicado vídeo em que pugnam pelo fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal.

“Preliminarmente, deve-se ter em conta que se trata aqui de tipos penais da Lei de Segurança Nacional, de dezembro de 1983, ainda sob governo ditatorial […]. Portanto, de sua interpretação histórica se extrai que originada sob espírito autoritário e intolerante do regime da época, incorporado em todos os seus dispositivos, por característica congênita, este viés de restrição às liberdades políticas, à semelhança do que ocorre com a Lei de Imprensa, declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (em 2009)”, afirma o magistrado.

Tiago Dias ressalta que, conforme os princípios da Constituição de 1988, deve-se verificar no caso se, além da tipicidade formal, há também, e principalmente, lesão ou ameaça de lesão efetiva e grave aos bens jurídicos democráticos. “Os acusados incitam, além de fazê-lo de forma genérica, não é a prática de um crime, sendo, a meu sentir, uma canalização difusa em palavra de ordem de seu inconformismo com os ocupantes dos Poderes por eles referidos”.

Na avaliação do magistrado, não é relevante penal atentar contra os Poderes de forma pacífica, mas sim o caráter violento como um elemento essencial. “É certo que ambos os acusados se insurgem contra os membros dos Poderes Legislativo e Judiciário em suas declarações públicas, clamando por seu ‘fechamento’, mas nenhum dos dois sequer especifica de que forma seria isso, muito menos fazem referência a qualquer forma de violência ou ameaça”.

Tiago Dias levou em conta, ainda, que se trata da opinião de dois cidadãos comuns, não de autoridades constituídas ou agentes públicos vinculados a especial decoro ou deveres acerca da preservação da institucionalidade democrática. Além disso, não houve nenhuma referência, sequer indireta, a emprego efetivo de algum meio de violência ou grave ameaça. “Se está, portanto, diante de manifestações públicas nos limites da liberdade de expressão e reunião, não havendo ilicitude em tais vídeos”.

O magistrado conclui sua decisão afirmando que “não é dado ao Judiciário no estado democrático de Direito em vigor ser mais autoritário e intolerante que o Judiciário da ditadura […]. Por tudo isso, entendo não haver ilicitude nos vídeos em tela”. (RAN)

Procedimento Investigatório no 5004096-26.2020.4.03.6119


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