por Antonio Carlos Florêncio de Abreu e Silva
A proposta de reforma tributária, em vias de ser encaminhada pelo governo ao Congresso, certamente vai diminuir a complexidade e a carga de trabalho hoje existente para o contribuinte pessoa jurídica cumprir com suas obrigações fiscais, tendo em vista que, no âmbito federal, o novo IVA irá concentrar em um único imposto o IPI, o PIS, a Cofins e a Cide, assim como, no âmbito estadual, o ICMS poderá ter uma única legislação aplicável a todos os estados.
A unificação do ICMS teria o benefício adicional de acabar com a guerra fiscal entre os estados, eliminando ainda várias incertezas hoje existentes para os contribuintes, tendo em vista que muitos dos benefícios ora em vigor e largamente utilizados por todos, como, por exemplo, o do Fundo de Desenvolvimento das Atividades Portuárias (Fundap), no Espírito Santo, não foram celebrados através de convênio com a aprovação dos demais estados, conforme determina a Constituição.
É certo que, em algum momento, o Supremo Tribunal Federal terá de se manifestar pela inconstitucionalidade dos mesmos, sem mencionar o fato de que determinados estados, como São Paulo, não permitem a utilização de créditos do ICMS que não impliquem no efetivo pagamento de imposto no estado onde ocorreu ou teria ocorrido o débito anterior do ICMS.
A transferência da incidência exclusiva do ICMS para o estado de destino da mercadoria, ou onde ocorreria a venda para o consumidor final, também pode simplificar bastante os procedimentos de controle do imposto, diminuindo os custos de administração (tax compliance) dos contribuintes e do fisco e propiciando, em conseqüência, a diminuição da sonegação fiscal.
Também a proposta de desoneração do INSS devido pelo empregador sobre a folha de pagamento e do seguro-educação tem o condão de diminuir a informalidade hoje existente nas relações de trabalho e já vem sendo objeto de negociação entre a sociedade e o governo no âmbito da discussão de diversos anteprojetos de lei concedendo incentivos para o setor produtivo, especialmente os que envolvem as exportações de serviços.
Entretanto, da forma como foi proposta a desoneração, o custo estaria apenas saindo da folha salarial e sendo transferido para outra linha, muito possivelmente aumentando os custos do IVA federal, o que reforça o entendimento geral de que, no fim das contas, a reforma também deve acabar trazendo para o governo a oportunidade de elevar a carga tributária por conta de uma calibragem que procure evitar uma alegada perda de receita.
Os fatos ocorridos nos últimos dias, em torno do anúncio feito pelo governo, confirmam que a aprovação pelo Congresso das medidas acima ventiladas deve ser bastante difícil, a menos que se aceitem um número sem fim de emendas, com o objetivo de atender aos mais diversos setores da sociedade, o que implicaria na completa descaracterização da proposta do projeto de reforma fiscal em comento, inviabilizando a iniciativa, conforme ocorreu com os projetos encaminhados pelos governos anteriores.
Os principais entraves que se apresentam no momento são sem dúvida: 1) a unificação da legislação do ICMS; 2) a incidência do ICMS no estado de destino; e 3) a questão ainda em aberto da definição do valor de transferência das receitas do ICMS para os municípios na ausência de um critério de valor agregado, como existe hoje, em benefício também do estado de origem ou produtor.
Em resumo, a proposta envolve medidas que afetam a autonomia dos estados e a receita dos mesmos e também dos municípios, contrariando corpos políticos muito importantes e influentes para a aprovação da reforma, sem que se ofereça aos mesmos mais do que a medida compensatória da incidência no destino, que, de fato, não beneficia a todos e traz perdas relevantes para os estados mais importantes no cenário político-econômico.
A reforma tributária para o Brasil deve espelhar no projeto que os Estados Unidos, a Inglaterra, a Espanha e diversos países fizeram no final da década de 1980 e princípio da década de 1990 com sucesso, ou seja: simplificar o sistema tributário de forma que só existam basicamente três fontes de custeio da União (imposto de renda), estados (imposto sobre vendas de bens e serviços) e municípios (imposto sobre a propriedade imobiliária e a transmissão da mesma).
O importante é que a reforma torne nossa legislação mais objetiva e sem as exceções que distorcem hoje o sistema. As alíquotas também deveriam ser mais baixas, para encorajar o ingresso e a permanência dos contribuintes na economia formal. Isso permitiria o alargamento da base — e o que é principal — o encorajamento do investimento produtivo privado, criando fator multiplicador de riqueza que fomentaria o desenvolvimento e o crescimento do Brasil. Finalmente, a União ficaria também com os recursos dos impostos regulatórios remanescentes que seriam o imposto de importação, o imposto de exportação e o IOF.
Revista Consultor Jurídico